Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Há quem considere Jair Bolsonaro um autocrata.
Outros veem nele um oligocrata ou mesmo um androcrata.
Em alguma proporção, todos estariam certos.
No entanto, a impressão cada vez mais dominante é que Sua Excelência é um caocrata, à frente de um regime de governo único no mundo – a caoscracia.
Nele não há planejamento, orçamento, programas estruturais, política externa, econômica e ambiental.
Compromissos de campanha não são respeitados e áreas fundamentais – como saúde, educação, habitação, transporte e segurança – são entregues a pessoas ineptas.
Não há diálogo, vale a palavra do chefe.
Quem não concordar, mesmo que tenha razão, está fora.
Bolsonaro cultiva uma relação simbiótica com a caoscracia: ele dela se nutre e ela dele se alimenta.
Crescem e se fortalecem juntos.
Sua Excelência sabe que só irá sobreviver se o caos for mantido.
O caos é o seu ambiente, é o que interessa às forças que lhe dão sustentação e ainda apostam no seu projeto de reeleição em 2022.
O permanente compromisso com o caos é a única explicação plausível para a sucessão de decisões desastradas do presidente.
Como, por exemplo, substituir abruptamente a direção da Petrobras, causando uma imediata redução de R$ 100 bilhões no valor patrimonial da empresa, um símbolo nacional.
As suspeitas de que faria o mesmo com a direção do Banco do Brasil tiveram o mesmo efeito.
Porém, nada se compara ao seu desempenho caótico no enfrentamento da pandemia – melhor dizendo, do pandemicídio – da covid-19.
A vacinação em massa, como se sabe, é a única saída para se vencer a morte pelo ataque do vírus.
Em março do ano passado, um laboratório norte-americano fez uma oferta para o Ministério da Saúde de 70 milhões de doses de vacinas.
A oferta foi recusada, antes mesmo da negociação de preços.
Em fevereiro passado, o ministério informou ao Senado que iria distribuir, imediatamente, 46 milhões de imunizantes, total logo reduzido para 38 milhões.
Nesta semana, o número ficou entre 25 milhões e 28 milhões.
Ou seja: não se sabe, exatamente, quantas doses serão distribuídas aos estados e municípios; quando chegarão e que recursos logísticos serão necessários.
Enquanto isso, o sistema de saúde entra em colapso, equipes médicas se exaurem e 2 mil brasileiros morrem a cada dia, vitimados pelo pandemicídio.
Não há perspectiva de a tragédia diminuir a curto prazo.
Segundo os infectologistas, 70% da população deve estar imunizada para se conter a escalada da covid-19.
Mas não há vacinas para importação nessa quantidade gigantesca, nem os três laboratórios brasileiros habilitados são capazes de produzir tantos milhões de imunizantes em pouco tempo.
Um caos, que pode transformar o Brasil em ameaça ao esforço global de controle da pandemia e fez a Organização Mundial da Saúde se dirigir publicamente ao governo brasileiro exigindo providências.
Diante dessa sucessão absurda de fatos, há quem considere ser Bolsonaro um tanatocrata, ou pior, um tanatocrata caótico.
Mas existem opiniões no sentido contrário e elas expressam as certezas dos milhões que votaram em Sua Excelência em 2018 e fariam o mesmo em 2022.
Corresponderiam a 30% da população, segundo as pesquisas, percentual suficiente para levar Bolsonaro ao segundo turno na eleição do próximo ano.
A possibilidade de Luiz Inácio Lula da Silva ser um de seus adversários levanta dúvidas sobre o resultado da disputa, contudo garante uma polarização radical, o que, de princípio, seria útil para os dois.
Bolsonaro aglutinaria o polo da direita e Lula o da esquerda.
Não haveria candidatura viável pelo centro, que tenderia a se diluir entre os dois polos.
Talvez ainda seja cedo para avançar com esse raciocínio, mas foi assim que ocorreu em 2018, em favor de Bolsonaro.
Com Lula na raia, o presidente vai acelerar sua campanha.
São aguardadas novas medidas populistas; substituição de ministros por aliados políticos, reforço da pauta conservadora nos costumes e flexibilização do controle fiscal. É a caoscracia aliada ao populismo.
Pensar o que pode sair daí já amedronta.