Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Arrumou o cocar de penas coloridas, ajustou o microfone e se dirigiu às dezenas de líderes mundiais, atentos na plateia.
Disse se chamar Txai Suruí, representante dos indígenas do norte da Amazônia, território que habitam há 6 mil anos.
Agora estavam perdendo para o desmatamento, a grilagem, o garimpo e as doenças dos brancos o que por gerações sempre foi deles.
Pedia proteção, a demarcação das terras indígenas e o direito de sobreviver na maior floresta tropical do planeta. “Os líderes precisam saber que o risco de nossas vidas na Amazônia também é um problema deles”, ela disse.
Filha do cacique Almir Suruí e da indigenista Ivaneide Suruí, Txai, 26 anos, é uma das novas lideranças dos povos nativos brasileiros.
Falou na abertura da Conferência Mundial do Clima, em Glasgow, na Escócia, a convite da direção do evento, o mais importante desde o encontro em Paris, há cinco anos.
Estudante de Direito, fundou o Movimento de Jovens Índigenas de Rondônia, que já reúne cerca de dois mil integrantes.
Discursou por menos de três minutos, em inglês, e deixou a tribuna aplaudida por presidentes e primeiros-ministros, como Joe Biden, dos Estados Unidos, e Boris Johnson, da Grã-Bretanha.
Entre eles não estava Jair Bolsonaro.
Txai Suruí falou pelo Brasil.
Bolsonaro decidiu permanecer na Itália, onde participara de reunião do G-20 – grupo das 20 maiores economias do mundo – e deixara um desafio para especialistas médicos: qual a relação de seu gosto por pizzas com surtos de negacionismo?
Fora assim ao discursar na Assembleia Geral das Nações Unidas, em setembro, quando assegurou ter o Brasil vencido a pandemia com medicamentos comprovadamente ineficazes contra o vírus.
Horas antes, fora flagrado deglutindo pedaços de pizza no meio da rua, em Nova Yorque.
Dias depois, já em Roma, novamente comeu pizza antes de uma reunião preparatória para a conferência na Escócia.
O surto de negacionismo então foi maior: a um silente Recept Erdogan, presidente da Turquia, descreveu um Brasil de delírios, em pleno desenvolvimento econômico; com a inflação controlada; emprego crescente; estabilidade política e Forças Armadas comprometidas com o seu governo.
Não se sabe do conhecimento de Erdogan – um títere teocrático – sobre a realidade brasileira.
Mas os outros líderes certamente sabiam, tanto que Bolsonaro foi evitado em fotos e rodas de conversa, a ponto de buscar um diálogo com dois garçons que, aparentemente, desconheciam quem ele era.
Os surtos em Nova Yorque e em Roma, a ausência na conferência na Escócia justificam a urgência de um parecer sobre a relação do comportamento de Sua Excelência e o consumo de pizzas.
Existe tal conexão?
Se não existe, o que há?
Impossível é aceitar que o Brasil continue sendo exposto à ridicularia por um presidente que desconhece o lugar que ocupa; o que faz; o que deve fazer, firmando-se cada vez mais como o pior da história do País.
E se não bastasse, cortejado pela extrema direita internacional, como ocorreu na Itália.
A solução, evidentemente, não é impedir que Sua Excelência consuma pizzas, até porque não há comprovação científica de que elas afetam os seus intrincados miolos.
A solução é aumentar sobre ele a vigilância e conter qualquer tentativa de articulação golpista.
Por exemplo: os discursos atentatórios à democracia no Sete de Setembro, em Brasília e em São Paulo.
A articulação fracassou, mas ele pode tentar de novo, movido pela sua obsessão de continuar no poder a qualquer preço.
Bolsonaro sofre de deficiência cognitiva, agravada pela sensação de que é vitima de uma conspiração. À exceção de seu clã, todos desejam a sua queda.
Em miolos nutridos por massa de pizza, o negacionismo e o delírio persecutório não têm limites.
Defrontando-se com crises sem solução; acusado de 9 crimes na CPI da Covid; com a popularidade virando pó e a oposição nos calcanhares, um golpe de Estado volta – de novo – aos seus planos.
Argumente-se, com razão, que não teria apoio econômico, social, político e militar para arriscar um passo dessa dimensão.
No entanto, também vale lembrar que o maior medo de Sua Excelência é ser preso e ver presos os mais próximos do clã bolsonarista, como os filhos 01, 02, 03 e 04, todos no momento sob investigação.
Para se proteger força a radicalização do debate político, de forma a se consolidar como a única opção à direita, contra a esquerda, representada por Luiz Inácio Lula da Silva.
A estratégia “nós contra eles” garantiu a vitória em 2018.
Falta combinar com os eleitores que, cansados de polarizações, podem buscar a terceira via.
As pesquisas, embora iniciais, indicam que há potenciais votantes avançando por esse caminho.
A 11 meses da eleição presidencial, não se sabe sequer quais serão os candidatos.
A direita sustentará Bolsonaro, ao fim de um desgoverno desastroso?
Lula conseguirá unir a esquerda?
Quem vai liderar a terceira via?
Quais os discursos que tocarão as mentes e os corações dos brasileiros?
Com sua voz serena e cheia de sabedoria, Txai Suruí mostrou um caminho.