Por José Paulo Cavalcanti Filho, em sua coluna no Diário de Pernambuco Entre tantos dias, 25 foi o do Escritor.

Reverências à data, então.

Para Sartre, “O mundo pode passar muito bem sem a literatura.

Mas, sem o homem, pode passar ainda melhor”.

Segundo Joaquim Nabuco, “A profissão de escritor deve merecer toda a piedade”.

Balzac: “Os doidos e os escritores são os homens que vêm um abismo e se lançam nele”.

Mais razão tinha o livreiro Antônio Carlos Vilaça, “Literatura é um testemunho para que a vida e a morte não sejam em vão.

Encaro a literatura como uma vitória sobre o tempo e sobre a morte”.

Só que, ao lado da literatura das academias, há uma outra relevante.

A do indeterminado cidadão comum do povo.

Manuel Bandeira até falava nisso, ao lembrar “A língua errada do povo/ Língua certa do povo”.

Silvio Romero, fundador da Academia Brasileira de Letras, comparou a poesia clássica de seu tempo à dos cantadores.

Para ele, “esses versinhos que por aí andam podem ser água, mas de chafariz, banho morno em bacia com sabonete inglês e esponja”.

Enquanto, a dos cantadores, é “água farta, rio que corre, mar que estronda”.

E tinha razões, para isso.

Todas as razões.

Tome-se, como exemplo, o tema da SAUDADE.

Basta comparar o estilo dos versos para ver beleza nos dois.

São diferentes, mas são belos.

Adelmar Tavares, presidente da ABL em 1948, escreveu: “Para matar as saudades,/ Fui verte em ânsias, correndo…/ E eu que fui matar saudades/ Vim de saudades morrendo”.

Enquanto o cantador Antônio Pereira (O poeta da Saudade, de Itapetim): “Saudade é um parafuso/ Que na rosca quando cai/ Só entra se for torcendo,/ Porque batendo não vai/ E enferrujando dentro/ Nem distorcendo não sai”.

Mais exemplos.

Abgar Renault, presidente da ABL em 1993: “Já não sinto saudade de mais nada,/ A não ser do começo da escalada,/ Quando o azul era azul de azul sem fim/ E Deus criava o mundo em mim”.

E Antônio Pereira: “Quem quiser plantar saudade/ Primeiro escalde a semente/ Plante num lugar bem seco/ Onde o sol bata mais quente/ Que se plantar no molhado/ Quando nascer mata a gente”.

Casimiro de Abreu, morto em 1860 (por isso não entrou na ABL, fundada só em 1897), nos mais conhecidos versos brasileiros sobre o tema, escreveu: “Oh! que saudades eu tenho/ Da aurora da minha vida,/ Da minha infância querida/ Que os anos não trazem mais!/ Que amor, que sonhos, que flores,/ Naquelas tardes fagueiras/ À sombra das bananeiras,/ Debaixo dos laranjais!” E, de outro lado, o cantador Severino Pinto (de Monteiro): “Essa palavra saudade/ Conheço desde criança/ Saudade de amor ausente/ Não é saudade, é lembrança/ Saudade só é saudade/ Quando morre a esperança”.

Nenhum personagem representa melhor o Nordeste.

O cantador é seu rosto e sua voz.

A resistência, a cultura (levemente inculta), a astúcia – que, segundo mestre Ariano, é a “coragem dos pobres”.

Câmara Cascudo até dizia: “O cantador é a voz da multidão silenciosa, a presença do passado, o vestígio das emoções anteriores, a história sonora e humilde dos que não têm história”.

Por tudo pois, neste dia, devemos prestar homenagem também à sabedoria, à erudição, à simplicidade, à língua certa do povo, futuro prometido, miséria e opulência, realidade e ilusão, o pecado e o paraíso da voz iluminada dos cantadores nordestinos.

P.S.

Paro agora de escrever, por algum tempo.

Abraço a todos os leitores.

E até breve.