Por José Paulo Cavalcanti Filho, em artigo enviado ao blog.

Primeiro foi Hobbes, no séc.

XVII, falando em uma “assembleia de homens que reduzem suas diversas vontades, por pluralidade de votos, a uma só vontade”.

Em seguida Locke, definindo a base teórica do pensamento ocidental contemporâneo, com a compreensão de que “os homens são iguais e independentes.” Depois Rousseau.

Pensando a liberdade, na sociedade, inseparável da solidariedade.

Com “todos se tornando iguais por convenção e direito” Depois, as ideias iluministas.

Com restrição nas prerrogativas do poder.

E a história recente da civilização acentuou cada vez mais, o compromisso entre igualdade e participação.

Um espírito que, no Brasil, pode ser encontrado mesmo em Proclamação de D.

Pedro I (junho de 1822), a favor de “uma independência moderada pela unidade nacional”.

Ocorre que passa o tempo e os problemas vão se acumulando.

Com a industrialização, foram articulados em um único sistema econômico regiões que antes se vinculavam sobretudo com o exterior.

E passamos a viver uma complexa transição estrutural, com a reacomodação nas relações entre os centros de poder.

Tanto de natureza econômica, como política.

Grave porque a mudança, naquela opção anterior, não se preocupou, verdadeiramente, com a formação de um mercado interno.

Enfraquecendo, consideravelmente, os vínculos de solidariedade entre as distintas regiões do país.

Pior é que o processo de modernização hoje em curso, definitivamente, não se ancora na integração das economias regionais.

Agravando a concentração de riqueza e renda.

Já vivíamos o esgotamento do ciclo nacional-desenvolvimentista.

E é tempo de buscar novos caminhos.

Problema, agora, é que esse mega problema do coronavirus sugere que sair da crise vai corresponder, no fundo, a encontrar uma nova identidade nacional.

Primeira questão que se aponta, em um processo assim, é a oposição entre irracionalidade coletiva e racionalidade específica, que constitui a essência do Dilema do Prisioneiro de que falava Max Weber.

Como os atores exercitam mútuas desconfianças, isso impede, ou limita severamente, a afirmação da vontade coletiva.

Uma situação de intensa competição, com instituições ainda não inteiramente consolidadas e regras em constantes mudanças, que leva o país inevitavelmente para a situação de um macro-dilema do prisioneiro.

Em que todos, a partir de seus próprios interesses, priorizam o comportamento individualista.

Sem ser capazes de produzir estratégias de ação coletiva.

O que se opera em níveis diversificados.

Nas classes sociais economicamente privilegiadas, que não aceitam aumentar sua contribuição para a superação de desigualdades.

Nos cartórios privados, que se esforçarão por manter suas possessões.

No corporativismo dos que se preocupam, somente, com a preservação dos seus privilégios.

A Espanha saiu da crise, na morte de Franco e a volta da monarquia, com o “Pacto de Moncloa”.

Em que as questões da transição foram definidas democraticamente.

Perguntei ao Primeiro-Ministro Adolfo Suarez o que seria mesmo, por dentro.

E a resposta dele foi exemplar: “O Pacto foi a negociação do Pacto”.

O sentar, na mesma mesa, governo, empresários e trabalhadores.

Para definir uma nova pauta para o país.

Seria bom que algo assim pudesse acontecer, por aqui, para sairmos de vez dessa crise.

Isso é possível?

Fernando Pessoa disse (Sobre Portugal) que “É difícil distinguir se o nosso passado é que é o nosso futuro, ou se o nosso futuro é que é o nosso passado”.

Deus queira que seu vaticínio valha só para seu país.

E que, no Brasil, ainda sobreviva um resto de esperança.