Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog O desgoverno de Jair Bolsonaro completou mil dias.

Modestíssimo, Sua Excelência preferiu não compartilhar com seus seguidores o esplêndido desempenho no período, que o faz superar “os mais portentosos campeões da Pátria” – como diria o culto ministro da Educação.

Para marcar a passagem dos três anos e algumas dezenas de dias, alguns fatos mais memoráveis.

Na semana passada, o projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal divulgou que em 15 anos a derrubada de árvores na maior floresta tropical do planeta atingiu 13.235 quilômetros quadrados, um recorde.

De agosto de 2020 a julho de 2021 – no desgoverno Bolsonaro – o corte raso serrou 2,8 milhões de toras por dia, 32 a cada segundo.

Sempre é bom lembrar que Ricardo Salles, o primeiro ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro, é investigado por envolvimento com contrabandistas de madeira.

Na economia, outras relevantes realizações de Sua Excelência nos mil dias.

Como não existe política econômica, o presidente que assumir em janeiro de 2023 irá se deparar com uma conjuntura que inclui piora do ambiente interno de negócios, enfraquecimento da imagem internacional do Brasil e recuo dos grandes indicadores econômicos, em comparação com os registros no governo de Michel Temer.

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Produto Interno Bruto (PIB) do País deve crescer 4,5% neste ano e 0,9% em 2022.

Entre economistas brasileiros há quem aponte risco de recessão – crescimento negativo – no próximo ano.

A crise financeira aprofundada pela pandemia; a crise energética; a inflação descontrolada, que deve superar 10% no final de dezembro, e a balbúrdia política agravaram a conjuntura.

A consequência social mais trágica é o desemprego, que atinge 13,5 milhões de brasileiros, principalmente na metade mais pobre da população.

A inflação em alta encarece os preços dos alimentos e corrói o poder de compra dos salários.

Depois de muito tempo, cerca de 17 milhões de brasileiros acordam pela manhã sem saber o que comer.

Ou vão disputar ossos e pelancas em caminhões de lixo de supermercados.

A fome desespera e estimula a violência.

Enquanto o desgoverno Bolsonaro facilita a compra e o porte de armas, crescem o assassinato de lideranças sindicais, o feminicídio e o controle de comunidades urbanas por traficantes de drogas e milicianos.

Pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública calcula que o País perde, por dia, 19 crianças para a violência.

Nesse mesmo intervalo de 24 horas, 123 crianças e adolescentes de até 19 anos são estuprados.

As maiores vítimas são pré-adolescentes pobres e negras.

Ordem, progresso e glória.

Cada vez mais tomado por surtos delirantes, Jair Bolsonaro afirma que “esse Brasil” é obra da oposição.

No “meu Brasil” não há incêndios na Amazônia; o País baterá recordes de crescimento econômico e a tensão social e a violência vão regredir, com a chegada do pleno emprego.

Foi o que sustentou, ao que se supõe em condições mentais regulares, ao discursar no plenário da Organização das Nações Unidas, em Nova York, e na Conferência Mundial do Clima, em Glasgow, na Escócia.

O dramático para o Brasil é que nenhum líder político mundial de expressão, nenhuma instituição econômica respeitável, nenhum empresário de destaque acredita mais em Bolsonaro – se alguém um dia acreditou.

O “mito” da extrema direita se transformou em uma carta fora do jogo das grandes decisões mundiais.

Os que dão as cartas esperam o fim do seu mandato para redistribuir as cartas e refazer o jogo.

Sua Excelência sabe disso.

Sabe também que, enfraquecido e inviabilizado como candidato à reeleição, é maior o risco de sofre um impeachment e de ser preso.

Mas não vai recuar.

Um novo mandato significa sua sobrevivência.

Não há outra saída.