Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Quando delirava com mais frequência, Jair Bolsonaro atribuía os incêndios e as queimadas na região amazônica aos índios.
Depois culpou as organizações não-governamentais, responsáveis por uma campanha conspiratória para conspurcar a imagem do Brasil no exterior.
Em seguida, apontou o dedo para empresas multinacionais, de olho nas riquezas minerais no subsolo da floresta.
Como não eram fatos, só delírios, as acusações apenas enriqueceram o hilário memorial bolsonarista.
No entanto, havia o temor de que o presidente da República recorresse a eles para justificar a tragédia ambiental do Brasil, ao falar na Cúpula do Clima, no dia 22 passado.
Para o bem de todos e felicidade geral, escapamos do vexame internacional.
Evento organizado pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, reunindo líderes de 40 países, a Cúpula teve como objetivo confirmar metas de redução da emissão de gases de efeito estufa.
Esses gases são a principal causa do aquecimento do clima.
Bolsonaro falou por sete minutos.
Afirmou que o Brasil iria eliminar o desmatamento ilegal até 2030 e alcançar a neutralidade na emissão de gases do efeito estufa em 2050.
As duas metas não surpreenderam.
A novidade veio logo depois: “Diante da magnitude dos obstáculos, inclusive financeiros, é fundamental podermos contar com a contribuição de países, empresas, entidades e pessoas (…)”.
Elegante em fórum tão respeitável, Bolsonaro não monetizou a tal “contribuição”.
Contudo, dias antes o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Sales, já apresentara a conta: R$ 5,5 bilhões, dinheiro suficiente para ações emergenciais contra o desmatamento da Amazônia, durante 12 meses.
O ministro e o presidente certamente esqueceram de informar que o Brasil já dispõe, em caixa, de R$ 2,9 bilhões do Fundo Amazônia, doados pela Alemanha e a Noruega para pesquisas na região.
O dinheiro está parado desde abril de 2019, em consequência de desentendimentos com os dois países sobre a melhor forma de aplicar os recursos.
Sua Excelência ainda destacou iniciativas de seu governo, fortalecendo os órgãos ambientais e as ações de fiscalização.
Um fake amazônico.
Na semana passada, 400 funcionários do Ibama, em carta pública, denunciaram o esvaziamento das funções de fiscalização do órgão, o mais importante no combate a criminosos ambientais.
O delegado da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva, foi afastado do cargo por insistir em investigar quadrilhas de contrabandistas de madeira.
E foram divulgados dados estatísticos confirmando que, apenas em março passado, o desmate da floresta chegou a 810 quilômetros quadrados, três vezes mais que os 256 quilômetros quadrados de março de 2020.
As contradições entre o discurso e a prática provocaram reações negativas de entidades ambientalistas no Brasil e no mundo.
Também o pedido de patrocínio de R$ 5,5 bilhões deparou-se com rejeição imediata de deputados do Partido Democrata – o partido de Joe Biden.
Eles defendem que nenhum recurso deve ser repassado a Bolsonaro até que o governo realize ações efetivas contra o desmatamento e a impunidade dos criminosos.
O desempenho pífio do presidente da República na Cúpula do Clima deixa aberto o flanco do Brasil no debate e nas práticas das questões ambientais.
Mas nem sempre foi assim.
Desde o governo de Fernando Collor, o país foi respeitado internacionalmente por suas iniciativas na defesa do meio ambiente.
Collor realizou a Rio-92, encontro histórico.
Fernando Henrique Cardoso liderou as negociações que resultaram no Protocolo de Kyoto.
O Plano de Ação para a Prevenção do Desmatamento na Amazônia, nos governos do PT, reduziu em 83% os incêndios e as queimadas na região, entre 2004 e 2012.
Jair Bolsonaro é um ponto carbonizado fora da curva.
Ele saiu da Cúpula do Clima menor do que entrou e, sem dúvida, piorou a imagem externa do país – já corroída pela tragédia da pandemia.
No desempenho, contou com a luxuosa parceria do ministro Ricardo Salles.
Em uma entrevista coletiva, logo após a fala do Presidente, quando perguntado sobre o total das verbas que assegurariam os compromissos de Bolsonaro na Cúpula do Clima, Salles deu os seguintes detalhes: “Não sei.
Mas o que for será o dobro”.