Por Luciano Siqueira, em artigo especial para o blog Aconteceu quando do governo João Paulo, no Recife.

Encontro casual no supermercado.

Sujeito alto, corpo ligeiramente encurvado, cabelos brancos ralos, sorriso fácil. - É o vice-prefeito? - Sim, pois não? - Muito prazer, tinha vontade de conhecê-lo pessoalmente.

Com prefeito eu conversei outro dia no restaurante vegetariano. - O prazer é meu. - Pois é.

Gosto de conversar com vocês políticos.

Tem coisas que a gente não entende. - Como assim? - O governo de Lula, por exemplo.

Achava que todo mundo ia melhorar um pouquinho a vida, sabe como é, a gente vive no sacrifício, e quando um cara que é trabalhador feito a gente chega lá em cima, a esperança é muito grande. - Tem razão, amigo.

Mas é preciso entender que as coisas não são simples.

Lula herdou de Fernando Henrique um país quebrado.

O Brasil é que nem um veículo ultramoderno, pré-programado de fora para ir na direção dos banqueiros daqui e do estrangeiro.

A missão dele é desfazer a engrenagem dessa programação e mudar o rumo do veículo.

Isso leva tempo e tem muita gente trabalhando contra, até dentro do governo, acredite. - Acredito, sim.

Nem sei como isso acontece, mas acredito, pois em todo lugar tem os que não querem que a coisa vá pra frente, os espírito-de-porco, sei como é. - Então.

Assim, numa conversa rápida, nesse movimento todo, fica difícil esclarecer… - Compreendo. - …quem sabe a gente pode conversar com calma, o amigo participar de uma reunião. - Olhe, reunião eu não sei se tenho paciência não.

Quando a gente passa dos setenta, não aguenta muito bate-boca, não. - É um modo de participar. - Mas quem disse que não participo? É uma participação diferente, mas não deixo de tirar a minha casquinha. - Como assim? - E o senhor acha que eu vou pagar essa compra toda?

Tenho dinheiro não, oxente.

Com o ganho da minha aposentadoria nunca que podia comprar isso que tá aqui no carrinho.

Veja aqui, botei até essa garrafa de Logan 12 anos… - Não estou entendendo. - É o seguinte.

Moro em Nova Descoberta.

Sou idoso, não pago passagem, aí tomo o ônibus, desço aqui na Rosa e Silva, entro nesse supermercado de gente fina, “24 horas”, encho o carrinho de compras, boto tudo de melhor, rodo um pouco, puxo conversa com um, com outro, e depois abandono a carrinho.

Vendem caro, não?

Pois vão ter trabalho comigo! - Essa é a sua maneira de protestar? - Claro.

Abandono o carrinho e vou embora pra casa.

Conto pra minha velha, ela morre de rir com a minha traquinagem.

Na semana passada fiz isso na Carrefour. - Essa é sua maneira de protestar. - É, sim.

Ninguém sabe, nem se incomoda, mas aqui com meus botões eu me vingo.

Mas não espalhe, é segredo. - Segredo guardado, tudo bem.

Mas aceite meu cartão, aqui tem os telefones, endereço eletrônico, quando tiver vontade de participar de uma reunião, é só se comunicar com a gente.

Fique tranquilo que não é bate-boca, não; é até divertido, feito esse seu jeito de se “vingar”. - Passe bem, e dê um abraço no prefeito. - Darei sim.

Foi um prazer conhecê-lo.

Na saída, foi possível perceber à distância que o nosso “vingador” iniciava novo diálogo, agora provocando risos num pequeno grupo de adolescentes.