Por Helio Beltrão, na Folha de São Paulo desta quarta Após o martírio da reforma da Previdência, a bola da vez é a reforma tributária.
O tema dos impostos é controverso para um liberal consistente.
Há de pronto uma objeção de ordem moral.
Afinal, em sua essência o ato da taxação não difere moralmente do roubo, pois representa a subtração da propriedade de um indivíduo sem seu consentimento.
O sujeito que objetar ao pagamento do imposto é implacavelmente perseguido por meio de cartas, processos, penhoras e confiscos.
Assim como um ladrão nem sempre exibe a arma para que nos submetamos à demanda de lhe passar a carteira, analogamente o imposto representa agressão sobre inocentes.
A questão de como financiar os serviços essenciais a uma sociedade justa, ordeira e próspera sem apelar para a coerção sistemática é relevante, mas de natureza distinta.
A opção adotada hoje em dia é a coerção de todos pelo Estado para financiar os gastos considerados necessários pelos políticos, mas não é obrigatório que seja assim no futuro: nada impede que um serviço de interesse público possa vir a ser pago voluntariamente. É assim no mercado, onde votamos com o bolso e a cada compra asseguramos que o valor desembolsado vale a pena.
Todavia, no caso de um serviço público, não há essa garantia: o que pagamos não volta em serviços.
Não surpreende, portanto, que nos últimos anos a dívida do setor público tenha crescido em dez pontos percentuais do PIB ao se bancarem empresários amigos, inchaço do funcionalismo, venda de caminhões com taxas de 2% ao ano e sobretudo a seguridade social insustentável.
Não há, portanto, como discutir uma reforma tributária sem também discutir a diminuição dos gastos do governo.
Mas como taxar?
Uns defendem o foco na renda, outros no consumo, mas isso é irrelevante porque o estrago do imposto é universal.
Quem tem a obrigação legal de pagar não é quem sofre a incidência do imposto na vida real.
Este é em geral o assalariado.
Há inúmeras propostas em discussão no momento.
Pelo lado positivo, as propostas endereçam aberrações tais como o custo burocrático de apuração, a insegurança jurídica derivada das ambiguidades e a complexidade de mais de 80 impostos, taxas e contribuições, com alíquotas e bases distintas.
No entanto, em geral as propostas se ocupam em manter ou aumentar a receita de cada nível da Federação.
Os proponentes pesam cada alteração levando em conta o impacto na arrecadação e a coibição da competição entre estados e municípios.
A ideia geral é unificar tributos e centralizar a arrecadação no nível federal ou em um comitê em que o governo federal tenha voz forte. É fazer com que serviços paguem mais. É aumentar a base de arrecadação. É eliminar toda e qualquer isenção de impostos.
Todo imposto gera distorção alocativa e impede a neutralidade.
A isenção fiscal tem natureza distinta do subsídio.
A primeira (a isenção fiscal), ao eliminar impostos, torna a alocação de recursos mais eficiente ao se aproximar do cenário de melhor alocação.
A segunda (o subsídio), ao tirar de Pedro para dar a Paulo, prejudica a todos, menos Paulo.
Algumas exceções do sistema atual existem para acomodar justas diminuições de carga para certas atividades.
A isenção de alguns impostos para micro e pequenas empresas que empregam 50% da mão de obra brasileira é um privilégio?
Não me parece o caso.
A pior ideia do secretário Marcos Cintra, que é uma espécie de Suplicy do imposto único, é a volta da CPMF.
Espero que essa ideia siga “blowing in the wind”.
Hélio Beltrão é engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.