Por Roberto Numeriano, escritor e autor dos romances Nuvens Vermelhas, Céu de Santo Amaro, As Águas do Fim do Mundo e Folhas Mortas.

Não tenho ilusões de final de ano.

Não guardo orações especiais a Deus.

Se Deus me escuta, saberá entender o meu silêncio.

Também não faço planos.

Muito menos, fantasio qualquer amor ideal.

Se acaso alguém no tempo me deixou para trás, não me quedo em ressentimentos.

Tampouco aceito o dedo acusador de culpas que jamais serão minhas.

Reservo-me apenas o livre-arbítrio de sonhar, antes que os fascistas batam à minha porta Decretando o fim irrevogável das utopias.

Guardo-me ainda das ilusões de regenerar a humana espécie de seus pecados capitais. (Quem sou eu, de mísera alma, a pretender recriar o meu próximo, que às vezes nem enxergo Nas multidões cheias desse vazio de existir?).

Não me iludo com planos de sociedades, secretas ou anônimas, se sei que o dinheiro é arma de qualquer negócio.

Não imagino messias redentores à esquerda, muito menos à direita.

Não pretendo cabalar o divino, esconjurar demônios, profetizar tempos de vacas magras ou gordas.

O que faço é me calar nestes dias de dezembro.

E vagar pelos céus agrestes meu olhar mesmo.

Vislumbro planetas, a lua melancólica, as estrelas no tropel das constelações.

As horas, então, inexistem.

Os segundos são quimeras.

Sequer eu existo.

E me quedo sorrindo para o céu profundo, resplendendo num fulgor negro de luzes.

Penetro assim o eterno, manto incorpóreo infenso aos calendários, às memórias de família, aos amores perdidos, Às mortes e nascimentos.

Talvez Deus aí habite.

Talvez a vida aí pulse.

E todo dia seja 31 de dezembro.

E toda eternidade seja 1º de janeiro.

Recife/PE, 20/12/2018.

Roberto Numeriano é escritor e autor dos romances Nuvens Vermelhas, Céu de Santo Amaro, As Águas do Fim do Mundo e Folhas Mortas.