Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Quando você nasceu, eu já participava de campanhas políticas.

Naqueles tempos, um dos atributos dos militantes era ter pernas rápidas, para fugir das pancadas da polícia.

Entre tantas outras coisas, aprendi que a vitória tem pai e mãe, e a derrota não tem mãe nem pai. É do jogo.

Você jogou e perdeu.

A derrota dói mas ensina.

Alguns desses ensinamentos podem ser extraídos de sua campanha.

Se me permite, vou comentá-los.

Pode lhe ser útil.

Você tinha a obrigação política de nacionalizar o debate no pleito do Recife e não fez isso.

Não era uma tática para ter mais votos, mas o dever de atacar Jair Bolsonaro, líder da extrema direita e algoz de seu partido em 2018.

O Capitão foi excluído de seu discurso, da mesma forma que aconteceu nas intervenções, em seu horário no rádio e na televisão, de Luiz Inácio Lula da Silva.

Votos de antibolsonaristas (são muitos por aqui) poderiam ter sido conquistados e preservados.

Sua condição de mulher foi usada como argumento para ganhar eleitores. É um recurso antigo, despolitizado, tão velho quanto usar anáguas.

Um eleitor consciente não escolhe ninguém pelo fato de ser mulher ou homem.

Toma partido pela consistência e viabilidade das propostas que lhe apresentam, seja por homem ou por mulher.

E suas propostas, Marília, foram majoritariamente rejeitadas nas urnas.

Relacionar competência ao fato de uma candidata ser mulher é o mesmo que acreditar que um candidato fará um governo de esquerda por ser canhoto.

Outro grave erro foi ter iniciado a campanha com a retaguarda fraturada.

Sua candidatura não foi consensual e sim imposta pela direção nacional de sua legenda, contra a opinião dos dirigentes municipais e estaduais.

Não ia dar certo e não deu.

Com exceção das intervenções de Lula, você ficou sem nenhum apoio nacional de peso na disputa, enquanto seu adversário incorporava à campanha lideranças influentes como Ciro Gomes e Marina Silva.

Você foi “cristianizada”.

Um bom dicionário explica o que é.

No segundo turno, sua candidatura se transformou em um depósito de vários interesses, cimentados por um objetivo comum: derrotar a Frente Popular.

Apertaram-se no mesmo saco cacos da esquerda, pedaços da direita, bolsonaristas arrependidos e poltrões da mídia.

Isso confundiu e desmobilizou seus eleitores.

O que estava acontecendo?

Como adversários históricos da direita agora pediam votos para uma candidata aninhada em um partido de esquerda?

A infiltração de representante da pequena burguesia no comando de sua campanha foi outro problema.

Eles fazem a revolução em mesas de bar, no entanto dão chiliques quando se defrontam com um lambe-lambe.

Falam muito e não conquistam votos.

Instalam-se na “coordenação” e exigem ar condicionado, secretária, carro, motorista, celular e verba de representação.

São líderes fake.

Quando o nó aperta, são os primeiros a defender a “radicalização”.

Você seguiu o conselho, recebeu o troco de volta e se deu mal.

Não bastasse, reforçaram a polarização os oportunistas de sempre: “comunicadores” com faro para o odor do poder; “assessores” que já começavam a emitir notas fiscais; “empresários” com planos milionários e “militantes” que, na véspera da eleição, adentraram shoppings tocando cornetas e gritando o nome de Lula.

Isso começou a assustar.

Se era assim na campanha, como seria no governo?

Desgraçadamente, Marília, essa turba lhe foi útil, principalmente na sordidez das redes sociais.

Nelas, não foi poupado sequer Miguel Arraes, seu avô.

Há outros erros estratégicos e táticos a apontar, porém não vou me alongar.

Apesar de eles serem muitos, importante reconhecer que você recebeu uma votação expressiva.

O lamentável é que foi derrotada na condição de candidata de variadas correntes da direita, abrigada em uma legenda de esquerda.

Ficaram juntos o misturado e o azedo.

E o Recife, Marília, nunca gostou de meio tons na política.

Mas tudo pode recomeçar.

Você continua deputada federal, embora filiada a um partido que teve o pior desempenho nas eleições municipais.

Há outras disputas pela frente.

Sugiro apenas um cuidado: informe que estará à disposição para novos planos, mas não irá usar o sobrenome Arraes nas próximas campanhas.

Qual será a reação de sua legenda, que explorou seu sobrenome como uma bandeira eleitoral?

Campanhas são assim, Marília, se perde e se ganha. Às vezes, há tempo de corrigir o erro e chegar à vitória.

Outras vezes, não dá.

Você não se corrigiu a tempo, nem exigiu o mesmo dos aliados.

Recolhidas as urnas, começa o período difícil de plenárias, avaliações, seminários etc. etc.

Apenas não conte com autocríticas, comportamento raro.

A balbúrdia está tão grande que você terminará sendo responsabilizada, sozinha, pela derrota, quando a obra, na verdade, é coletiva.

Boa sorte e siga em paz.