Por Ricardo Leitão, em artigo especial para o Blog de Jamildo Há um mês Israel bombardeia a Faixa de Gaza, por terra, mar e ar.

Vivem no território de 365 quilômetros quadrados, no leste do Mediterrâneo, 2,6 milhões de palestinos, uma das maiores concentrações demográficas do mundo: cerca de 6,5 mil pessoas por quilômetro quadrado.

No Brasil, comparativamente, são 23 habitantes por quilômetros quadrados.

O bombardeio israelense tem três objetivos: destruir a infraestrutura militar do Hamas – partido que governa Gaza; prender ou matar seus comandantes e líderes e resgatar cerca de 240 reféns (existem dúvidas sobre o número exato) capturados pelo Hamas no ataque terrorista de 7 de outubro em povoados e fazendas próximas do território palestino.

Até agora teriam morrido 11 mil habitantes de Gaza, vítimas dos bombardeios.

Os israelenses seriam 1.800, a maioria assassinada no ataque de 7 de outubro.

Vídeos gravados em celulares mostram homens, mulheres e crianças sendo metralhados, dentro de suas casas, sem possibilidade de defesa.

Os atacantes do Hamas seriam 3 mil.

Nenhum foi preso, ferido ou morto.

Totalmente surpreendidas, as forças de segurança israelenses só chegaram às fazendas e povoados três horas depois.

Imagem divulgada pelo exército mostra tanques e soldados israelenses estacionados em um local no norte da Faixa de Gaza - Israeli Army / AFP Israel anunciou que iria retaliar e não tardou.

Em um mês lançou sobre a Faixa de Gaza – cercada por terra, mar e ar – cerca de 12 mil bombas.

Foram destruídos hospitais, abrigos, comboios de ambulâncias, creches, escolas, mesquitas, lojas comerciais, milhares de residências e prédios de instituições como as Nações Unidas.

Faltam no território água, comida, medicamentos, combustíveis, eletricidade e telecomunicações.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) alerta para o caos humanitário e a mortandade de crianças por desnutrição e doenças contagiosas.

Elas são 40% da população de Gaza.

Não há perspectiva para o fim da guerra.

Do contrário, a possibilidade é que o conflito se amplie, caso se envolva diretamente o Irã, financiador do Hamas e maior inimigo de Israel e dos Estados Unidos no Oriente Médio.

Com ou sem o Irã, os palestinos do território deverão resistir.

Afirmam que agora apenas travam uma batalha, na luta maior pela completa aniquilação dos israelenses.

Há 75 anos, desde a proclamação do Estado de Israel pelas Nações Unidas, árabes palestinos e israelenses se confrontam.

Já morreram milhares dos dois lados e já se frustraram dezenas de tentativas de pacificação.

Amparado pelos Estados Unidos e aliados europeus, Israel resistiu, se consolidou e se transformou em uma potência regional.

Os palestinos, especialmente os da Faixa de Gaza, passaram a ser um recorte da pobreza, do subdesenvolvimento e do radicalismo do Oriente Médio.

Leia Também Israel abre corredor de fuga para o sul após forças armadas afirmarem cerco total da Cidade de Gaza Israel culpa Hamas pela retenção de brasileiros em Gaza Conflito no Oriente Médio: Hamas fez novo ataque aéreo em Israel nesta sexta (27) Antigo porto comercial e marítimo, a Faixa de Gaza foi intensamente povoada a partir de 1948, ano em que milhares de aldeões árabes foram expulsos de suas terras e seguiram para o litoral do Mediterrâneo.

Seus povoados foram então ocupados pelos pioneiros israelenses.

Ao mesmo tempo, a concentração demográfica na Faixa de Gaza só aumentou, com a chegada de famílias de mais refugiados palestinos.

Hoje eles são cerca de 1,2 milhão, aproximadamente metade da população do território.

Desde então, em nome da defesa da terra e da sobrevivência, são travadas o que os especialistas chamam de “guerras assimétricas” – quando um dos oponentes possui recursos humanos e armamentos muito superiores aos do adversário.

Israel tem um efetivo de 635 mil soldados, entre ativos e reservistas; os militantes do Hamas seriam 20 mil.

Israel dispõe de jatos e helicópteros de ataque, tanques, blindados, frota armada e submarinos.

Ainda possuiria em seu arsenal 90 ogivas nucleares cedidas pelos Estados Unidos.

Nada disso tem o Hamas, que ataca com metralhadoras, foguetes e mísseis montados em túneis, com peças contrabandeadas.

No cotejo tradicional de forças militares, Israel vai vencer a guerra - falta saber quando, como e a que custo.

Há um morticínio no horizonte e talvez mesmo um genocídio.

Exagero?

Aos fatos: representantes do governo de extrema direita de Israel passam a defender, como solução final para a guerra, forçar pelas armas a migração dos palestinos de Gaza para a Península do Sinai e lá sucumbirem, cercados pela aridez do deserto.

Se isso não for possível, exigem que todos os líderes do Hamas sejam sumariamente mortos.

O mesmo promete o Hamas em relação aos sequestrados, sejam eles soldados, civis, homens, mulheres, crianças, israelenses ou estrangeiros.

Só não seriam fuzilados se o bombardeio cessar.

Israel rebate: o bombardeio só irá cessar se os sequestrados forem libertados.

Impasse posto, recorre-se à diplomacia.

No entanto, interesses econômicos e geopolíticos das grandes potencias – Estados Unidos, China e Rússia à frente – retardam ou inviabilizam os entendimentos.

As manobras de vetos e contravetos no Conselho de Segurança das Nações Unidas, que fracassaram ao tentar impedir a invasão da Ucrânia pela Rússia, tendem novamente a fracassar na tragédia da Faixa de Gaza.

Em 2014, há quase dez anos, as forças armadas de Israel deixaram o território palestino, após seis meses de ocupação, destruição e confrontos com o Hamas.

Não se sabe quantos morreram dos dois lados.

Israel ao menos aprendeu o que os Estados Unidos depois confirmaram na derrota para o Talibã no Afeganistão: as chamadas “guerras urbanas”, como agora acontece em Gaza, favorecem quem luta e mais conhece o território, como o Hamas conhece becos, vielas e túneis de Gaza.

Só a extensão total desses túneis seria de 500 quilômetros, cinco vezes maior do que a do metrô de São Paulo, com 100 km, o mais extenso do Brasil.

Quem vai vencer essa guerra?

Não importa.

Se não houver providências imediatas, decisões firmes e atos consensuais, chancelados no Oriente Médio, na Europa e nos Estados Unidos, sempre haverá outra guerra sendo engatilhada.

Parece inacreditável que há três gerações israelenses e palestinos se matam, enquanto as multinacionais continuam a ganhar bilhões de dólares, extraindo a riqueza de seus campos de petróleo.

Elas estão confortáveis na guerra atual, como estiveram nas guerras do passado.

Cadáveres de crianças não prejudicam o seu apetite.

Como chegar à paz?

A essa altura, até o mais néscio camelo do Saara sabe que o caminho para a paz não é a guerra. É absolutamente urgente tentar um início de diálogo, a partir de uma trégua das hostilidades.

O governo de extrema direita de Israel vai cair; uma articulação regional que reúna os principais países árabes pode isolar o Hamas e outras facções terroristas.

Ressurge o tempo de se colocar na mesa a resolução das Nações Unidas de 1947, que aprovou a criação do Estado de Israel e a criação simultânea do Estado da Palestina – soberano, com fronteiras definidas e reconhecimento internacional.

A resolução estava esquecida, ao tempo em que a diplomacia israelense, com o apoio dos Estados Unidos, fechava acordos diplomáticos com os países árabes vizinhos e mitigava o risco de novos confrontos armados.

O choque com o Hamas paralisa essas iniciativas e recoloca na agenda um acerto, quase obrigatório, com os palestinos.

Difícil?

Dificílimo.

Contudo, é necessário ao menos tentar.

Até o papa Francisco reza por isso.

Alguma coisa terá de ser feita.

Nós somos humanos.

Do contrário, as covas continuarão sendo cavadas no cemitério da Faixa de Gaza e os misseis do Hamas continuarão a explodir sobre os israelenses.

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