Nunca se viu tantos advogados passarem vergonha pública em um tribunal, como tem acontecido nos primeiros dois dias dos julgamentos dos atos golpistas.
Virtualmente sem argumentos, o que se tem visto por parte dos defensores é a lacração das redes sociais chegando aos operadores do direito.
Seneca nos dizia que deve-se ignorar os idiotas, mas nestes tempos de redes sociais nem o ministro Alexandre de Moraes resiste a responder aos ataques à Corte, à Justiça e a sua pessoa.
O advogado e escritor pernambucano Gustavo Henrique de Brito Alves Freire comenta, bem a propósito e oportunamente no Jornal do Commercio desta sexta, que não existe julgamento político algum por parte do STF.
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Por Gustavo Henrique de Brito Alves Freire - Com o início do julgamento pelo STF do primeiro lote de denunciados pela Procuradoria Geral da República pelos atos análogos ao terrorismo praticados no 8 de janeiro de 2023 na capital, Brasília, veio à tona uma vez mais na crônica forense a figura do crime multitudinário. É a conduta cometida em turba tumultuária, sinônimo de multidão psicológica (não apenas o agregado de pessoas no qual o conjunto é reflexo das partes, mas a centelha da sugestão, tornando comum a todos um mesmo objetivo, atuando de pessoa para pessoa, em determinado lugar e ao mesmo tempo).
De partida, não parece crível que ainda haja dúvidas sinceras do que efetivamente se passou naquele domingo e da gravidade desses eventos.
Quem hoje teima em as alimentar ou disseminar age à revelia da ética.
Não é patriota coisa nenhuma.
Assistiu a Nação perplexa o sequestro das cores da sua bandeira e do próprio ideal de patriotismo para que se atentasse contra o resultado de uma eleição apertada, mas que transcorrida sem fraudes.
Não foram naquele 8 de janeiro perpetrados crimes de menor potencial ofensivo, substituíveis por penas alternativas, mas ataques inenarráveis e ignominiosos contra a Constituição Cidadã.
Equiparados à traição.
Quando no mínimo, o cometimento de um crime-meio coletivo (produzir ambiente caótico) para o alcance de um crime-fim de resultado aumentado (golpe militar). É bem diverso do somente protestar.
Em síntese, o panorama processual leva ao escancaramento da atuação de uma multidão em tumulto, que deliberadamente e espontaneamente se organizou para a prática de um comportamento comum contra pessoas ou coisas.
Este é exatamente o conceito de crime multitudinário proposto na doutrina do renomado autor Damásio de Jesus, que todo bom aluno de Direito conhece.
Nenhuma figura penal inédita. É um concurso de pessoas de natureza sui generis.
Invasões de propriedades rurais e brigas em estádios esportivos, como nos estádios de futebol, envolvendo torcidas organizadas, são outros exemplos desse tipo delituoso.
Citando Aníbal Bruno, forma-se com esse modal criminoso uma “alma nova”, que não é a simples soma das almas que a compõem, mas do que nelas existe de subterrâneo, sendo esse o espírito que influirá para a violência.
Sebastião Coelho usa defesa de réu do 8 de janeiro para criticar o STF e falar que também está sendo investigado por atos em Brasília.
Desembargador aposentado falou que Alexandre de Moraes não deveria julgar o caso - Tv Justiça- Reprodução Os componentes da turba (multidão psicológica) se mantêm coesos graças a uma lógica de imitação e sugestão, a desencadear um “efeito manada”, capaz de fazer o todo caminhar em sentido único, seja para atividades lícitas ou em verdadeira fúria assassina.
Incide o que o Direito Penal intitula “desindividuação”, teoria na realidade criada por Philip Zimbardo, e que se decompõe em três variáveis: o anonimato, a difusão da responsabilidade e a presença ou tamanho do grupo.
Como se vê, ao hospedar essa explicação, intérprete algum do 8 de janeiro, com destaque ao STF, pode estar se prestando ao papel menor de palco de um julgamento político.
Ora, no constitucionalismo contemporâneo, não existem liberdades fundamentais absolutas, o que evidentemente inclui as de expressão, reivindicação e protesto, e de reunião.
Incomodados que se mudem, se resistentes às regras do jogo.
O recente feriado de 7 de setembro foi o primeiro após o trauma da barbárie de janeiro.
Por incrível que pareça, porém, proliferam as fake news de que tudo foi engenhosa armação das “esquerdas” e que a democracia brasileira nunca esteve realmente sob ameaça.
Faltando apenas confirmar que Elvis não morreu.
Os crimes praticados no 8 de janeiro encontram na tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e do golpe de Estado seu desaguadouro definidor, sendo delitos complementares os de dano qualificado e deterioração do patrimônio público (prejuízo de cerca de 25 milhões, dinheiro meu, seu, nosso).
O ministro Alexandre de Moraes - Valter Campanato/Agência Brasil Não só urge despolitizar o marco cronológico da independência, como restabelecer o próprio debate público relacionado à solidez dos alicerces democráticos.
Se parte da população receia uma data tão marcante como o feriado da independência e outra vê a efeméride como pretexto para ilícitos, então há algo de errado na foto.
Moral da história: tolerância zero com quem ataca a democracia.
O Brasil não é hooligan.