Por Pedro Josephi, militante do PSOL, em artigo enviado ao blog Corro o risco de ser mal interpretado por setores da esquerda, mas não costumo ter receio de fazer as minhas avaliações.

São mais notas soltas, sem conclusões, mas que chamam uma reflexão para a estratégia necessária para reconquistar o equilíbrio democrático no País.

Não se faz isso sem “gente”, e se chamarmos quase 50% da população brasileira de fascista vamos ficar fadados a perdermos o mínimo que a redemocratização conquistou.

Pois bem, sinto que a imensa maioria de quem vota em Bolsonaro não é fascista.

Não é mesmo.

Tem muita gente pobre, negra, trabalhadora, pessoas das classes populares, milhares de desempregados ou ainda que estão jogados a própria sorte sem educação e renda neste grupo.

Pessoas que se referenciaram durante muito tempo na esquerda e para quem nós (da esquerda) muitas vezes dizemos falar.

Mas, “cansaram”.

Se frustaram.

Passaram alheias ao impeachment.

Não foram chamadas “a jogar o jogo”.

Ou foram traídas pela política.

Somados a estes, temos setores da classe média que perderam o encanto no debate ético, estão cansados de suportar a distorção da carga tributária e estão assustados com os alarmantes índices de violência urbana que os atingem, sobretudo nos crimes patrimoniais.

Acrescenta-se aos grupos supracitados, uma grande parte de ricos que pouco se importa com quem estará à frente do Estado, pois não depende dele para suas movimentações culturais, econômicas e sociais.

Vivem em um mundo totalmente à parte e tanto fez como tanto faz o nível de democracia da nossa sociedade.

Nessa soma numerosa e expressiva de eleitores, parte está cansada (ou acaba por reproduzir este discurso) da mesmice na política, dos mesmos discursos, das mesmas ações e promessas e quer e aposta em uma mudança “radical” (basta ver que temos candidatos do PSL super votados e do PSOL também nas cabeças das eleições parlamentares, por exemplo) talvez por fora do sistema e com uma pitada de autoritarismo (sim, nossa sociedade é autoritária e marcada por autoritarismo, basta ver as inúmeras relações que temos: pais com filhos, marido com esposa, patrão com empregado, empregado com diaristas, empregado formal com trabalhador informal e isso se traduz nas relações políticas também).

Observam e lêem Bolsonaro como alguém que encarna justamente isto.

Uma outra parte foi insuflada por uma corrente (midiática, social, partidária e judiciária) que atribui ao PT todos os casos de corrupção no país, perdeu a referência no partido e apagou da memória (sim, esquecemos até em quem votamos quanto mais quem fez “algo”) as políticas de inclusão social dos governos Lula. É óbvio que o PT tem culpa no cartório, mas esta corrente se desconstrolou e se reverbera nas milhares de notícias falsas espalhadas nas redes sociais (antes impulsionadas pela direita partidária e raivosa que não aceitou a derrota eleitoral) que desabonam não só o PT, mas em qualquer agremiação que ouse falar em “direitos”.

Qualquer uma.

E Bolsonaro, meio que sem querer, ocupou este espaço, deixado pelo PSDB, sobretudo pela condução deste partido nos mesmos casos de corrupção do PT.

Aécio Neves simboliza este cenário.

A grande questão é: não adianta atacar Bolsonaro.

Sabe aquilo que Lula disse que seria uma “ideia”?!

Se aplica a Bolsonaro.

Bolsonaro é hoje uma salada mista de ideias, anseios, medos, inseguranças, temor, desespero que se fortifica em negar o PT ou qualquer coisa que esteja “dentro da política”.

E aí, por mais que desconstruamos Bolsonaro, por mais que demonstremos que ele não está fora da política, pelo contrário é um político profissional e até pouco tempo inexpressivo no Parlamento, surgirá um outro alguém que também ocupará esse espaço se não agirmos com inteligência.

E agir com inteligência não é acusar quem vota em Bolsonaro de fascista!

As coisas não são assim!

O reequilíbrio democrático passa por reconquistar estas pessoas para a política, para saídas e mudanças democráticas.

Hoje, voto e faço campanha para Haddad, não por concordar com o PT ou com seu programa, mas por perceber o perigo de uma minoria que vota em Bolsonaro, essa sim fascista e intolerante, que estava adormecida e que colocou o seu ódio pra fora (como colocam os maridos que não aceitam a separação, por exemplo).

Bolsonaro e seus filhos fazem política com o fígado, mudam a todo tempo, não se entendem com Paulo Guedes, mas por carregarem o espectro de autoritarismo referenciam esta turma.

Essa turma é perigosa.

Essa turma mata, ameaça, mas antes as justificativas eram apenas políticas, hoje são eleitorais.

E o nosso papel e apelo é primeiro ouvir um ditado que nossos velhos sempre diziam “quem anda com os porcos, farelo come”, e a partir daí construir uma narrativa que possibilite isolar essa minoria fascista que idolatra Bolsonaro.

Idolatra não por ele, mas porque viram na salada mista de suas ideias um aporte fático para espalhar e fazer o mal.

Lembro que o PT esteve em todas as últimas eleições pós redemocratização concorrendo ao cargo da presidência da república, e não vimos mortes e agressões em razão das escolhas eleitorais de cada um.

Ou seja, não dá para atribuir ao PT está situação. É compreensível o aumentar das tensões em meio às disputas acirradas, mas neste nível em que estamos hoje compromete a nossa frágil democracia e civilidade.

Precisamos conclamar, mas sem discurso de autoridade, fazendo autocrítica, conversar, dialogar com a imensa maioria dos que votam em Bolsonaro e demonstrar a barbárie que essa minoria fascista anda fazendo, e isso passa por não traçar uma mesma régua para todo mundo que vota em Bolsonaro.

Pode ser que Bolsonaro ganhe, pode ser, mas se não seguirmos essa estratégia vamos perder não só uma eleição, mas perderemos pessoas.

E sem pessoas a política vira zona comum e morta.

São reflexões de quem tem nas últimas semanas circulado e participado de intensos debates onde hoje a política tem ocorrido: no WhatsApp!

Pedro Josephi apresenta-se como advogado, professor e mestre em Direito pela UNICAP