Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog A CPI da Covid – que deve se estender, no mínimo, por 90 dias – vai marcar um trimestre tormentoso para Jair Bolsonaro.
Líder do pior governo da história do Brasil, o presidente será alvejado pelos senadores em seu flanco mais frágil: a tragédia do pandemicídio que, estimam os infectologistas, matará cerca de 500 mil brasileiros até o final de dezembro.
Bolsonaro sabe o tamanho da pedra de sal que vai mastigar.
Tentou impedir a aprovação da CPI; a sua instalação e, por fim, a indicação do senador Renan Calheiros (MDB/AL) como relator, em esdrúxula ação na Justiça Federal.
Nada deu certo e, agora, ninguém duvida que a investigação vai chegar aos altos coturnos.
O trabalho da comissão será aprofundar a pauta que há mais de um ano ocupa a mídia: Bolsonaro e seu governo recusaram vacinas; boicotaram medidas sanitárias; recomendaram remédios ineficazes; ignoraram o isolamento social e o uso de máscaras; deixaram de investir R$ 80 bilhões, previstos no Orçamento de 2020, para combater a pandemia.
Não bastassem tantos feitos, a Casa Civil encorpou os argumentos da oposição na CPI, ao elaborar e deixar vazar relação de 23 acusações que mais preocupam o governo na investigação.
Um inestimável roteiro de trabalho.
Nele há de tudo, até genocídio de índios, tema que, de início, não seria abordado pelos senadores.
Há quem deseje ver Sua Excelência, ao fim da investigação parlamentar, acusado de genocídio. É improvável que a CPI avance tanto, embora 500 mil mortos e milhões de infectados e sequelados representem um morticínio.
O maior do século, resultado da omissão de um governo inepto e de um presidente obcecado por sua reeleição.
Em nome desse projeto valeu, vale e valerá tudo, principalmente o negacionismo: a pandemia não existe e os que choram seus mortos são “maricas”, como ironizou Bolsonaro.
O negacionismo não tem limites.
Como o vírus logo se desmanchará no ar, o presidente entregou ao Congresso as diretrizes, as metas e as prioridades para o Orçamento de 2022 sem um plano de atuação contra a covid, seus efeitos no próximo ano e o impacto nas contas públicas.
Para os epidemiologistas que acompanham a evolução da tragédia, não há possibilidade de a pandemia se extinguir em 2022.
No entanto, não só a CPI garantirá dias piores para Bolsonaro.
A investigação vai ocorrer em uma conjuntura que lhe é cada vez mais adversa.
Sua fraqueza política cresce, a ponto de não fazer a maioria entre os 11 membros da comissão.
Sua base na Câmara dos Deputados exigiu e conseguiu alterar o Orçamento da União de 2021 para beneficiar parlamentares.
A imagem do Brasil no exterior se desintegra.
Há 13 milhões de desempregados e 18 milhões de famintos.
As raposas do Planalto ensinam que, em contextos tão críticos, o melhor caminho é o do diálogo e do esforço coletivo.
Mas não com o presidente: o seu caminho é o do confronto e do autoritarismo.
A todo momento, ele diz ter do seu lado as Forças Armadas, que poderão ser mobilizadas “em defesa da constituição e da democracia”.
As Forças Armadas permanecem nos quartéis, no entanto preocupa saber que é nelas que Sua Excelência vê a garantia da democracia, não no voto livre dos brasileiros.
Dias piores virão e a CPI da Covid anteciparia esses tempos.
O presidente da República está isolado e acuado.
A comissão parlamentar pode até não responsabilizá-lo diretamente pelos danos causados por seus ministros ou por crimes que venham a ser comprovados.
Porém serão provas da incúria de seu desgoverno e chave para a abertura de um processo de impeachment.