Por Gustavo Freire, em artigo para o Blog de Jamildo Como descontraiu em sua breve saudação a um Plenário superlotado o Presidente da Corte, Ministro Luís Roberto Barroso, “agora é sem volta”: o maranhense Flávio Dino, de 55 anos, se tornou de fato e de direito o mais novo componente do Supremo Tribunal Federal, que voltou desde então a contar com 11 Ministros, o que aguardava ocorrer desde a aposentadoria da Ministra Rosa Weber.

Os acontecimentos dos últimos dezesseis meses, a começar pelo desfecho da turbulenta e tensa eleição presidencial de 2022, ramificando-se rumo ao infame domingo 8 de janeiro de 2023 em Brasília, projetaram o agora novamente magistrado e o fizeram tão admirado quanto antipatizado por seu estilo assertivo, habilidoso, algo teatral, bem à moda da advocacia de Júri.

Sua trajetória passando da toga à política e de volta à toga, todo esse looping em três décadas e meia, merece, seguramente, um bom biógrafo. É admirável.

O “Justice” Dino, que por igual traz em sua trajetória a expertise de professor de Direito, não é o primeiro Ministro de Estado da Justiça a ser indicado ao STF (cabe lembrar Paulo Brossard, Maurício Corrêa e Nelson Jobim), porém é certamente o mais comentado, circunstância que se traduz como reflexo do ambiente ainda muito polarizado em que se vive no Brasil.

O que esperar dele no Supremo?

A pergunta já embute um juízo de valor negativo e uma presunção de ética no mínimo duvidosa.

Não é, portanto, a pergunta correta a ser feita para fins analíticos honestos.

O Ministro tem o direito a escrever a sua história e de acertar na escolha das palavras que juntas formarão esse relato.

Se errar, aí sim, que, como juiz, passe a réu.

Não encontro dúvidas de que o Dr.

Flávio Dino continuará defensor sempre presente da Constituição e do seu espírito libertário e inclusivo, um reafirmador contumaz da axiologia dos incisos do seu artigo 5°, um endossatário das prerrogativas da advocacia e do direito sagrado de defesa, e, principalmente, que jamais trairá a juramento proferido para granjear o aplauso fácil, alugará a sua consciência ou agradecerá a indicação ao STF com a toga.

Consubstancia gesto de humanidade permitir – querelas político-ideológicas à parte – ao Ministro, até porque nada o descredibiliza perscrutando-se na prateleira dos escândalos, a oportunidade que os seus colegas de toga no STF tiveram de empreender os primeiros passos nesse mesmo desafio.

O Supremo, ápice de montanha que é, não se confunde com um Juizado de Pequenas Causas, mas é e deve se manter um Tribunal Constitucional, farol e bússola, GPS e porto seguro dos debates que impactam, reverberam e importam.

Deve, em suma, se ocupar de matérias consequenciais, em discussões de nível, e de liderar pelo exemplo esta tão fraturada sociedade que é a nossa.

O Ministro Dino merece, em outros dizeres, a chance de emprestar concretude ao preparo iniciado desde que foi o primeiro lugar no concurso para juiz federal e mais tarde se tornou Secretário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Sofrer as dores das incompreensões faz parte da rotina de quem torna o ato difícil de julgar o direito reivindicado um labor.

Julgar é um exercício solitário, tanto quanto nobre, para o que reclama vocação.

Nenhum acusado se presume criminoso, nem os fins justificam os meios na persecução da culpa jurídica, pois os processos judiciais são vidas e não míseras estatísticas para planilhas Excel de produtividade.

Nenhuma lei, outrossim, é presumida de cara como inconstitucional.

Gizando temas que dialoguem com as prescrições e as cláusulas da Constituição, não há de existir na democracia debate inacessível ao púlpito do STF.

Toda sorte ao novo Ministro, inspiração, foco e paciência.

Que em seu gabinete qualidade nunca seja critério subalterno a quantidade.

Que avance nos seus dias tendo por lamparina a ética.

Que continue a ser um eterno aprendiz.

Que se expresse sempre nos autos e não fora deles.

Que siga um estudioso aplicado do Direito a partir da sua base.

Que não se permita enganar pelas liturgias pomposas.

Que seja acessível a quem o procure, que respeite a paridade de armas e que nunca decida pensando em likes.

Que jamais aparteie um defensor que não o tenha tratado protocolarmente de “Excelência”.

Que estimule a representatividade na Corte e lute por mais mulheres no Judiciário.

Sobretudo, que orgulhe o Nordeste e suas mais elevadas tradições na intelectualidade jurídica.

Não lhe faltam referenciais para tanto.

Seja feliz Ministro.

Agora é com o senhor.

Mãos à obra.

Gustavo Freire é advogado e conselheiro da OAB de Pernambuco