Por Bruno Brennand – advogado e professor Recentemente fiz breves comentários sobre as possíveis alterações na legislação eleitoral, sobretudo aquelas regras que valerão para o pleito de 2022.

Eis que ultrapassado o dia 02 de outubro do corrente ano, segundo artigo 16 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, uma jovem de apenas 33 anos, estão estabelecidos os parâmetros normativos para as eleições gerais, face princípio da anualidade.

Não foi possível a aprovação de um novo código eleitoral, mas significativas e importantes alterações foram promovidas pelo Congresso Nacional, incluindo Emenda Constitucional, Lei Complementar e três leis ordinárias.

São elas: Emenda Constitucional 111/2021, Lei Complementar 184/2021, e Leis Ordinárias Federais 14.192, 14.208 e 14.211, todas também de 2021.

Sem a pretensão de exaurir com profundidade tais alterações, me atendo a apenas rabiscar algumas palavras.

Um dos temas mais tratados pela mídia especializada foi a figura da Federação Partidária, criado pela Lei 14.208/2021, instituto bem distinto das finadas coligações partidárias para eleições proporcionais.

Além de instituir que a formalização da Federação deve ser de caráter Nacional, amarrando partidos por toda a legislatura (2023-2027).

Com o advento da Federação, é como se fosse criado um novo partido com prazo de validade de quatro anos, sendo-lhe garantidas todas as prerrogativas dadas às agremiações partidárias individualizadas.

Mas daí surge um problema que será abordado na análise da Lei seguinte.

E esse problema surge da interpretação do paragrafo 8º do artigo 11-A, inserido na Lei dos Partidos Políticos (9.096/99), que se aplicam às federações todas as normas que regem os partidos políticos, inclusive no que se refere à escolha e registro de candidatos para eleições majoritárias e proporcionais, à contagem de votos e à obtenção de cadeiras.

Mas esse dispositivo deve ser interpretado em conjunto com a nova redação do artigo 10º. da Lei 9504/97 (Lei das Eleições) estabelecido pela Lei 14.211/2021.

Dispõe a nova redação do artigo 10º que “cada partido poderá registrar candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 100% do número de lugares a preencher mais um”.

Traduzindo para Pernambuco, especialmente para a Câmara de Deputados, temos 25 cadeiras.

Pela nova legislação cada partido ou federação poderá lançar 25 candidatos mais um, totalizando 26 candidaturas, sempre respeitando a cota de gênero.

Está se prevendo um Quociente Eleitoral de 210 mil votos para o preenchimento de uma cadeira na Câmara Federal.

Teremos uma verdadeira peneira ou seleção para quem será candidato por determinados partidos como notórios puxadores de votos.

Além disso, temos a regra também do parágrafo segundo do artigo 109 do Código Eleitoral que foi alterado pela mesma lei acima citada, que diz que “poderão concorrer à distribuição dos lugares todos os partidos que participaram do pleito, desde que tenham obtido pelo menos 80% do quociente eleitoral, e os candidatos que tenham obtido votos em número igual ou superior a 20% desse quociente”.

Ou seja, na ocorrência das sobras de cadeiras eleitorais, somente poderão participar desse “rateio” aqueles partidos que atingirem aproximadamente 170 mil votos, e o candidato somente terá sua cadeira assegurada caso atinja ao menos 42 mil votos.

Tudo isso em números aproximados e considerando os votos validos em Pernambuco na eleição de 2018.

Ou seja, dependendo da montagem das chapas, poderemos ter deputados ou deputadas federais elegendo-se com 400 mil votos ou com apenas 42 mil votos, e sem dúvida uma maior distribuição das cadeiras dentre os partidos, em virtude da diminuição do lançamento de candidaturas que servem apenas para fazer “calda”, os chamados peixes pequenos que agregam votos para os candidatos mais competitivos. É o fim do chamado “Efeito Tiririca”, ou para os mais antigos como eu, da famosa chapinha de Miguel Arraes em 1990, que arrastou consigo Sergio Guerra, Luís Piauhylino, Renildo Calheiros, Roberto Franca e Álvaro Ribeiro.

Ainda sobre as Federações, o número de candidaturas não se altera, pois tal instituto se equipara a um partido político único, tendo as agremiações liberdade para escolherem seus candidatos, limitados ao número máximo (total de cadeiras mais um).

Por sua vez, a Emenda Constitucional 111/2021 trouxe como inovação a possibilidade de consultas populares (por exemplo, para criação ou desmembramento de municípios) concomitante às eleições municipais.

Elevou ao patamar constitucional institutos de fidelidade partidária e alterou a data da posse de governadores e do Presidente da República.

Todavia, tal emenda trouxe importante alteração sobre a inserção da participação feminina e de pessoas negras no processo eleitoral.

Criou o que chamo de voto qualificado, pois o voto dado ao gênero feminino e aos candidatos da raça negra serão contados em dobro, exclusivamente, para fins de distribuição de recursos públicos para o Fundo Partidário anual e ao Fundo Especial de Financiamento Eleitoral (FEFC, ou Fundão, como popularmente ficou conhecido), não sendo possível a acumulação das hipóteses.

Tal situação é transitória, e deverá ocorrer de 2022 até 2030, conforme disposto na própria Emenda Constitucional.

O que na prática isso significa?

Que o voto dado a uma mulher ou a candidatos da raça negra não será contabilizado como sendo dobrado para fins de votação das candidaturas, mas exclusivamente para a distribuição dos benefícios financeiros acima mencionados.

Essa iniciativa estimula, portanto, que a agremiação partidária vise eleger o maior número de candidatas do gênero feminino ou de pessoas negras, para angariarem mais recursos públicos para financiamento próprio e financiamento eleitoral.

Na prática, esse voto qualificado só valerá para a legislatura que se inicia em 2023.

Já a Lei Complementar 184/2021 amenizou hipótese de inelegibilidade, uma vez que tal matéria somente pode ser tratada por tal tipo normativo.

Lembro da previsão da famosa alínea “g” do inciso I do artigo 1 da Lei Complementar 64/1990, que estabelece a inelegibilidade àqueles gestores cujas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas tenham sido rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.

Esta previsão agora não se aplica aos gestores responsáveis que tenham tido suas contas julgadas irregulares sem imputação de débito e sancionados exclusivamente com o pagamento de multa.

Essas são, ao meu sentir, as grandes mudanças nas regras do jogo e que merecerão análise e estudo dos líderes partidários na montagem de suas candidaturas e no estímulo à efetiva eleição de candidatas do gênero feminino e da raça negra a fim de obterem o benefício do voto qualificado.