Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Foi preciso que os reservatórios das hidrelétricas entrassem em colapso para que Jair Bolsonaro admitisse não existir, entre os seus poderes, o de fazer chover.

E não havendo como resolver essa falha operacional de Sua Excelência, todos os brasileiros agora pagam 6,78% a mais nas suas contas de energia, até que os reservatórios voltem a encher – o que só deverá acontecer em abril de 2022.

Até lá, as perspectivas são desastrosas: quedas no fornecimento de energia elétrica, racionamentos e apagões.

Sem saídas, o desgoverno vai acionar mais termelétricas, movidas a óleo diesel, cujo preço do quilowatts/hora é o dobro do preço do gerado por hidrelétrica.

O aumento do preço da energia vai impulsionar a inflação e conter as possibilidades de retomada da economia.

Para temor generalizado, Bolsonaro tem nas mãos uma nova crise, a hidroenergética, que trata com o negacionismo de sempre: desdenhou dos alertas de que as regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste – onde se localizam as grandes hidrelétricas – iriam sofrer uma grande estiagem e era urgente iniciar campanha nacional para redução do consumo d’água.

Corriam os meados de 2020 e nenhuma providência foi tomada.

Do contrário, as declarações do presidente e dos seus ministros asseguravam que tudo estava sob controle.

Como se tivessem a capacidade de fazer chover no dia, na hora e no local que melhor lhes conviesse.

Um negacionísmo irresponsável, igual ao negacionismo diante da explosão de casos de infectados e mortos pela pandemia.

Segundo Bolsonaro, em frase inesquecível, “só uma gripezinha”.

Agora, para onde vamos quando a crise hidroenergética se junta às outras crises em que foi mergulhado o Brasil, a sanitária, a econômica, a política, a social e a ambiental?

Quem souber ganha um emprego de barbeiro no Afeganistão.

O país parou de crescer, mesmo a taxas mínimas.

A variação do Produto Interno Bruto (PIB) no último trimestre, divulgada pelo IBGE, foi negativa.

Isso significa menos investimento, menos emprego, mais fome e mais tensão.

Em resposta a essa conjuntura terrível, o presidente da República continua a ameaçar a democracia e a se exibir à frente de motociatas.

A tentativa de aparentar controle da situação é falsa como uma fake news.

Na verdade, ele verga sob o peso de três grandes problemas: um novo, o risco de apagões; e dois mais antigos, o aumento da pobreza e o relatório da CPI da Covid, no Senado.

Admita-se cogitar que os dois primeiros problemas podem ser minimizados.

O relatório da CPI, no entanto, teria condições de derrubá-lo do poder.

A investigação dos senadores pode indiciar Bolsonaro por prevaricação, curandeirismo, charlatanismo, crimes de responsabilidade e crime contra a humanidade – todos resultantes de sua desastrosa condução no combate à covid-19.

A omissão justifica o indiciamento por crime de responsabilidade e a Procuradoria Geral da República irá avaliar o indiciamento no caso dos crimes comuns.

Restam os crimes contra a humanidade.

Estes serão denunciados ao Tribunal Internacional de Haia, na Holanda, onde Jair Bolsonaro já foi acusado de genocídio de povos indígenas da Amazônia.

A comissão de juristas que assessora a CPI, coordenada por Miguel Reale Júnior, fará as tipificações criminais.

Para quem vê de olhos fechados os horizontes de Brasília é impossível que Sua Excelência escape imune do relatório final dos senadores.

O presidente sabe disso e não por acaso tentou impedir a instalação da CPI, eleger a maioria de seus integrantes e minar a convocação de testemunhas.

Nada deu certo.

Controlada com mão de ferro pela oposição, com alta audiência do público, a CPI se transformou em uma arma contra sua reeleição.

O esfarelamento do apoio popular a Bolsonaro surge em todas as pesquisas eleitorais.

Ele se apega aos 30% que lhe sobram e, acredita, o encaminhariam ao segundo turno no próximo ano.

Um percentual ainda alto, considerando-se tantas crises.

Só não precisava que os reservatórios das hidrelétricas fossem secar – logo agora – debaixo de seus coturnos.