“O outro era ele mesmo” Por Maurício Romão, especial para o Blog de Jamildo Disse o coronel Aureliano Buendía, em “Cem anos de solidão”, que a diferença entre liberais e conservadores em Macondo era a de que os liberais iam à missa das cinco horas e os conservadores iam à missa das sete…
Vivesse no Brasil, diante de partidos tão inorgânicos, o coronel ia repetir algo parecido sobre os rótulos de esquerda e direita em terras tupiniquins.
Considere-se a tabela acima (são 5.565 os municípios brasileiros).
Nela têm-se quatro partidos que se auto-intitulam de “esquerda”, PPS, PDT, PSB e PT.
Há também listados três partidos carimbados como mais direitistas, pertencentes ao “centrão”: PP, DEM e PR.
Os dois “campos” não tiveram nenhum prurido programático e danaram-se a fazer alianças entre eles em 2012 (se atualizada a tabela para 2016, os números devem ser bem parecidos).
Tome-se o PT, a sigla que mais simboliza o “campo” de esquerda, à guisa de exemplo.
Só com o PP os petistas fizeram coligação em 1.531 municípios (27,5% dos municípios).
E o que dizer das alianças do PT com o seu oposto, sua antítese, o “centrista” PSDB?
Juntaram-se em 20,2% dos municípios.
E com outro centrista, hoje inimigo mortal, o eclético PMDB?
Mancomunaram-se em mais de 2 mil municípios (36,4%).
Em uma crônica escrita em setembro de 1878, intitulada “Coligações”, Machado de Assis disserta sobre a aliança entre dois partidos na comarca de S.
Vicente, de cujo texto são extraídas as seguintes passagens: “Dizem os alemães que duas metades de um cavalo não fazem um cavalo.
Por maioria de razão se pode dizer que metade de um cavalo e metade de um camelo não fazem nem um cavalo nem um camelo”.
No caso dos dois partidos, continua ele: “…ignoro o modo pelo qual as duas metades dos dois programas foram coladas às metades alheias. …O ponto mais obscuro deste negócio é a atitude moral dos dois partidos, a linguagem recíproca, as mútuas recriminações.
Cada um deles vê no adversário metade de si próprio.
O nariz de Aquiles campeia na cara de Heitor.
Bruto é o próprio filho de César. …Nenhum deles podia acusar o outro de se haver ligado a adversários, porque esse mal ou essa virtude estava em ambos; não podia um duvidar da boa-fé, da lealdade, da lisura do outro, porque o outro era ele mesmo, os seus homens, os seus meios, os seus fins”.
A crônica em setembro agora faz 140 anos…