Estadão Conteúdo - O presidente Jair Bolsonaro (PSL) chega neste domingo (17) a Washington para a primeira visita oficial de seu governo.

O objetivo do Palácio do Planalto é selar a aproximação com os Estados Unidos, iniciada antes mesmo da posse do brasileiro, especialmente com o presidente Donald Trump, com líderes conservadores e com empresários americanos.

Na reunião com Trump, de quem o brasileiro é entusiasta, Brasil e EUA pretendem sacramentar um alinhamento de valores e de políticas entre o americano e Bolsonaro - chamado de “Trump Tropical” pela imprensa internacional.

Apesar da proximidade ideológica e dos elogios trocados pelo Twitter, especialmente na posse do brasileiro, em janeiro, o alinhamento pode não ser automático.

Em outubro, o presidente dos EUA criticou a forma com que as empresas americanas são tratadas no Brasil. “É uma beleza, eles cobram de nós o que querem.

Se você perguntar a algumas das empresas, elas dizem que o Brasil está entre os países mais difíceis do mundo (para fazer negócios)”, disse Trump.

Após o agravamento da crise na Venezuela, porém, os EUA encontraram no Brasil um aliado e a Casa Branca conta com o apoio brasileiro para endurecer contra o regime de Nicolás Maduro.

Os Estados Unidos reconhecem que o momento é propício a uma aproximação com Brasil, em razão de afinidades ideológicas sobre a Venezuela, à perspectiva liberal no campo econômico e ao entusiasmo de parte do governo Bolsonaro com Trump.

A expectativa dos americanos é de que o Brasil continue do mesmo lado dos EUA na pressão a Maduro e, no longo prazo, ajude a diminuir a influência da China na região.

Os dois temas esbarram, no entanto, em diferentes alas do governo.

Os militares já sinalizaram que há um limite no discurso sobre a Venezuela, quando o vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que o Brasil não apoia qualquer ação militar, enquanto os americanos enfatizam que “todas as opções estão sobre a mesa”.

Os assessores de Trump também sabem que, a despeito da retórica crítica à China adotada por Bolsonaro na campanha eleitoral, o país é o principal parceiro comercial do Brasil e o time econômico tenta achar o equilíbrio em meio à guerra comercial dos americanos com os chineses.

Os governos brasileiro e americano querem mostrar com o encontro, contudo, que há uma convergência inédita não só entre Trump e Bolsonaro, mas entre os dois países.

Na visita aos EUA, o governo brasileiro tentará também alavancar a relação de Bolsonaro com o movimento conservador dos EUA e o diálogo com empresários e investidores, capitaneado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.

Caberá a Guedes comandar as conversas com empresários, na segunda-feira, 18, e fazer uma exposição sobre o futuro da economia brasileira na Câmara de Comércio Brasil-EUA.

No mesmo dia, Bolsonaro terá um jantar a portas fechadas com executivos de grandes empresas.

Na terça-feira, Bolsonaro e a comitiva brasileira serão recebidos na Casa Branca.

O presidente brasileiro terá um encontro privado com Trump no Salão Oval e os dois farão uma declaração conjunta à imprensa no Rose Garden.

O comunicado deve mencionar a crise na Venezuela e como Brasil e EUA pretendem atuar unidos pela democracia na América Latina, fazendo uma crítica especial ao “socialismo” de Maduro.

Trump e Bolsonaro também anunciarão medidas concretas, como o acordo de salvaguardas tecnológicas, que permite o uso comercial da base de Alcântara, no Maranhão, e falarão das perspectivas de futuro da relação bilateral.

Neste último eixo se concentra o compromisso de caminhar rumo a um eventual tratado de livre-comércio.

A negociação, no entanto, é considerada difícil em razão de as duas economias serem concorrentes e por esbarrar no Mercosul.

Por isso, o governo brasileiro aposta que o caminho é focar em acordos setoriais de facilitação de comércio e convergência regulatória.

Mesmo assim, parte da agenda prevista pelo Brasil acabou frustrada. É o caso de um acordo que tenta facilitar o cadastro de exportadores e importadores de larga escala, que ainda precisa de mais tempo para sair do papel.

A boa vontade entre os países também não destravou a pauta agropecuária: o governo americano tenta aumentar suas exportações de etanol e carne de porco, que também são produzidos no País, além do trigo.

Do outro lado, o Brasil quer reabrir o mercado americano para a carne crua brasileira.

O governo brasileiro já indicou aos americanos que não haverá indicação imediata sobre o etanol, mas poderia acenar com redução de barreiras no caso do trigo se obtiver uma contrapartida dos americanos.

O Brasil também não deve contar com o apoio formal dos EUA para sua candidatura a membro da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

A adesão vem sendo articulada e defendida por Paulo Guedes como um selo de confiança internacional no Brasil.

Em contrapartida, como prêmio de consolação, os EUA designarão o Brasil como um aliado preferencial fora da Otan.

O novo status facilitaria a transferência de tecnologia no momento em que a indústria aeroespacial brasileira tenta montar uma nova relação com os americanos, após a associação entre a Embraer e a Boeing.

Em termos de prestígio, no entanto, a condição de aliado preferencial fora da Otan não acrescenta muito, já que mais de uma dúzia de países já ganharam o mesmo status, incluindo Argentina, Egito, Tailândia, Jordânia e Tunísia.

Durante a passagem de Bolsonaro pelos EUA, serão assinados ainda memorandos em áreas como biodiversidade e inteligência no combate ao crime organizado - por isso, integram a comitiva os ministros Ricardo Salles, do Meio Ambiente, e Sérgio Moro, da Justiça.

Peter Hakim, presidente do centro de estudos Inter-American Dialogue, em Washington, aponta que há duas questões relevantes para os EUA no encontro.

A primeira é a situação na Venezuela.

A segunda, a diminuição da influência da China na região. “O que os EUA querem é ter o Brasil a seu lado, como aliado”, afirma. “Brasil e EUA têm sido bons amigos, não costumam ter animosidades.

Mas não são bons parceiros.

E países não têm amigos, eles têm interesses”, afirma Hakim.