O jurista pernambucano Joaquim Falcão, em artigo na Folha de São Paulo, na TENDÊNCIAS / DEBATES, elencou seis pontos nos quais os bolsonaristas erraram, ao tentar atropelar o Judiciário no Brasil, em comparação ao que a direita fez nos Estados Unidos, com Trump.
Leia Também Quem é o aliado de Lula que quer barrar Paulo Câmara no Banco do Nordeste? “Concordo inteiramente com o professor Joaquim Falcão.
Foi cirúrgico.
Não imputo qualquer traço de vilania, mas antes de resistência heróica, ao ministro Alexandre.
Não fossem ele e o STF, talvez o golpismo tivesse sido bem sucedido”, afirma um advogado pernambucano. “Alexandre de Moraes versus Jair Bolsonaro” O ex-presidente Jair Bolsonaro e seus assessores brasileiros e americanos trumpistas não contavam ter, como principal contendor, o ministro Alexandre de Moraes.
Uma melhor análise das táticas e estratégias jurídico-políticas em jogo teria sido importante.
Cometeram vários equívocos.
O que lhes custou caro.
Primeiro.
Talvez esperassem um presidente do Tribunal Superior Eleitoral mais discreto e conciliador.
Erraram.
Uma matéria-prima do ex-presidente é difundir e administrar o medo.
Já o ministro é mais feito de Gonçalves Dias: “A vida é luta renhida, viver é lutar.
A vida é combate, que aos fracos abate e aos fortes, os bravos, só pode exaltar”.
Segundo.
Para a teoria dos jogos, um fator decisivo para a vitória é o tempo que contendores têm para jogar.
O ex-presidente tinha tempo limitado.
Até 28 de outubro.
Se não ganhasse até essa data, perdia.
Saía do poder e do jogo.
Saiu.
Já o ministro é vitalício.
Quem tem tempo não tem pressa, dizia Marco Maciel.
Mais ainda.
O ex-presidente tem 67 anos.
O ministro, apenas 54.
O vigor geracional conta.Terceiro.
A assessoria trumpista foi útil em táticas midiáticas, captação das pautas nacionais, marketing eleitoral e mobilização de demanda por um populismo reacionário, diz Christian Lynch.
Esqueceram de peculiaridades de nossa cultura jurídica e institucional.
Nesta era da infocracia, alerta Byung-Chul Han, a cultura é forte arma imaterial na arena do poder.
Cultura importa, avisou Huntington.
Os Estados Unidos não têm Justiça eleitoral.
Tratando-se de ataque ou preservação do Estado de Direito, era provável que a contenda passasse pelos plenários do Tribunal Superior Eleitoral e/ou do Supremo.
Trumpistas e bolsonaristas, ao escolherem atacar as urnas eletrônicas, que, de Carlos Velloso a Luís Roberto Barroso, têm sido exemplo para o mundo, erraram.
Não é este o ponto fraco do TSE.
Importaram a cultura do caótico sistema eleitoral americano.
Perderam.
Quarto.
Não previram o risco de o ministro bem coordenar duas competências institucionais ao mesmo tempo.
Presidente do TSE e ministro do Supremo.
Ambos vinham sendo arrogantemente atacados.
O ministro conseguiu união momentânea dos ministros na defesa das instituições e de cada um.
O ex-presidente não conseguiu a união dos militares.
Inagiram.
Paralisaram-se.
O ex-presidente ameaçou demais.
Excessivamente demais.
Simbolizado na expressão: “Eu sou, realmente, a Constituição”.
Parafraseando Vinicius de Moraes, o homem que diz sou, não é.
Porque quem é mesmo, não diz.
Deveria ter falado menos.
Uniu os desunidos.
Quinto.
Junte-se invulgar conhecimento jurídico pragmático.
O que explica a rapidez e segurança com que Moraes decide qualquer demanda processual.
Seu livro “Direito Constitucional” vendeu cerca de 700 mil exemplares.
Em 38 edições. É atualizado todo ano.
Magistrados, faculdades, escritórios de advocacia e procuradorias o compram sistematicamente.
Sexto.
Muitas das críticas ao ministro são sobre seu eventual ativismo.
Extrapolaria sua competência na investigação e punição dos atos antidemocráticos.
Essa crítica tem que enfrentar o fato de que quem primeiro lhe concedeu tal competência foi o então presidente Dias Toffoli.
Corroborada pelo plenário do Supremo.
O artigo 43 do regimento interno determina que somente cabe ao Supremo investigar e julgar infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal.
Até então se entendia “sede ou dependência” como seu espaço “físico”.
De pedra e cal.
Ora, na infocracia, atos danosos podem ser físicos e/ou virtuais.
O golpe foi a soma desses atos.
O conceito de ativismo muda de acordo com a cultura jurídica.
Maior ativismo não houve do que a omissão do Supremo norte-americano no caso Bush v.
Gore.
Recusou-se a apurar eventual fraude de contagem de votos que ocorria na Flórida.
Beneficiaram o candidato Bush.
Ativismo envergonhado.
O Supremo de lá afirmou que não mais se repetiria.
E que não constituía jurisprudência.
Não somos nem melhores nem piores, apenas diferentes, diria o Salgueiro. Às vezes, a omissão é o pior ativismo.
A contenda continua.
Os contendores mudam-se e mudam.
A estratégia de ontem não será a de amanhã.