Por Rodrigo Augusto Prando, em artigo enviado ao blog Findada a eleição municipal, os sentimentos são muitos e as análises também não são poucas.

Analiticamente, há estudos indicando o mapa eleitoral de 2020, trazendo à tona a quantidade de prefeituras que os partidos ganharam ou perderam, votos por zonas eleitorais no segundo turno, e, até, do impacto dos resultados para a eleição de 2022.

Independentemente do resultado - vitória ou derrota - o fim da apuração traz alívio.

A tensão prevalece durante toda a campanha.

Candidatos, equipe e militância estão numa dinâmica de ação quase que ininterrupta, nas ruas ou nas redes.

Confesso que, de minha parte, tinha a crença que a pandemia fosse assustar mais do que assustou os políticos e a militância.

Ou seja: aglomerações, abraços e selfies, por exemplo, abundaram e, com isso, riscos de contaminação foram potencializados.

De qualquer forma, uma campanha no bojo de um cenário pandêmico traz estresse adicional para todos e terminar a campanha vivo e saudável já alivia.

Alegria e tristeza estão, obviamente, ligadas à vitória e à derrota.

Há muito, li que na política a vitória tem muitos pais, mas a derrota é órfã.

No domingo, mesmo aliviados, candidatos eleitos estavam alegres, eufóricos até; e os derrotados, entristecidos, ensimesmados, resignados.

E há o grupo de derrotados, candidatos e militância, que tem ódio do resultado e raiva do eleitor e da democracia.

Para muitos, a democracia é boa quando ganha meu candidato e, por isso, o eleitor sabe votar; contudo, se vence o adversário, a democracia não merece esse respeito e o eleitor é um estulto.

Candidatos sabem que, ao fim e ao cabo, há duas possibilidades: eleito ou não eleito.

Mas preparar o espírito para ambas não é tão simples.

Há um aspecto, na eleição de São Paulo, com Bruno Covas (PSDB) x Guilherme Boulos (PSOL), que merece atenção e o devido destaque.

Covas foi vitorioso e, como dito, faz parte do “jogo”.

Boulos segue os protocolos indicados para quem está contaminado pelo coronavírus, como é seu caso.

Não participou do último debate, nem esteve nas ruas e tampouco votou no domingo.

Mas, à despeito do quadro de saúde de Boulos, há que se atentar para a saúde da própria democracia.

Covas e Boulos fizeram, no primeiro e no segundo turno, uma campanha limpa, sem fake news, sem teorias da conspiração, sem ódio e sem transformar o adversário em inimigo.

Inimigo, na lógica bélica, deve ser eliminado e, na lógica política e democrática, o adversário deve ser respeitado, já que o adversário, hoje, pode ser um potencial aliado amanhã.

Na democracia, o embate de ideias, ideologias, projetos pode até ser ríspido, duro muitas vezes, mas deve ser leal, sem recurso à mentira e ao ódio que corrói os alicerces da democracia.

Numa ocasião, aliado de Covas proferiu dizeres deselegantes em relação a Boulos; ato contínuo, Covas ligou para o psolista para se desculpar.

Segundo relato, numa entrevista, jornalista escutou Boulos falando para Bruno que ele, Bruno, sabia que ele, Boulos, não era radical; Covas respondeu que Boulos também sabia que ele, Covas, não era bolsonarista ou fascista. Às vezes, na campanha, no calor da militância, o tom sobe, mas ainda assim, o respeito e a discussão de propostas prevaleceram.

Política é simbólica.

E o discurso de políticos e suas ações são capazes de sinalizar para sua militância e para todo o conjunto da sociedade.

E, por conta disso, as atitudes de Covas e Boulos, em que pesem visões políticas muitas vezes diametralmente opostas, sinalizaram para a civilidade democrática.

E isso está, há tempos, em falta.

Ganhou a democracia, ganhamos todos nós.

Rodrigo Augusto Prando Professor e Pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Graduado em Ciências Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp.