Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Nos dias que antecederam o Golpe de 1964, as avenidas das maiores cidades do Brasil foram tomadas por multidões que marchavam “por Deus, pela Pátria e pela liberdade”.

Inflamadas por organizações golpistas, as marchas foram apontadas como prova “do apoio do povo brasileiro à luta das Forças Armadas contra o comunismo”.

No próximo dia 7 de setembro estão programadas novas marchas nas capitais, lideradas por bolsonaristas.

Pretendem o seguinte, em Brasília: invadir o Congresso e o Supremo Tribunal Federal e entregar a direção das duas instituições aos militares “para que tomem as providências cabíveis”.

O desvario circula nas redes sociais, anunciado por um tal coronel Azim, que se apresenta como um dos coordenadores da marcha no Planalto.

Ele segue nas ameaças: “Ninguém pode ir a Brasília simplesmente para passear, balançar bandeirinhas, tampouco para ficar somente acampado.

Vamos adentrar juntos no STF e no Congresso”, afirma. “Iremos organizados e queremos entrar em paz.

Mas estamos prontos para enfrentar qualquer força que tentar nos impedir”.

No vídeo, há menções de que os manifestantes estão sendo coordenados por militares da reserva, com experiência na formação de grupamentos e mobilização nas ruas.

Contarão com o reforço de milicianos, que em Brasília – entre outras façanhas – já bombardearam com rojões a sede do Supremo Tribunal Federal.

Radicais estão prontos para agir em outras cidades importantes, como São Paulo e Rio de Janeiro.

O alto risco de um confronto faz das marchas de 1964, com rotundas senhoras com terços nas mãos, rezando contra “agitadores”, uma risível lembrança do passado.

Agora, há cheiro de feridos e mortos no ar, o que pouco importa para o coronel Azim: “Eu não vou para lugar nenhum a não ser para tomar uma atitude.

Chega de blá-blá-blá.

Chega de só amedrontar”.

Em países como o Brasil - onde a democracia é uma plantinha tenra, que precisa ser regada todos os dias – declarações como essa deviam ser consideradas não apenas um crime, mas uma verdadeira convocação a um golpe.

Nada aconteceu.

O tal coronel Azim deverá continuar ameaçando o Legislativo e o Judiciário até o 7 de setembro, reunindo milicianos e planejando a invasão às sedes de dois Poderes constitucionais.

O que fizeram o presidente da República, o ministro da Justiça, o diretor da Polícia Federal, o diretor da Agência Brasileira de Informações diante dos chiliques do coronel Azim?

Ao menos se sabe quem é o coronel Azim, em nome de quais interesses ele atenta contra a democracia?

Quem se beneficia dos ataques do coronel Azim?

Jair Messias Bolsonaro é o principal beneficiário.

Fragilizar as instituições, enfraquecer a democracia e exibir a força das milícias nas ruas – tudo faz parte do seu permanente empenho em acelerar o golpismo.

Não por acaso, em nenhum momento o presidente da República desautorizou as convocações bolsonaristas para o dia 7 de setembro, nem alertou os governadores sobre os riscos de confrontação.

Do contrário, instigou suas bases da extrema direita, garantindo que estará com elas, pessoalmente, ao menos em Brasília e São Paulo.

Acuado pelo isolamento político e pela sucessão de crises, o bolsonarismo quer fazer do 7 de setembro – um dia de orgulho nacional – o dia da virada, com a tomada das ruas em todo o país.

Bolsonaro tem do seu lado uma minoria com ódio, armada com revólveres, parte dela treinada em artes marciais.

A maioria democrata se defende com declarações, manifestos, apelos ao diálogo e ao entendimento. É improvável que o presidente da República ceda a qualquer tentativa de pacificação.

Sua aposta é no confronto institucional e esse jogo ele joga onde lhe for conveniente: contra o Supremo Tribunal Federal, ao pedir o impeachment do ministro Alexandre de Moraes; contra o Congresso, ao insultar senadores e deputados; contra o Tribunal Superior Eleitoral, ao desacreditar o sistema eleitoral brasileiro; contra os mortos pela pandemia, ao desprezá-los.

São apenas exemplos, no entanto dizem bem das manobras golpistas de Sua Excelência.

Tudo serve para manter a tensão que o sustenta colado à sua base reacionária, da qual espera receber o apoio eleitoral suficiente para levá-lo ao segundo turno presidencial em 2022.

Não será impossível – é sempre bom lembrar.

Apesar do desgoverno reinante, um quarto dos eleitores pesquisados consideram a gestão de Bolsonaro “ótima” ou “boa”.

Os bilhões anunciados para programas de auxílio emergencial irão reforçar os índices de aprovação.

Mesmo diante do fracasso administrativo e do desastre político, Sua Excelência ainda se posta entitelado.

No seu rastro, o coronel Azim marcha rumo à loucura.