Por Vinícius Pacheco Fluminhan, em artigo enviado ao blog Em breve, o Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, terá o desafio de desempatar o placar de 5x5 no embate entre aposentados e INSS conhecido como “revisão da vida toda”.

Por que o caso chegou ao ponto de exigir um voto de minerva?

Quem tem razão?

Os aposentados ou o INSS?

Antigamente, as aposentadorias do INSS eram calculadas pela média dos últimos 36 salários.

A legislação brasileira entendia que a conta beneficiava o aposentado por refletir os salários supostamente mais altos da sua vida.

A suposição não era sempre verdadeira.

Afinal, não é todo profissional que encontra os maiores salários da vida no final da carreira.

Mas era assim que a lei tratava o assunto e isso nunca foi seriamente questionado em juízo.

A partir da aprovação da Lei 9.876, de 26 de novembro de 1999, as aposentadorias passaram a ser calculadas pela média dos salários recebidos durante todo o vínculo do trabalhador com a Previdência, gerando assim duas consequências: (1) ela trouxe maior equilíbrio financeiro ao sistema ao promover uma aproximação entre valor de contribuição e valor de benefício; (2) e impediu aposentadorias de valor baixo para quem se aposentava circunstancialmente em períodos de baixos salários.

A nova lei, contudo, não teve aplicação integral para todos.

Para os filiados à Previdência antes da sua entrada em vigor, ficou definido na norma que o cálculo da aposentadoria abrangeria apenas os salários a partir de Julho/1994 e não os salários da ‘vida toda’.

Assim, muitos aposentados não puderam utilizar no cálculo da aposentadoria os salários altos do período anterior a Julho/1994.

Há quem acredite que a data (Julho/1994) está associada à implantação do Real, tendo como propósito evitar discussões intermináveis sobre a correção monetária de moedas já extintas, sabidamente um problema crônico que inchou o Poder Judiciário de processos nos anos 80 e 90.

Essa explicação, entretanto, não convenceu quem teve prejuízo no cálculo da aposentadoria.

Afinal, se a lei havia criado um sistema para refletir o histórico do trabalhador, reputando tal metodologia mais justa, por que para os mais antigos ela própria impôs uma barreira?

Juridicamente, o tratamento desigual criado em 1999 abre as portas para um longo discurso a favor da isonomia lançando a seguinte provocação: seria justa a discriminação feita entre os trabalhadores filiados à Previdência antes e depois da Lei 9.876?

Porém, a inclinação em prol da igualdade traz consigo um sério problema.

A isonomia implicaria o recálculo das aposentadorias de quem se beneficiou com a exclusão dos salários do período anterior a julho/1994, que podem ter sido menores e não maiores!

Assim, os aposentados que não reclamam do cálculo feito na época poderiam ter o valor de suas aposentadorias reduzido.

A regra de cálculo é uma só.

Ou se aplica a todos ou não se aplica a ninguém.

Os aspectos econômicos da controvérsia não são menos complexos.

Tivemos índices bem altos de desemprego e queda do nível dos salários nos anos 90.

A melhoria do quadro foi lenta e a aposentadoria chegou exatamente nesta época para muita gente.

Não obstante a regra da ‘vida toda’ já estivesse em vigor, para os já filiados, os benefícios foram calculados apenas com os salários a partir de julho/1994.

Conclusão: em função do ambiente econômico o tratamento desigual imposto pela Lei 9.876/99 pode ser considerado injusto.

Porém, como a receita da Previdência é constituída predominantemente por contribuições sobre os salários e estava comprometida na época, havia uma exigência técnica de que as aposentadorias refletissem a realidade remuneratória mais recente dos trabalhadores, e não o passado longínquo.

Pelo viés operacional a lei não é injusta.

Como se vê, não é obra do acaso o placar de 5x5 no STF.

A Corte possui no histórico outros casos de grande repercussão, como ocorreu com a discussão sobre a correção de benefícios pelo IGP-DI nos anos 1990; sobre a desaposentação na primeira década do milênio; e mais recentemente, sobre a aplicação do Fator Previdenciário.

Em todos eles o placar foi mais folgado (respectivamente: 7x2 com duas abstenções, 7x4 e 7x4).

Todos com vitória do INSS.

Esse retrospecto, porém, não tira a esperança dos aposentados.

O STF tem sido rigoroso com os demais poderes em muitas ocasiões e por diferentes motivos.

Quem sabe os aposentados se surpreendem desta vez.

Vinícius Pacheco Fluminhan é advogado e professor de Direito Previdenciário na Universidade Presbiteriana Mackenzie Campinas.