Por Márcio Coimbra, em artigo enviado ao blog O Brasil vive tempos estranhos.

Vivemos um governo sem oposição na prática, uma vez que os partidos de esquerda ainda não se encontraram depois do impeachment e a vitória de Bolsonaro em 2018.

Na falta de uma oposição consistente, o próprio Presidente resolveu assumir este papel.

Pode soar estranho, mas na lógica de um político que desconsidera a estratégia e age por intuição, faz completo sentido.

O melhor para Bolsonaro seria enfrentar uma oposição organizada e sistemática. É notório que o Presidente delineia seu discurso no antagonismo e nada melhor para isso do que um grupo oposto atuante e com voz.

Foi nesta dinâmica que criou o personagem que surfou na rejeição aos políticos e chegou ao Palácio do Planalto.

Bolsonaro é cria de uma dinâmica pendular executada pelos petistas e que agora se repete da maneira inversa.

Fato é que mesmo desencontrado, o petismo poderia incomodar mais o governo.

Na dinâmica estabelecida contra Fernando Henrique encontraram a senha para chegar ao poder, mas diante de Bolsonaro estabeleceu-se outra prática.

Ao perceber que possuir uma voz ativa contra o Planalto somente faria o presidente crescer, optou-se pelo silêncio, discrição e distanciamento.

Bolsonaro hoje é um presidente em busca de um antagonista.

Já tentou com Witzel, Doria, Maia e um sem número de políticos.

A joia da coroa, entretanto, é Lula e os movimentos que veremos a seguir, que podem reabilitar o ex-presidente cassando sua inelegibilidade e colocando seu nome na pista para a sucessão de 2022, fazem parte do teatro de operações bolsonarista com vistas a reeleição.

Dependerá do petismo morder a isca ou se movimentar de forma inteligente no cenário eleitoral.

O duelo favorece a ambos, que precisam um do outro para se viabilizar em um segundo turno.

O antagonismo, movimento pendular que retroalimenta os extremos é a justificativa para ambos existirem e duelarem pelo poder.

Contudo, se eleitor mostrar-se cansado da polarização, uma terceira via pode surgir de forma equilibrada e viável.

Até este cenário se concretizar, Bolsonaro segue sendo presidente e, na falta de um antagonista, também líder da oposição de seu próprio governo, travando suas próprias guerras, criando inimigos e partindo para a ofensiva.

Ao negar a pandemia e comprar uma batalha contra a imprensa, busca criar narrativas e oposição.

Quanto mais semear a discussão, mais terá possibilidade de aparecer de um lado deste duelo e para ele, no campo intuitivo da política, é isso que importa.

Se o modelo de Bolsonaro prevalecerá, ainda é uma incógnita, mas tendo a acreditar que seu jeito de fazer política se esgota diante de emergências sérias que demandam gestão e ações além das narrativas.

A pandemia, que ceifou a vida de praticamente 200.000 brasileiros, débacle econômico com um deficit fiscal assustador, desemprego, fim do auxílio emergencial e ausência de uma estratégia consistente de vacinação podem deixar sua retórica pelo caminho, assim como os sonhos de uma reeleição, seja como líder de seu governo e também de sua própria oposição.

Márcio Coimbra é coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília, Cientista Político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007).

Ex-Diretor da Apex-Brasil.

Diretor-Executivo do Interlegis no Senado Federal.