Uma apuração do Projeto Comprova averiguou que é enganoso o vídeo que afirma que o candidato do Partido Novo à Presidência, João Amoêdo, é ligado ao magnata George Soros e trabalha para uma de suas organizações, a Open Society Foundations, acusada na gravação de ser “criminosa” e de “financiar a esquerda em todo o mundo”.
Há fatos verdadeiros no vídeo, mas que aparecem misturados a informações inverídicas.
Um dos principais argumentos do vídeo para ligar Amoêdo a Soros é a relação do bilionário húngaro-americano com o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga (1999-2003).
Entre 1993 e 1999, o economista brasileiro foi diretor-gerente do Soros Fund Management (SFM), a firma de investimentos de Soros, mas após deixar o BC abriu sua própria empresa, a Gávea Investimentos.
Ao Comprova, Fraga disse admirar o trabalho da Open Society Foundations, mas confirmou que não tem vínculos com Soros.
No vídeo, Armínio Fraga é apontado como parceiro de Amoêdo na criação do Partido Novo.
Ocorre que o economista não está na relação de fundadores do Novo e não é filiado à agremiação.
A assessoria do partido informou ao Comprova que Amoêdo e Fraga são “conhecidos, mas nunca tiveram relação pessoal”.
Fraga, por sua vez, afirmou que nunca atuou em sociedade com Amoêdo.
Veja mais TCU fez auditoria mas não responsabilizou Haddad por rombo no Fies Críticas aos direitos dos professores não foram feitas por João Amoêdo Além de Fraga e Amoêdo, o vídeo aponta uma terceira pessoa como artífice da criação do Partido Novo: outro ex-presidente do Banco Central, Fernão Bracher.
O vídeo acerta ao afirmar que Bracher comandou o Banco Central no governo de José Sarney, responsável por iniciar a política de venda de estatais, mas não é possível apontar que Bracher, enquanto no cargo, era o “líder do programa de privatizações”.
De fato, Bracher fundou o banco BBA, como diz o vídeo, mas após deixar o governo, em 1988.
O banco atuou nas privatizações e foi a única instituição brasileira a coordenar o consórcio de bancos estrangeiros para investimentos no programa de privatização.
A origem da relação entre Bracher e Amoêdo que aparece no vídeo está correta.
Amoêdo trabalhou no BBA ao lado de Bracher.
A companhia cresceu e, em 2002, foi vendida ao banco Itaú.
Hoje, a Itaú-BBA é o braço do conglomerado responsável por atender investidores e empresas com alto faturamento.
O que não procede no vídeo é a alegação de que Fraga atuou com a dupla.
Nos 11 anos em que Amoêdo atuou no banco BBA (1988/1999), Armínio Fraga, que supostamente seria a ligação do candidato com Soros e a Open Society, passou pela gerência de operações do Banco Garantia (1985/1988), no Rio de Janeiro, pela vice-presidência do Salomon Brothers, em Nova York (1989/1991), pela direção de assuntos internacionais do Banco Central do Brasil (1991/1992) e pela Soros Fund Management (1993/1999), também em Nova York.
Outra suposta ligação entre Amoêdo e Soros seria o banco Itaú, apontado na peça como um “império” que teria “fortes ligações com George Soros”.
O Itaú Unibanco é, de fato, um dos maiores conglomerados financeiros do mundo, mas não há qualquer evidência sobre Soros ser o dono do banco.
Em 2010, ele comprou ações do Itaú, conforme publicou a revista Exame.
Essa publicação tem servido para alimentar boatos sobre a instituição pertencer ao megainvestidor.
O vínculo de Amoêdo com o Itaú se deu apenas por meio do braço da instituição dedicado aos altos investidores, o Itaú-BBA, resultado de aquisição realizada em 2002.
Entre 2009 e 2015, ele integrou o conselho de administração da investidora.
Amoêdo entrou pouco depois da fusão entre Itaú e Unibanco, anunciada em novembro de 2008.
Antes disso, a partir de 2004, ele havia sido vice-presidente e membro do conselho de administração do Unibanco.
O Partido Novo é apontado no vídeo como extensão do banco Itaú e da atuação do suposto trio Bracher-Amoêdo-Fraga.
Como dito acima, Fraga não atuou com Bracher e Amoêdo.
Bracher, que foi presidente da Itaú-BBA, não está na lista de fundadores do Partido Novo, mas doou R$ 50 mil para ajudar a erguer o partido, fundado sob liderança de Amoêdo em 2011, além de outros R$ 50 mil à campanha presidencial deste ano.
Seu filho, Candido Bracher, é atualmente o presidente do Itaú Unibanco.
O Itaú não tem vínculos institucionais com o Partido Novo, mas executivos e ex-executivos do banco estão entre os diversos empresários que fizeram doações à agremiação quando esta foi criada, como mostrou reportagem do jornal Valor Econômico de setembro de 2016.
Atualmente, o Novo é presidido por Moisés Jardim, que foi diretor do Itaucred, outro braço do Itaú Unibanco.
Para apresentar o Novo como um partido de esquerda com “layout novo” e financiado por George Soros, o vídeo elenca equivocadamente uma série de organizações supostamente patrocinadas pela Open Society Foundations, a organização filantrópica do bilionário.
A OSF já investiu US$ 32 bilhões em projetos ao redor do mundo, e seus financiamentos concedidos são abertos.
Não há na listagem patrocínios a Foro de São Paulo, MST, “Partido Comunista”, PT ou PSDB — nomes citados no boato.
Por outro lado, consta um financiamento de cinco meses à Fundação Instituto Fernando Henrique Cardoso, em 2016, no valor de US$ 15.700, e um de US$ 53.633 à organização Quebrando o Tabu, que recebeu dinheiro da OSF por 18 meses.
A peça, de quase cinco minutos, foi enviada ao WhatsApp do Comprova (11) 97795-0022 por diversos leitores.
O Comprova entrou em contato com a Open Society Foundations e um porta-voz da organização informou que o vídeo é “impreciso”.
Procurado pelo Comprova, o Itaú preferiu não se manifestar.
Projeto Comprova Iniciado neste mês de agosto, o projeto Comprova já desenvolve suas operações de combate à desinformação e a conteúdos enganosos na internet durante a campanha eleitoral.
Coordenada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), a coalizão reúne 24 organizações de mídia de todo o Brasil, e checa textos, imagens e áudios sem origem definida.
Nenhum conteúdo poderá ser publicado até que três diferentes redações concordem com as etapas de verificação anexadas ao relatório sobre uma informação avaliada, em um processo conhecido como “crosscheck”.
O objetivo do projeto é identificar e minar técnicas sofisticadas de manipulação e amplificação online.
O fluxo de trabalho foi projetado para incentivar a investigação colaborativa entre redações, que poderão continuar após as eleições.