Por Gaudêncio Torquato, em artigo enviado ao blog O Brasil está alastrando os seus campos de batalha.

Alguns, por obra de mentiras e ficção.

Por exemplo: milhares de pessoas, de aglomerações já passadas, são apresentadas em vídeos de eventos que ocorreram ontem ou hoje.

O maior ajuntamento de massas, no movimento pelas eleições diretas, em 16 de abril de 1984, foi suplantado por 126 mil pessoas na avenida Paulista em apoio a Jair Bolsonaro.

A mentira campeia.

E o ódio sai do congelador para arrebentar as correntes de emoção das massas.

Ora, trata-se da maior dispersão de energia já vista na história recente do país.

Uma insanidade.

Um retrocesso.

Um atraso.

Infelizmente, a campanha de 2022 ganha as ruas, sem nem termos certeza de que Lula e Bolsonaro sejam candidatos.

Tudo pode mudar na undécima hora.

As campanhas eleitorais, regra geral, se dirigem a dois tipos de públicos: eleitores interessados na política, racionais, com intenção de voto definida; e grupamentos dispersos, desinformados, instáveis e emotivos.

Os primeiros se interessam pelos discursos de seus candida­tos, sendo pouco suscetíveis às mensagens dos adversários, enquanto os segundos, pragmáticos, podem mudar de posição, de acordo com os benefícios - maiores ou menores - oferecidos pelos contendores por meio de propostas para áreas como saúde, educação, transpor­tes, segurança, habitação, emprego e bem-estar social.

Os perfis de eleitores, sejam os engajados ou os dispersos, se guiam por critérios variados, não havendo um padrão exclusivo para decidir sobre o voto.

Entre eles se incluem proximidade, qualidade das ideias, viabilidade da promessa, demagogia, populismo, história pessoal (facadas) e até empatia gerada pela maneira como o candidato se apresenta.

Essas divisões eleitorais constituem o alvo dos tiroteios de campa­nhas, donde se pinça a indagação: o combate direto – com a arma da desconstrução do adversário – dá resultados? É sabido que campanha negativa afeta a opção eleitoral.

O impacto é mais forte junto a indecisos que aguardam a reta final para tomar partido.

Será que teremos campanha negativa até outubro de 2022?

Campanha negativa é também tradição noutras praças.

Nos EUA, Lyndon Johnson, candidato democrata a presidente em 1964, foi o primeiro a pagar anúncios para desmoralizar o rival Barry Goldwater.

Uma menina no campo desfolhava pétalas de uma margarida, enquanto as contava uma a uma, até que, chegando ao dez, uma voz masculina começava a rever­ter a contagem.

Na hora do zero, sob um ruído ensurdecedor, via-se na tela uma nuvem de cogumelo, simbolizando a bomba atômica, e a voz de Johnson: “Isto é o que está em jogo - construir um mundo em que todas as crianças de Deus possam viver ou, então, mergulhar nas trevas.

Cabe a nós amar uns aos outros ou perecer.” O arremate: “Vote em Lyn­don Johnson.

O que está em jogo é demais para que você se possa per­mitir ficar em casa.” Em nenhum momento se mencionava Goldwater.

O anúncio saiu apenas uma vez, mas as TVs o repetiram.

Outros foram criados e massacraram o falcão republicano.

Esse modelo tenta associar candidatos aos valores da sociedade. Às vezes, o ataque dá errado, os atingidos se transformam em vítimas e as agressões se voltam contra os agressores.

Aluízio Alves, candi­dato a governador do Rio Grande do Norte em 1960, acusado pelo adversário de correr o Estado dia e noite liderando multidões pelas estradas, apropriou-se do termo “cigano” a ele atribuído.

Enfeitiçou as massas.

Os comícios pegavam fogo.

Dinarte Mariz, o governador, patrono da candidatura de Djalma Marinho, menosprezava: “Quem vai a esses comícios é uma gentinha analfabeta.” Aluízio adotou o ter­mo: “Minha querida gentinha.” Ganhou a eleição.

Gaudêncio Torquato é jornalista, escritor, professor titular da USP e consultor político