A terceira fase da Operação Torrentes, que cumpriu três mandados de prisão preventiva nessa terça-feira (15), cita um assessor o ex-presidente José Sarney (MDB-MA).
Ao defender as prisões, a Polícia Federal usou como prova a transcrição de uma conversa no WhatsApp entre os acusados em que eles comentam sobre um suposto pedido para que o auxiliar do emedebista interferisse na liberação de um dos carros apreendidos na primeira fase da ação, deflagrada em novembro do ano passado, em Pernambuco. “A audácia dos investigados é algo que salta aos olhos.
Não bastassem as atitudes de buscarem interferir, por meio de suposta influência política, no curso das investigações, os requeridos demonstraram total desrespeito com os órgãos de persecução e nenhum grau de intimidação com a ação do legítimo poder estatal”, afirmou o juiz Rafael Chalegre do Rêgo Barros, da 13ª Vara Federal em Pernambuco.
O processo está sob sigilo.
Um dos presos foi o lobista e pastor evangélico Daniel Pereira da Costa Lucas.
Alvo das duas fases anteriores da Torrentes, teve dois carros de luxo apreendidos pela Polícia Federal em novembro, um Jeep Compass Longitude e um Range Rover Sport 3, avaliados, segundo a PF, em R$ 600 milhões.
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A negociação seria, segundo a PF, para liberar os veículos, um em Pernambuco e um na Bahia.
De acordo com a decisão, eles são primos e Bezerra é “parentes em certo grau” de José Sarney.
As investigações apontaram, de acordo com a polícia, que houve trocas de mensagens entre os presos em janeiro, antes da deflagração da segunda fase da Torrentes. » Torrentes: acusado tem habeas corpus, mas fica preso por nova operação » Segunda fase da Torrentes aponta desvio de recursos do combate à seca » PF deflagra segunda fase da Operação Torrentes em Pernambuco e no Maranhão » Operação Torrentes: Polícia Federal ainda não localizou dinheiro supostamente desviado » Torrentes: Justiça Federal diz que investigados têm ‘influência política inconteste’ “Ato contínuo, no período compreendido entre 7 e 8 de fevereiro de 2018, José Bezerra dos Santos comunicou-se com Carlos Roberto de Souza Lima, articulando possível contato com a pessoa de Wanderley - que as investigações apontam se tratar de Wanderley Ferreira de Azevedo, assessor direto do ex-presidente José Sarney - a fim de que os carros, apreendidos fossem liberados por meio de mecanismos não republicanos consistentes na indevida interferência política sobre os órgãos de persecução penal”, afirma o juiz na decisão.
O Blog de Jamildo tentou contato com o escritório de Sarney onde Wanderley atua, mas não foi atendido, enviou um email e aguarda o posicionamento dele. “Vale ressaltar, diga-se de passagem, que, em um dos diálogos acima reproduzidos, José Bezerra dos Santos deixa claro que esteve em Brasília e entregou a Wanderley não só a conclusão do inquérito em que Daniel Lucas não teria sido indiciado pela prática de crimes, mas também o ‘papelzinho’ que diz que a concessionária (em Salvador, citada em conversas) figurara como fiel depositária de um dos veículos.
No mesmo trecho, José Bezerra dos Santos ainda detalha a resposta que obteve de Wanderley no sentido de que o caso seria uma ‘besteira’, que a Polícia Federal fazia essa ‘sacanagem’ mesmo e que ele depois falaria com o ‘cara’ - não identificado - e pediria a liberação do carro de luxo”, relata o magistrado. “Embora a autoridade policial não tenha logrado identificar quais autoridades máximas da PF se tentariam cooptar, os elementos colhidos até o presente momento são robustos quanto ao fato de os investigados terem vias de acesso privilegiadas para interferir ativamente em operação policial de alta envergadura e repercussão social”, considerou. “É preciso que se tenha em mente a atualidade da suposta tentativa de intervenção ilícita sobre o andamento dos trabalhos policiais.
Os fatos remontam a pouco mais de dois meses (fevereiro de 2018).
E, considerando-se o nível de audácia que envolveu a ação dos investigados, conforme já analisado acima, tudo leva a crer que, caso permaneçam em liberdade, continuarão se valendo de mecanismos não-republicanos para obstar o curso das diligências policiais”, argumenta o juiz na decisão.
Torrentes no Maranhão Daniel Lucas é apontado pela Polícia Federal como o elo entre os supostos esquemas em Pernambuco e no Maranhão.
Em depoimento à PF, Carlos Roberto - que chegou a ter o pedido de prisão negado na segunda fase da Torrentes - afirmou que foi apresentado ao pastor por José Bezerra.
Ligado à empresa FJW, investigada em todas as fases da operação, o acusado teria procurado o representante da gestão do Maranhão para participar de licitação de cestas básicas que seriam distribuídas no interior do Estado e teria oferecido R$ 15 mil “a título de gratificação” por ter intermediado o contato entre ele e o coronel João Vanderley Costa Pereira, então comandante geral do Corpo de Bombeiros.
A Operação Torrentes foi deflagrada em novembro para investigar supostas fraudes em contratos de assistência às vítimas das enchentes na Mata Sul pernambucana em 2010 e 2017, com foco na Secretaria da Casa Militar.
A apuração começou a partir de um relatório da Controladoria Geral da União (CGU) em 2016 apontando irregularidades como superfaturamento em 15 licitações entre 2010 e 2015.
Em fevereiro, a Polícia Federal investigou se as verbas federais para ajudar no combate à seca em 2013 no Maranhão foram alvos de superfaturamento e possível não execução dos serviços contratados firmados com a administração maranhense, por meio do comando do Corpo de Bombeiros, em esquema semelhante ao pernambucano.
Já foram oferecidas quatro denúncias pelo Ministério Público Federal (MPF).