Em entrevista ao cientista político Antonio Lavareda, o empresário João Carlos Paes Mendonça defendeu as reformas tributária e da Previdência, além do incentivo a investimentos privados, como soluções para a crise econômica atual no País.
Para ele, embora as relações entre os três poderes tenham começado de forma desencontrada no governo Jair Bolsonaro (PSL), deve começar agora uma nova fase, de “compreensão e integração”. “A fase que todos entendam que o Brasil é maior do que a vaidade de cada um”, disse no programa 20 Minutos, exibido neste sábado (1º), na TV Jornal.
Antonio Lavareda - Como empresário, como assistiu à evolução da economia brasileira nas últimas décadas?
No período, tivemos o cruzeiro e o cruzado, com os planos respectivos, depois o plano Collor, e estamos enfrentando uma crise.
Qual foi a estratégia de um grupo empresarial como o seu para atravessar tanto tempo de tantas dificuldades econômicas no País?
João Carlos Paes Mendonça - Realmente a economia brasileira passou por altos e baixos.
Esses planos foram realmente prejudiciais à nação e tivemos que usar uma estratégia, que era simples, a estratégia do trabalho, a persistência e enfrentar esses momentos tão difíceis.
Tive uma experiência enorme, inclusive como presidente da Associação Brasileira de Supermercados, membro do Conselho Monetário Nacional.
Participei ativamente desses planos e sofri muito com esses planos.
Mas o Brasil é muito grande, muito forte.
Hoje estamos numa fase não tão boa da economia brasileira, mas temos esperança que isso se resolva e nós voltaremos a crescer porque o País é gigante, o País tem tudo.
Antonio Lavareda - O governo Bolsonaro começou há cinco meses, não temos ainda um semestre.
Mas um levantamento recente da XP Investimentos mostrou que entre os empresários a avaliação do governo está aquém da própria população: 14% apenas dos entrevistados avaliam como ótimo e bom o presidente.
Qual é a sua visão inicial?
João Carlos Paes Mendonça - O governo iniciou com uma expectativa muito alta, pelos seus ministros, inclusive Paulo Guedes e Sérgio Moro, que a população depositou muita confiança neles.
Mas houve um desencontro entre os Poderes.
Nós tivemos dificuldades de ver o Congresso Nacional, através do Senado e da Câmara.
Não se entendiam, os líderes também não se entendiam, muita gente jovem chegando na Câmara.
E isso é extremamente complicado.
Agora, tenho esperança, depois desse encontro com o presidente do Senado, o presidente da Câmara e o presidente do Supremo Tribunal Federal, acho que vamos partir para uma nova fase, a fase da compreensão, da integração, a fase que todos entendam que o Brasil é maior do que a vaidade de cada um.
Antonio Lavareda - A reforma tributária é um dos temas importantes, embora haja um consenso também de que ela deve vir posteriormente à reforma da Previdência.
Qual é a sua visão sobre a perspectiva de unificação de tributos no Brasil?
João Carlos Paes Mendonça - Sem dúvida eu acho que há a necessidade de uma reforma tributária e não se confundir, porque comumente reforma tributária é para aumentar impostos.
O governo tem insistido que não vai aumentar impostos e Paulo Guedes também.
Mas é importante que diminua o número de impostos, de taxas, etc.
E também que desburocratize, porque hoje as empresas estão pagando muito caro para manter em dia esses impostos, com informações, e isso prejudica.
Uma esperança nossa é de que haja uma inteligente reforma e que não venha a aumentar a carga tributária do brasileiro.
Antonio Lavareda - Reforma da Previdência é o tema da vez do País, é o compromisso do presidente da República, dos presidentes dos demais Poderes e boa parte da sociedade.
Qual a contribuição que a reforma da Previdência efetivamente poderá dar para começarmos a enfrentar o quadro de desemprego no País?
João Carlos Paes Mendonça - Sem dúvida, eu acho a mais importante de todas as reformas no momento.
A Previdência tem um déficit enorme, o governo precisa realmente recuperar a sua situação financeira e a reforma da Previdência vai tirar dos privilegiados.
Lamentavelmente, muitos estão reclamando, mas a verdade é que sem a reforma da Previdência o governo tem muita dificuldade de resolver os seus problemas de caixa.
Isso sem dúvida alguma será benéfico para o País e vai fazer uma questão de justiça, porque quem é do INSS tem o regime geral da Previdência e não tem nenhum prejuízo porque recebe muito menos do que o poder público e as categorias especiais.
Então eu acho uma necessidade realmente da reforma da Previdência. É muito melhor fazer agora do que amanhã não ter recurso para pagar aqueles que vão se aposentar.
Antonio Lavareda - O senhor acha que essa reforma de fato será aprovada até o terceiro trimestre, como a média dos agentes econômicos supõe e diz isso em levantamentos?
João Carlos Paes Mendonça - Eu acredito que vai ser aprovada e é uma necessidade que seja aprovada, porque nós estamos com um déficit público muito grande.
A Previdência onera o País de maneira extraordinária.
Não são os pobres, que ganham até R$ 5,7 mil do INSS, não vão ser prejudicados.
Naturalmente algumas mudanças surgirão durante o trajeto dessa reforma, mas ela é necessária, porque os Estados estão numa situação realmente difícil e a nação brasileira também.
Então é uma reforma absolutamente necessária e será aprovada ainda até julho ou, no máximo, até agosto. É importante para o País.
João Carlos Paes Mendonça foi entrevistado por Antonio Lavareda no 20 Minutos (Foto: Gleyson Ramos/Divulgação) - João Carlos Paes Mendonça foi entrevistado por Antonio Lavareda no 20 Minutos (Foto: Gleyson Ramos/Divulgação) João Carlos Paes Mendonça foi entrevistado por Antonio Lavareda no 20 Minutos (Foto: Gleyson Ramos/Divulgação) - João Carlos Paes Mendonça foi entrevistado por Antonio Lavareda no 20 Minutos (Foto: Gleyson Ramos/Divulgação) João Carlos Paes Mendonça foi entrevistado por Antonio Lavareda no 20 Minutos (Foto: Gleyson Ramos/Divulgação) - João Carlos Paes Mendonça foi entrevistado por Antonio Lavareda no 20 Minutos (Foto: Gleyson Ramos/Divulgação) Antonio Lavareda - Fora a reforma da Previdência e a reforma tributária, o que o governo pode e deve fazer de imediato para estimular a economia e rapidamente sair dessa situação na qual o País patina há alguns anos?
João Carlos Paes Mendonça - Eu acho que tem que incentivar o investimento privado, através de concessões, de privatizações; criar toda a infraestrutura; dar um apoio muito grande na habitação, nós temos um problema da maior gravidade em todo o País de falta de habitação.
Precisamos investir porque é assim que absorve mão de obra rapidamente e mão de obra não qualificada, aliado a essas concessões de estradas, portos e aeroportos, como estão fazendo, e vendendo muitas empresas do governo que não funcionam, o governo não pode ser empresário.
Eu tenho a impressão de que, se houver tranquilidade por parte do governo, relacionamento bom entre os poderes, nós iremos, sem dúvida nenhuma, ser beneficiados com esse tipo de atitude.
Antonio Lavareda - Depois de vender o Bompreço a um grupo internacional, seus negócios foram diversificados e uma parte importante deles direcionados ao setor de shopping centers.
Hoje é praticamente impossível uma pessoa que mora nas capitais do Nordeste ou um turista visitar um shopping center que não esteja associado à marca JCPM.
Nesse setor, mais uma vez, o seu grupo se destacou pela inovação.
Mas o setor está mudando, o Brasil está mudando, o mundo está mudando.
Qual é o futuro que o empresário João Carlos Paes Mendonça antecipa para o setor de shopping centers?
João Carlos Paes Mendonça - Nós crescemos muito nos últimos anos e principalmente nas últimas décadas no Brasil.
Shopping de alta qualidade.
Mas nós sabemos que shopping vai passar por uma transformação, tem que haver uma modernidade.
Nós estamos vivendo um período muito forte de inovação, a internet está fazendo mudar muita coisa no mundo e acho que shopping também passa pela modificação.
Mas quem estiver bem localizado, tiver boa prestação de serviços e forte gastronomia, lazer e serviços e com as lojas que o consumidor queira, não tem problema.
Vamos passar com algumas transformações, algumas modificações, mas acho que o futuro ainda está garantido.
Depende de algumas posições importantes, que é no campo de atendimento aos lojistas e ao consumidor, e isso passa pela inovação.
Tem que haver criatividade e acompanhar o que está se passando no mundo.
A localização do shopping é muito importante e eu acho que temos ainda um trabalho bonito para realizar pela frente e é importante para o consumidor porque shopping vem no fundo substituir o que muitas cidades não têm, que é localização para lazer e o shopping tem esse papel importante para a comunidade.
Antonio Lavareda - Como presidente do Sistema Jornal do Commercio de Comunicação, você tem insistido na importância da liberdade de imprensa para a consolidação da democracia, o avanço das conquistas sociais, a melhoria das políticas públicas.
Qual é a sua visão hoje da situação da imprensa brasileira?
João Carlos Paes Mendonça - Todos os segmentos na área de comunicação, que é jornal, rádio e televisão, passam por um processo de modificação.
Eu acho que hoje você tem que ter uma visão muito forte de qual é o seu papel na sociedade.
Por que a imprensa?
Então, a imprensa tem que estar a serviço da sociedade, tem que ter responsabilidade, porque só com responsabilidade você cria credibilidade.
E só a credibilidade que vai ser a manutenção dos veículos de comunicação.
Hoje existe inclusive o jornalismo profissional, que substituiu o jornalismo do passado.
Hoje é diferente, era jornalista e hoje é jornalista profissional, porque os próprios profissionais estão retirando das redações aqueles jornalistas que não estão comprometidos com o momento atual, de jornalismo profissional.
Isso é o que nós acreditamos, no jornalismo profissional, na liberdade de imprensa a serviço da comunidade.
Fora disso, realmente tem muita dificuldade de sobrevivência.
Antonio Lavareda - Nesses 100 anos de Jornal do Commercio, que é o núcleo do seu grupo de comunicação, o que está previsto para os próximos anos desse antigo e novo jornal?
João Carlos Paes Mendonça - São as grandes preocupações de todo segmento, principalmente o jornal impresso, que tem hoje a parte digital que começa a crescer assustadoramente.
Mas se vocês estiver voltado para servir a sociedade, vai levando do impresso lentamente para o digital.
Acho que tem aí a sobrevivência.
Não fiquem pensando que vai desaparecer a notícia, ela, quando chegar ao leitor e ao telespectador, é que vai mudar a maneira de chegar.
Mas que vai haver transformações, modernidade, inovação para atender aos anseios daquele leitor, principalmente da área de jornal impresso, que agora passa a disputar entre impresso e digital.
Antonio Lavareda - O Jornal do Commercio e o sistema como um todo têm, ao longo do tempo, abraçado algumas causas.
Do ponto de vista estadual, a duplicação da BR-232; do ponto de vista mais geral, a criação e o desenvolvimento das escolas integrais; do ponto de vista regional, a transposição do rio São Francisco.
Esse é um caminho para que um jornalismo ativo, vigoroso, continue a sobreviver?
João Carlos Paes Mendonça - Exatamente.
Precisa que o jornalismo esteja extremamente ativo e atendendo aos anseios da sociedade.
Você não pode ficar de braços cruzados fazendo o seu jornal.
O jornal é feito para o leitor, é essa a obrigação do jornalista. É defender os interesses da comunidade, e isso é o que nós estamos procurando fazer todos esses anos.
Estamos aprimorando cada vez mais com qualidade de jornal, qualidade da informação e, por isso, graças a Deus, nós temos credibilidade. É palavra de ordem: credibilidade.
Para formar a credibilidade, é um trabalho muito grande, não é simplesmente querer, é fazer, e isso nós estamos fazendo.
Antonio Lavareda - Nas suas análises, há sempre a distinção entre compromisso social e responsabilidade social das empresas.
Qual é a diferença entre esses dois conceitos?
João Carlos Paes Mendonça - Eu acho que responsabilidade social é obrigação de todo cidadão e toda cidadã. É cumprimento das leis, dos regulamentos, relacionamento com as pessoas.
Isso chama-se responsabilidade social, no mínimo, cumprir as leis, os códigos éticos.
Por outro lado, sensibilidade social, você ter compromisso social é diferente, tem que investir para ajudar a reduzir essa pobreza que nós temos no Brasil e no mundo, todos os países têm.
Isso é que eu acho que é o fator importante, que é o compromisso social.
Eu acho que no futuro não muito distante vai se formar um capitalismo mais social, não socialista, um capitalismo preocupado com o social.
Isso é extremamente importante para que a gente reduza essa disparidade interpessoal de renda, que as pessoas tenham mais oportunidades e, só dependendo do trabalho do governo, nós não vamos resolver.
Então, a sociedade tem que entrar nessa luta, nessa guerra para a gente reduzir, sem dúvida alguma, as diferenças.
Antonio Lavareda - Aumentando a taxa de solidariedade.
João Carlos Paes Mendonça - Eu acho que tem que ser solidário, tem que fazer um trabalho grande.
Nós temos os projetos sociais que realizamos.
Começaram na Serra do Machado, no interior de Sergipe, onde eu nasci.
Nós temos o Instituto JCPM: dois em Salvador, um em Aracaju, dois no Recife, dois em Fortaleza.
Estamos desenvolvendo um projeto de integração e de inclusão desses jovens de 16 a 24 anos no mercado e nas universidades.
Estamos treinando as pessoas e hoje no Recife nós temos 2 mil pessoas trabalhando no Shopping RioMar, de origem nas comunidades de Brasília Teimosa e do Pina.
O Pina tem áreas muito pobres que precisam de apoio não só do governo, mas da sociedade.
Antonio Lavareda - Esse trabalho do instituto com esses jovens próximos aos shopping centers dessas várias capitais consiste em quê?
São recrutados nas respectivas comunidades?
E qual é o treinamento que ele recebe?
João Carlos Paes Mendonça - Eles são recrutados das escolas pública, jovens de 16 a 24 anos, da comunidade, no caso do Recife, Brasília Teimosa e Pina.
Nós fazemos todo tipo de aula de português, inglês, de tecnologia, de formação e preparamos também para cursinhos para universidade, e temos vários universitários hoje dessa região.
Temos tido surpresas agradabilíssimas de ver jovens da periferia, jovens simples, ocupando posições importantes, gente que saiu do Instituto JCPM no Rio Grande do Sul, crescendo na tecnologia, muita gente empregada e muita gente crescendo.
Estamos sentindo de perto o crescimento dessas comunidades no entorno dos nossos shoppings, isso é importante.
Antonio Lavareda - A sua experiência de empresário enveredou pela produção vinícola em Portugal.
Setenta e cinco por cento dessa produção é consumida na Europa.
Qual é o sentimento envolvido e derivado disso?
João Carlos Paes Mendonça - Não deixa de ser um hobby, mas um hobby profissional.
Eu não vou perder dinheiro numa produção de vinhos.
Estamos hoje muito bem, a produção vai muito bem, a qualidade dos nossos vinhos é excelente.
Eu não faço vinho, quem faz é Dirk Niepoort, um dos maiores enólogos da Europa, é estrela no mundo do vinho, não só na Europa, como no mundo inteiro. É um empresário que se poderia chamar de concorrente, tem uma super empresa que atua no mundo todo, é um gênio do vinho, tem uma sensibilidade incrível, faz isso porque tem um amor pelo negócio do vinho e temos um relacionamento excelente. É surpreendente: nós vendemos vinho de qualidade para França, Alemanha, Dinamarca e Portugal, formando os 75%.
Os restaurantes mais conhecidos de Portugal, o brasileiro chega, pede o vinho Maria Izabel e tem.
A entrevista vai ao ar novamente neste domingo (2), às 11h40, na Rádio Jornal.