Por Ricardo Leitão, jornalista, em artigo enviado ao blog É um equívoco pensar que a prisão de extremistas seguidores de Jair Bolsonaro, como os do grupo “300 do Brasil”, irá acalmar os ânimos crispados da República.

Sua líder, Sara Giromini, vulgo Sara Winter, presa em Brasília, afirmou que não faltarão movimentos para defender quem ela chama de “nosso pai”.

O “300” da denominação teria se inspirado no filme “Os 300 de Esparta”, em que soldados gregos musculosos, vestindo exíguas tangas de couro, batalham até a morte.

O filme virou um clássico trash e as tangas de couro ornamento da comunidade sadomasoquista.

No momento a defesa que o “300” e similares no Brasil fazem do Capitão é o ataque prioritário ao Supremo Tribunal Federal e seus ministros, principalmente Alexandre de Moraes, que comanda investigações sobre o clã Bolsonaro e seus associados.

O Supremo já foi alvo de duas investidas: um cerco de militantes da extrema direita vestidos de túnicas brancas e empunhando tochas e, em seguida, um bombardeio de rojões, enquanto ecoavam na Praça dos Três Poderes insultos ao STF e ao Congresso.

Dias antes, a militância radical já havia obstruído a passagem no portão do Comando das Forças Armadas, em Brasília, reivindicando intervenção militar no Executivo e o fechamento do Judiciário e do Legislativo.

Ou seja: um golpe.

A reivindicação contou com a presença do Presidente da República, que depois negou estar apoiando ação anticonstitucional e antidemocrática. É difícil compreender como a presença de Bolsonaro em uma mobilização que pede intervenção militar é uma atitude em favor da democracia – mas isso são coisas do Capitão.

Ele sabe o que está fazendo.

E, naquela hora, jogava mais um lance de seu jogo: tensionar ao máximo os fios da corda que, esgarçada, ainda amarra o Executivo ao Legislativo e ao Judiciário.

Os lances do Capitão são aparentemente inesperados e propositadamente dúbios.

Questionado sobre ações da Justiça contra os seus aliados, assim esclareceu: “Está chegando a hora de tudo ser colocado no seu devido lugar”.

Qual hora, o que será colocado, em que lugar?

Veteranos observadores da crise política brasileira concordam que ela não culminará em um golpe tradicional, com tanques de guerra nas ruas, como em 1964.

Será antes o clímax de um processo de erosão, corroendo por dentro o sistema democrático.

Nada de marchas, cercos e fuzilamentos.

O processo de erosão seria desencadeado por uma sucessão de eventos – sempre de pequeno porte, porém constantes – capazes de gerar o ambiente adequado para o presidente “assumir o controle”.

Seriam os golpezinhos, dezenas deles.

Quantos pequenos eventos o “300 do Brasil” e outros grupos poderiam eclodir no País, contribuindo para o tal ambiente adequado? É impossível prever, contudo não lhes faltarão recursos, financiados por empresários da extrema direita, como indicam as investigações da Polícia Federal.

Nesse contexto extremado os que defendem o diálogo e a supremacia das leis são tratados até mesmo como inimigos. É o caso dos juízes do STF e do Tribunal Superior Eleitoral, nos quais avançam processos que podem levar à cassação da chapa Bolsonaro-Hamilton Mourão.

O presidente e seu vice são suspeitos de se eleger, em 2018, com apoio de uma milionária estrutura de disseminação de notícias falsas (fake news), dedicada a destruir a reputação de seus adversários.

O ambiente crispado não se dissipa.

As Forças Armadas registram a sucessão de golpezinhos, porém entre elas prevalece a posição da grande maioria, que é a de preservar a missão constitucional do Exército, da Marinha e da Aeronáutica como garantidores da lei e da ordem.

Entre os comandantes, a maior preocupação seria outra: a incompetência do governo Jair Bolsonaro em todos os setores essenciais, repercutindo na queda constante de sua popularidade e no seu crescente isolamento político.

Haveria o risco de o povo retornar às ruas, como aconteceu em 2013, quando Dilma Rousseff presidia o Brasil.

Foi o primeiro passo rumo ao impeachment da presidente.

No momento existem 38 pedidos de impeachment de Jair Bolsonaro protocolados na Câmara dos Deputados.