Reeleito com 50,7% dos votos válidos em Pernambuco, o governador Paulo Câmara (PSB) teve uma campanha marcada por acusações ao presidente Michel Temer (MDB) de perseguir o Estado, reduzindo os repasses de recursos.

O socialista foi o mais votado com o apoio do PT, encerrando a eleição ainda no primeiro turno, como aconteceu também em outros seis estados do Nordeste.

Nesse cenário de maioria de aliados petistas e opositores do deputado federal Jair Bolsonaro (PSL), agora presidente eleito, será ele o novo “Temer” de Paulo Câmara e outros gestores que não estarão alinhados ao Palácio do Planalto?

Há exatamente um mês, em entrevista a Boris Casoy, o parlamentar dava sinais de que não será tão fácil conseguir verba, afirmando que os de oposição mais radical teriam “tratamento secundário”. “Não podemos penalizar o povo por uma questão ideológica da minha parte, você tem que respeitar a vontade popular.

Mas, obviamente, tudo é priorizado.

Vamos priorizar os problemas mais graves e os governadores mais afinados conosco.

Um governador, por exemplo, de um partido que faz uma oposição radical nós vamos tentar não atrapalhar, não (deixar de) beneficiar a população, mas vai ter um tratamento secundário”, disse na entrevista, concedida no hospital Albert Einstein, onde ficou internado após sofrer uma facada que o tirou da campanha de rua desde o dia 6 de setembro.

Em entrevista neste domingo (28), Paulo Câmara, aliado de Fernando Haddad (PT), defendeu a redução das desigualdades regionais, o que estava no plano de governo do petista. “O presidente precisa conversar com os governadores, com os prefeitos e prefeitas.

Isso faz parte da Federação e a gente espera que isso seja feito da forma correta.

Ou seja, olhando o Brasil por inteiro, olhando as regiões com todas as suas peculiaridades.

O desafio do próximo presidente é diminuir as desigualdades regionais, que é fundamental para o Brasil que a gente quer”, disse o socialista.

Temer Com a acusação de que Temer não fez repasses para Pernambuco durante a campanha por questões eleitorais, a Secretaria-geral da Presidência da República divulgou um relatório de oito páginas, em que o governo federal afirma ter implantado pelo menos 348 projetos em 164 municípios pernambucanos, que atingirão R$ 3,23 bilhões até o fim de 2018.

Segundo o JC, nesse aporte, contudo, estão incluídas iniciativas que estão longe de serem consideradas investimentos e obras realizadas pela Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf).

Ainda no levantamento, é citado como investimento para Pernambuco a construção da Barragem do Poço Branco, obra feita no Rio Grande do Norte.

Além disso, são citados os R$ 6,3 bilhões pagos aos beneficiários do Bolsa Família no Estado, em 2017 e 2018; e outras iniciativas da União para alavancar o poder de compra, como a liberação do PIS/Pasep e o pagamento das contas inativas do FGTS. “Nenhuma linha sobre o fechamento do crédito nos bancos oficiais para Pernambuco e nem sobre o fim do repasse para obras importantes como a Adutora do Agreste, que não recebeu nenhum centavo da União em 2018.

O documento também não menciona que Temer impediu por duas vezes a devolução da autonomia de Suape, assim como prometeu e não cumpriu a prorrogação dos incentivos fiscais para que a FIAT realize mais um investimento de R$ 7 bilhões que gerarão 13 mil novos empregos”, rebateu o Governo de Pernambuco.

Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem O início da resposta do Palácio do Campo das Princesas se refere aos empréstimos solicitados à Caixa Econômica Federal e ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O objetivo era conseguir cerca de R$ 600 milhões para investimentos, mas o dinheiro não chegou.

Esse foi o principal motivo de críticas do governador. “Nesse governo a gente não vai tomar empréstimo, esse governo persegue Pernambuco.

Tive que judicializar e até agora não chegou, estão o tempo todo inventando defeitos, novas regras”, reclamou Paulo Câmara antes do primeiro turno.

Ao ser questionado sobre obras prometidas durante a campanha de 2014 que não foram executadas, como a construção de quatro hospitais no interior do Estado que não foram entregues, afirmou que há um subfinanciamento. “Vamos precisar trabalhar com o governo federal para rever essa questão do subfinanciamento”, disse, ainda sem saber que o futuro presidente seria Bolsonaro.

Convênios e transferências obrigatórias Considerando os convênios entre órgãos federais e estaduais, houve uma queda nos últimos anos; veja no gráfico feito com informações do Portal da Transparência estadual: Para além das linhas de crédito e dos investimentos, o governo federal é obrigado constitucionalmente e por leis a repassar recursos para estados e municípios, como é o caso dos fundos de participação dos estados e dos municípios, parte da arrecadação com Imposto de Renda e com o IPI.

Veja como foram essas verbas nos últimos anos, segundo o Portal da Transparência da União, em bilhões de reais: Transposição Em vídeo durante a campanha para o segundo turno, feita primordialmente pelas redes sociais, Bolsonaro prometeu concluir as obras da transposição do rio São Francisco. “No governo, caso nós cheguemos lá, minha ideia é não fazer nenhuma obra nova.

Vamos concluir as antigas.

E essa (a transposição) a gente nem discute a sua importância. É vital para vocês do Nordeste que essa obra seja concluída”, afirmou.

A obra foi iniciada há 11 anos, ainda no governo Lula (PT).

No ano passado, com a entrega do eixo leste, entre Pernambuco e Paraíba, houve uma disputa pela paternidade da transposição.

O trecho foi inaugurado por Temer, palco de um ato com Lula e Dilma Rousseff (PT) e foi objeto para Geraldo Alckmin (PSDB) tentar se aproximar do Nordeste, ao ceder equipamentos da Sabesp, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo.

O eixo norte, o maior, que chega também ao Rio Grande do Norte e ao Ceará e segue inconcluso, estava com as obras paradas e, em 2017, ao assumir a presidência interinamente por causa de uma viagem de Temer, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assinou a ordem de serviço para a retomada da construção.

Hoje, segundo o site do Ministério da Integração Nacional, o trecho tem 95% concluídos.

Foto: Beto Barata/Presidência da República Além disso, os quatro Estados têm obras complementares que sequer começaram. É o caso do Ramal do Agreste, em Pernambuco, necessária para que a transposição atenda, da forma que foi planejada, essa região do Estado.

Sem previsão do ramal sair, foram planejadas alternativas para levar água para a primeira fase da Adutora do Agreste, mas a previsão é de que adutora opere inicialmente com apenas 20% do volume.

Ao prometer entregar a transposição, Bolsonaro acenava para a região, onde perdeu para Fernando Haddad (PT) em todos os estados no primeiro turno - apenas no Ceará, ambos foram derrotados por Ciro Gomes (PDT).

Segunda maior região do País, com 39 milhões de eleitores, o Nordeste foi decisivo para a definição de segundo turno.

Segundo levantamento feito pelo JC, a palavra “Nordeste” aparece quatro vezes, num mesmo parágrafo, se referindo a uma nova matriz de energia limpa e renovável, que terá como matéria-prima os ventos e o sol.

A proposta não é novidade, tendo em vista que os ventos já são responsáveis por quase 50% da energia consumida nos Estados nordestinos e há pelo menos metade de uma década os consultores do setor falam que haverá uma expansão desses dois tipos de energia.

Apoios Bolsonaro mal tinha palanque na região no primeiro turno.

Também não tinha tempo de TV.

Chegou aos nordestinos principalmente pelas redes sociais, seu principal canal de comunicação.

No dia 8 de outubro, afirmou: “se (o médico) me liberar, vou viajar de avião.

Viajarei, sim, ao Nordeste, mas não poderei me expor da maneira como vinha me expondo”.

Acabou não viajando e, mesmo autorizado, preferiu não ir aos debates na televisão.

Apesar disso, conseguiu entrar na casa das pessoas através do guia eleitoral, em que teve o tempo igualmente dividido com Haddad.

Para o segundo turno, considerando apenas Pernambuco, ganhou como aliados o terceiro e o quarto colocados na disputa ao Senado, respectivamente, os deputados federais e ex-ministros do governo Temer Mendonça Filho (DEM) e Bruno Araújo (PSDB).

Ambos são opositores históricos do Partido dos Trabalhadores.

Foto: Divulgação Em discurso no último dia 7, no primeiro turno, Bruno Araújo anunciou que votaria em Bolsonaro.

Antes disso, nos últimos dias antes de ser derrotado, gravou vídeos com aliados do presidenciável, como o senador Magno Malta (PR-ES), que também não foi eleito.

Mendonça publicou cerca de uma semana depois um vídeo nas redes sociais criticando o PT e afirmando que Bolsonaro seria a “esperança”.

Especula-se que o ex-ministro da Educação possa voltar ao cargo no governo do futuro presidente, pelo PSL.

Com a vaga entregue ao pernambucano, pode aproximar o Estado da gestão em Brasília.

Mendonça, no entanto, é opositor de Paulo Câmara.