Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Até 2 de outubro, dia da eleição presidencial, quantas vezes Jair Bolsonaro vai ameaçar a democracia com um golpe de Estado?
Considerando que ainda falta cerca de meio ano para as urnas e o furor autoritário de Sua Excelência, as ameaças e até tentativas tendem a ser muitas.
Em solenidade no Palácio do Planalto, no dia em que o Golpe de 1964 completou 58 anos, Sua Excelência defendeu a ditadura e atacou os ministros do Supremo Tribunal Federal: “Se não tem ideia, cala a boca, não atrapalha.
Bota a toga e fica quieto”.
Um dia antes, no Rio Grande do Norte, Bolsonaro já havia feito outras ameaças ao Judiciário: “O povo armado jamais será escravizado.
Tenham certeza que os votos da eleição de 2022 serão impressos e contados.
Dois ou três ministros não vão impedir isso”.
Ele só não explicou como haveria voto impresso em outubro, uma vez que a possibilidade foi vetada pelo Congresso em maio do ano passado.
As bravatas seriam apenas reincidências, não fosse o golpismo estridente de Sua Excelência nos últimos meses, intensificado à medida que diminuem suas chances na corrida presidencial.
O discurso antidemocrático terminou rebatido de pronto pelo ministro Edson Fachin, presidente do Tribunal Superior Eleitoral: “Não vamos aguçar o circo das narrativas conspiratórias.
Vamos garantir que os resultados do pleito correspondam à vontade legítima dos eleitores”, afirmou Fachin. “A Justiça Eleitoral está sob ataque, a democracia está ameaçada.
Porém, a sociedade está cada vez mais em alerta”. É um gigante risco desviar os olhos das articulações golpistas de Jair Bolsonaro.
No 7 de Setembro de 2021 ele foi explícito.
Em discursos em Brasília e em São Paulo convocou seus seguidores a descumprir as ordens dos juízes e chamou publicamente o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, de “canalha”.
A repercussão foi péssima em todos os setores e Sua Excelência recuou – mas não parou.
Em dezembro criticou o STF pelo que considerou “um abuso”: as prisões de correligionários envolvidos com disseminação de fake news.
Em janeiro passado voltou à carga, sustentando que teria vencido o pleito de 2018 no primeiro turno “se as eleições tivessem sido limpas”.
Afirmou que ministros do STF “trabalhavam por Lula” e queriam torná-lo “inelegível na base da canetada”.
Por todo esse tempo Bolsonaro não cessou de dizer que a urna eletrônica “é insegura” e, consequentemente, “são grandes as possibilidades das eleições de outubro serem fraudadas”.
Tudo isso, evidentemente, tem por objetivo cevar um golpe ou, no mínimo, um grande tumulto no processo eleitoral – o que também cria condições para um golpe.
A questão de Bolsonaro é saber, com segurança, quem está nesse jogo de alto risco.
Previdente, Sua Excelência toma algumas providências.
A primeira foi escolher, como candidato a vice-presidente na sua chapa, o general Braga Neto, ex-ministro da Defesa.
Um dos líderes do chamado “núcleo duro” do bolsonarismo, foi o autor de uma ordem do dia, em 31 de março, que defendeu o Golpe de 1964 como essencial para o fortalecimento da democracia no Brasil.
No período de troca de partidos, Bolsonaro se empenhou para que as legendas que formam o Centrão – sua base, de direita no Congresso – somassem folgada maioria, o que inviabiliza a abertura de um processo de impeachment.
E ampliou a concessão de recursos públicos para a população mais pobre, tentando reduzir, nessa faixa de renda, a forte presença do PT.
O Auxílio Brasil, maior programa de transferência de venda de Governo Federal, já alcança 23% da população.
As iniciativas não reduziram os índices de desaprovação do desgoverno de Bolsonaro, segundo as pesquisas, mas aumentaram a aprovação.
Apesar de tanto esforço, Sua Excelência está longe de sequer se aproximar de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e ainda mais longe de superá-lo.
Falta cerca de um semestre para as urnas de outubro – pouco para uma campanha acirrada – e aí cresce o risco do radicalismo golpista.
A candidatura de Jair Bolsonaro perdeu consistência.
Representa apenas o passado, um populismo velho, que não interessa ao novo empresariado; à nova política; aos milhões de desempregados atingidos pela inflação; às Forças Armadas profissionais; aos que desprezam o discurso de ódio e mantêm a esperança no futuro do Brasil.
Resta à Sua Excelência a mentira que há “um novo Brasil”; uma “nova economia liberal”; a defesa reacionária dos “bons costumes”; o antipetismo apoplético e a submissão à direita internacional.
Isso foi a base da agenda da campanha de 2018, no entanto ninguém acredita que servirá de base para a campanha deste ano.
O discurso do candidato se tornou um blefe no governo e derrotá-lo na tentativa de reeleição está se tornando um dever político de milhões de brasileiros.
Atolado em crises que não solucionará até o final do desgoverno, com um projeto eleitoral em desidratação, Sua Excelência desliza mais uma vez para o golpismo.
Em nenhum momento o alerta do ministro Edson Fachin deve ser esquecido: “A democracia está ameaçada”.