Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Na frente de agências bancárias, prefeituras, instituições assistenciais, brasileiros pobres que vão deixar de receber o Auxílio Emergencial fazem fila para entrar no Cadastro Único, a lista de quem quer receber o Auxílio Brasil.

Milhões vão ficar sem o Auxílio Emergencial e o Bolsa Família, extintos por Jair Bolsonaro, com a promessa de que serão substituídos pelo Auxílio Brasil.

Mas o Auxílio Brasil ainda não existe, nem existe dinheiro para pagar o Auxílio Brasil.

Premidos pela insegurança, a desinformação e o risco de fome, os futuros beneficiários do novo programa chegam a pagar por um lugar nas filas, em busca de alguma orientação.

Por enquanto o Auxílio Brasil é uma medida provisória sem data para aprovação final no Congresso.

Ela não diz quanto será pago a cada família brasileira, nem exatamente para quais, nem como.

Criado há 17 anos pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Bolsa Família pagava em outubro passado (quando foi extinto por Bolsonaro) R$ 190 mensais, para 15,6 milhões de famílias.

Nunca faltou dinheiro.

No Auxílio Brasil a pretensão é pagar R$ 400,00 a 17 milhões de famílias.

No entanto, não há dinheiro.

Bolsonaro foi alertado para o risco social e político de um calote em milhões de brasileiros pobres, dependentes de programas de transferência de renda do Governo Federal.

Contudo, foi em frente, acelerado pelo objetivo de sempre: ter um programa de assistência “seu”, que se diferenciasse do Bolsa Família petista e asfaltasse seu caminho para 2022.

Apontado pela Organização das Nações Unidas, pelo Banco Mundial e pela Organização Internacional do Trabalho como um dos mais eficientes programas de distribuição de renda do mundo, o Bolsa Família passou a ser replicado em diversos países.

Porém tinha o DNA petista, o suficiente para Bolsonaro tentar exorcizá-lo de tamanho mal.

Primeiro com o Renda Brasil depois com o Renda Cidadã – dois fracassos.

O que seria mais lógico e simples?

Ampliar a cobertura e o valor do Bolsa Família, já testado e aprovado, ou criar um programa novo, dependente de aprovação pelo Congresso e sem recursos definidos?

Como as conexões cerebrais do bolsonarismo são muito especiais, foi escolhida a segunda alternativa.

Há nela um atenuante canalha de estelionato eleitoral e insensibilidade social, que não enojam mais ninguém.

Pobres nas filas pelas madrugadas? É um problema passageiro, daqui a pouco eles vão saber que “papai Bolsonaro” vai lhes garantir R$ 400,00 por mês.

Desespero pelo medo do desamparo e da fome?

Daqui a pouco eles vão beijar a mão do “papai Bolsonaro”.

Muito dessa alienação de milhões de pobres famintos, de um Brasil distante que só é (mal) visto na televisão, vai virar votos para a direita no próximo ano. É o que importa para Bolsonaro e seus aliados.

Trata-se de absoluta ingenuidade esperar qualquer gesto de sensibilidade social de um presidente que, diante dos 620 mil mortos pela pandemia, sequer visitou uma enfermaria de doentes infectados.

Nas pesquisas eleitorais a situação de Bolsonaro permanece estável, no entanto com viés de baixa. É o segundo colocado, em intenção de voto, entre 20% e 25%, abaixo de Lula, que sempre pontua em torno de 40%.

Mas Sua Excelência já esteve firme nos 30%, patamar que há tempos não alcança.

Uma de suas derradeiras esperanças é que o Auxílio Brasil lhe sirva de trampolim.

Além de Lula, o seu problema é constatar o seu espaço, pela direita, atacado pelo ex-juiz federal Sergio Moro, com uma estratégia que pode ser fatal para Sua Excelência: substituí-lo como candidato da direita e então disputar o segundo turno com Lula.

Moro não é e nem quer ser a terceira via.

Ele se apresenta como a via nova, o herói anticorrupção, o antipetista.

O modelo funcionou a favor de Bolsonaro em 2018.

Contudo, o futuro ainda existe para Jair Messias Bolsonaro, o pior presidente da história do Brasil, mas os seus contornos já foram melhores.

Nenhuma das crises que provocou ou ajudou a agravar vai se resolver até o final de seu mandato.

Está cada vez mais dependente de uma base parlamentar gelatinosa e de um núcleo duro de extrema direita.

Seu comportamento de traços psicóticos sinaliza que há riscos à frente para a democracia.

Olho nele.