Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog Os que conheceram ou trabalharam com Miguel Arraes, em algum momento de sua longa vida, podem testemunhar a coragem, a determinação e o compromisso do Governador de Pernambuco com as lutas populares.
Tenho a grande honra de ser um deles.
Aprendi muito com Arraes.
Por exemplo: as forças progressistas avançam quando formam frentes sociais e políticas amplas, capazes de integrar todos que caminham no mesmo sentido.
No entanto, Marília, é necessário que nessas frentes a hegemonia seja da esquerda, que eleva ao primeiro plano as prioridades dos mais necessitados.
Do contrário, as frentes irão se tornar ajuntamentos oportunistas, arrancando pedaços uns dos outros, movidos apenas por desprezíveis objetivos eleitorais e projetos pessoais.
Desconheço se, algum dia, o Governador falou com você sobre isso.
Não sei também se você leu textos políticos dele, nos quais o conceito de frente é mais detalhado.
Ou – vá lá - se passou os olhos sobre os três discursos de posse, referências em compromissos com a justiça social e a defesa da soberania nacional.
Com boa vontade, vamos admitir que você não teve tempo para leituras mais complexas e preferiu, para substituí-las, a rapidez da prática, sem muitas teorizações.
Existem pessoas que pensam assim.
Porém Arraes pensava diferente.
Nele, a teoria e a prática dialogavam, não se opunham.
Foi essa inteligência política que lhe permitiu formar frentes, sem deixar que fossem relegadas as prioridades populares.
Assim se deu desde a sua primeira eleição majoritária, para Prefeito do Recife, em 1958.
Agora, Marília, você se apresenta como defensora da memória do Governador, nas mãos de um partido que não tem por você nenhuma consideração.
A questão é pragmática: o seu sobrenome interessa para engabelar o eleitorado e alimentar os sonhos de seus patronos de retorno ao poder.
Se seu sobrenome fosse outro, tenha certeza que nada disso estaria ocorrendo.
O respeito deles por você é tão verdadeiro quanto uma cédula de R$ 3,00. É triste ver, abraçados aos seus patronos, velhas vivandeiras da ditadura.
E gente que, tempos atrás, foi às ruas, berrando: “Arraes, caduco, Pinochet de Pernambuco!”.
Você talvez nem se lembre.
Porém muitos, como eu, se lembram.
E dói constatar que, tão orgulhosa de seu sobrenome, você se misturou com essa gente.
Muitos, centenas, foram perseguidos, presos, torturados, assassinados e exilados para que você tivesse o “direito” de tirar vantagem do seu sobrenome.
Mas você não honra o seu sobrenome, não honra as lutas dos que tombaram no passado pela democracia, pisoteia a memória do seu avô.
A resposta da Frente Popular aos seus oportunistas aliados de hoje sempre foi dada nas urnas.
Para não recuar muito no tempo, basta lembrar que eles foram derrotados em 2012, 2014, 2016 e 2018.
E serão novamente derrotados neste ano.
As urnas vão rejeitar a indignidade de suas atitudes.
Poderia ser diferente, Marília.
Você poderia ter evitado o constrangimento, para os milhões de admiradores do Governador, de vê-la alinhada, com toda alegria e empolgação, a adversários e até mesmo inimigos do seu avô.
Poderia justificar politicamente o rompimento com a Frente Popular, como alguns já fizeram, por motivos respeitáveis e compreensíveis.
Mas, não.
Você apenas se apossa eleitoralmente de um sobrenome, para profunda vergonha de todos nós.
Marília, respeite Arraes!