Por Fernando Holanda, em artigo enviado ao blog de Jamildo Parece que alguns vereadores do Recife não se cansam de prestar desserviços à cidade. É fato que a imagem da Câmara já não anda lá essas coisas depois da tentativa de aumento abusivo do auxílio-alimentação, dos tantos debates improdutivos que ocorrem na Casa ou mesmo do famigerado vídeo em que um vereador balbucia a ordem do dia sem qualquer compromisso com o conteúdo.

Mas alguns deles parecem insistir em contrariar a máxima do Tiririca, tentando provar que, sim, pior do que está ainda pode ficar.

A mais recente é a proposta de desligar a fiscalização de trânsito nos horários de pico.

Ainda em 2017, os vereadores aprovaram um Projeto de Lei neste sentido.

Projeto que não dispunha de absolutamente nenhum embasamento técnico e que não chegou a ser debatido uma única vez com a sociedade.

Algo muito semelhante ao que foi feito meses depois ao se contestar as faixas azuis do Pina.

O Prefeito acertadamente vetou o tal projeto e impediu o Recife de andar pra trás.

Acontece que quase um ano depois, não se sabe por que cargas d’água, a Prefeitura anunciou que daria trela a esta ideia estapafúrdia e “faria um teste” durante o mês de agosto.

Ou seja: atenderia o pleito dos vereadores e mediante uma medida administrativa desligaria a fiscalização eletrônica de velocidade nos horários de pico por trinta dias.

Não observou no entanto que a própria CTTU associa à fiscalização eletrônica a expressiva queda de 80% no número de ocorrências de trânsito com vítima na cidade.

E que, apesar de ter tomado importantes medidas para humanizar a mobilidade urbana - como a instalação das próprias faixas azuis, a requalificação de quilômetros de calçadas e a implantação de ciclofaixas e ciclovias (que ainda podem melhorar muito) - o Recife ainda é uma das capitais onde mais se morre atropelado no Brasil.

E que para os dois terços das pessoas que andam a pé, de bicicleta ou de transporte público, a instalação dos mais de 100 equipamentos de fiscalização (como pardais, fotossensores e radares) representam o que há de mais importante na mobilidade urbana, que a segurança do seu ir e vir.

Segurança que inclusive é adotada como prioridade absoluta do trânsito no acertado Plano de Mobilidade Urbana do Recife que está sendo desenvolvido pela própria Prefeitura.

Não há absolutamente nenhuma justificativa técnica para a realização deste teste. É um equívoco dizer que nos horários de pico o trânsito já é muito lento, que a fiscalização atrapalha, que há uma indústria da multa na cidade.

Basta observar os dados para ver que 1 em cada 4 mortes no trânsito do Recife acontecem justamente nos horários de pico.

E que o excesso de velocidade é a infração mais cometida pelos motoristas na cidade, representando quase a metade do total de multas aplicadas entre janeiro e abril deste ano. É óbvio que o aumento da velocidade média (a tal fluidez) se faz com melhoria da infraestrutura da mobilidade (inclusive para pedestres e ciclistas), com a qualificação da sinalização (semafórica, vertical e horizontal) e, principalmente, com a redução da frota circulante na cidade, que hoje passa de um milhão de veículos.

Insistir em responsabilizar a fiscalização eletrônica por qualquer problema da mobilidade urbana é pura ignorância ou uma tremenda falta de honestidade intelectual.

Felizmente, a sociedade civil tem se mobilizado contra a realização do tal teste e ainda há tempo para a Prefeitura revisar sua decisão.

Em menos de uma semana, mais de 500 pessoas já aderiram ao abaixo-assinado publicado pela Associação Metropolitana de Ciclistas do Grande Recife (Ameciclo) no site da rede Meu Recife.

E especialistas de todo o país começam a se manifestar sobre o grande erro que seria arriscar a vida das pessoas em nome de um teste.

Seria incoerente desperdiçar o esforço adotado para acalmar o tráfego na cidade (como a implantação das zonas 30, por exemplo) para atender a um pleito desprovido de qualquer justificativa técnica.

Cabe à Prefeitura mostrar que a segurança das pessoas é, de fato, prioridade sobre qualquer outro aspecto da mobilidade (e da política) no Recife.

Fernando Holanda é membro do Conselho da Cidade do Recife, onde representa a RAPS - Rede de Ação Política pela Sustentabilidade.