No livro A política contra o vírus - Bastidores da CPI da Covid, com selo da Companhia das Letras e lançado na Bienal Internacional de Pernambuco, neste final de semana, os senadores pernambucanos Randolfe Rodrigues (sem partido/AP) e Humberto Costa (PT/PE) contam detalhes de uma das audiências mais folclóricas (pelo narcisismo e histrionismo) ao longo de toda investigação, no Senado.
Dois anos depois, os dois senadores ainda se lamentam de não terem tido força para impedir a convocação do empresário bolsonarista de Santa Catarina Luciano Hang, conhecido como Véio da Havan. “Sempre achamos que o depoimento dele não deveria sequer ter acontecido”, afirma Humberto Costa.
Luciano Hang, empresário e dono da rede de lojas de departamentos Havan, era um dos principais apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.
Ele ficou conhecido por suas posições polêmicas, incluindo o negacionismo da covid-19 e a defesa do uso do kit covid, um conjunto de medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença.
Durante a pandemia, Hang foi um dos principais divulgadores de informações falsas sobre a covid-19.
Ele promoveu o kit covid em suas redes sociais e em canais de televisão, e chegou a afirmar que a vacina contra a covid-19 era “experimental” e “perigosa”.
Por tudo isto, o envolvimento de Hang na crise das vacinas no Brasil, no kit covid e na CPI da Pandemia é considerado por muitos como um fator que contribuiu para o agravamento da pandemia no país.
Em seu depoimento na CPI, ele negou as acusações de que havia propagado informações falsas sobre a covid-19 e defendido o uso do kit covid.
Hang também negou ter financiado a rede Prevent Senior.
Gaiola Gigante para prender ‘papagaio’ Antes mesmo de ter sido convocado a depor na CPI da Pandemia, Hang dividiu a CPI e gerou situações inusitadas, como uma ameaça de prisão.
Desde agosto, o senador de Alagoas Renan Calheiros alimentava a ideia de convocar o comerciante de SC para ser ouvido na CPI.
A sua disposição era “desmascarar” Hang, identificado como um dos principais financiadores da rede de desinformação, em rede nacional.
Os aliados de Bolsonaro na CPI, por seu turno, viam na sua convocação de Hang uma oportunidade de propagar as ideias anti-vacina e tratamento precoce.
Em uma destas reuniões informais, na casa do presidente da CPI, Omar Aziz (AM), o baiano Otto Alencar chegou a dizer “que iria providenciar uma gaiola do tamanho de Hang a fim de prendê-lo com aquela fantasia verde e amarela que o fazia lembrar um imenso papagaio”, o que ficou longe de acontecer.
Segundo os autores, Aziz, influenciado por Renan, alegava que não havia o que temer, que ele próprio seria duríssimo e que o empresário não teria como “crescer” para cima do senador.
O que se viu no dia 29 de setembro de 2021 no Senado, ao contrário, foi muito bate-boca, confusão, suspensão da sessão e depois o tradicional de recorte de falas para as redes sociais.
Momentos menos brilhantes “Nosso companheiro Otto Alencar, além de não trazer a citada gaiola para prender o clone do Louro José (programa de Ana Maria Braga, da Rede Globo), indignou-se com Omar Aziz por ele ter autorizado a apresentação de um vídeo institucional da empresa Havan, de propriedade do depente.
Irritado, ele deixou a sessão… diferentemente do que prometera, Aziz não conseguiu impedir que Hang “crescesse”… ainda tentamos impor limites ao histrionismo do personagem, em vão”, lamenta-se o petista.
Luciano Hang posa com senadores antes de depois na CPI da Covid-19 - REDES SOCIAIS SENADOR JORGINHO MELO “Revendo os depoimentos hoje é mais fácil achar pontos que deveriam ter sido mais bem explorados e debatidos, mas que, no calor extenuante dos fatos, terminam por se perder na enorme confusão”, relembraram Randolfe e Humberto Costa. “Esses momentos menos brilhantes da trajetória da CPI, no entanto, não tiraram a força com que nosso conjunto de investigadores expôs o retrato de um governo filiado à morte” Primeiro país do mundo a criar vacinas No livro, com base nas informações que receberam do Butantan (Coronavac) e Fundação Osvaldo Cruz (Astrazenica), os dois senadores garantem que o Btasil poderia ter sido o primeiro país do mundo a criar vacinas e que 60 milhões de doses poderiam ter sido contratadas ainda em 2020, no auge da pandemia.
O processo de vacinação só veio a começar mesmo em abril de 2021.