Por Ayrton Maciel, jornalista A atividade política tem, como qualquer exercício humano, virtudes e imperfeições.
Na política, com maior consequência - porque atinge a muitos - uma vil perversão é um dos gestos mais dolorosos de políticos: premiar a ingratidão.
Tanto quanto a própria ingratidão.
Na primeira semana legislativa de 2018, antes do Carnaval, a articulação sobre a rejeitada reforma da Previdência de Michel Temer foi o foco da mídia.
Nos bastidores do Congresso, porém, negociações e conversas locais visando as eleições de outubro ocorreram em paralelo sem despertar maior curiosidade.
Em meio às conversas de gabinetes e restaurantes, num afunilamento de cenários eleitorais, Pernambuco esteve no palco das alianças desenhadas, algumas parecendo esdrúxulas e outras surreais de tão incompreensíveis.
Mas, possíveis. É a política.
Uma delas - tendência da cúpula forte - é para onde parece marchar o PT: os braços do PSB, o detrator infiel.
O encontro do governador Paulo Câmara e comitiva com o ex-presidente Lula, em São Paulo, nesta quinta-feira (15), praticamente afiança e consolida a aliança que parecia impensável após o impeachment de Dilma.
Afinal, é juntar golpeado e golpeador ou “ex-governo fracassado” e “golpista”, conforme se tratavam.
Vem-nos, então, a imagem da ingratidão política.
Disse o francês Alexandre Dumas: “Há favores tão grandes que só podem ser pagos com a ingratidão”.
Entre 2015 e 2016, a esquerda - encabeçada pelo PT - enfrentou uma luta desigual contra uma maioria artificial - da qual fez parte o PSB - formada para derrubar a presidente Dilma, eleita por 54 milhões de brasileiros.
Uma luta sem sucesso: Dilma caiu.
E para a queda de Dilma foram vitais os votos do PSB, que tinha 31 deputados.
Se 25 tivessem votado “não”, o impeachment teria sido derrotado.
O governador Paulo Câmara chegou a liberar seus secretários - licenciados da Câmara Federal - para votar a favor da queda de Dilma.
Uma simples e aritmética conclusão: o PSB foi golpista.
Entretanto, a política - como exercício humano - é ingrata.
O que se tem, agora, como muito provável, é a ida do PT para a aba de Paulo Câmara.
Posição que, aparentemente, vai de encontro à vontade da maioria da militância do PT.
E posição que contraria a oportunidade de renovação.
Neste perplexo cenário político, vítima e autor se recompõem.
Traído e traidor se perdoam. É como o PT desculpando-se: “perdoa-me por me traíres”.
E o PSB respondendo: “esquece.
Não foi por mal.
Foi só uma oportunidade”.
Afinal, quem é mais ingrato: o PSB que chancelou a queda de Dilma ou o PT que esquece a rasteira, distancia-se de aliados, veta alternativa própria e, como traído arrependido, volta à casa abandonada?
Resposta: ambos não prezam fidelidade. É política, “cara”! É uma questão de sobrevivência política.
Para o PT e o PSB.
Sem ironias: a política é pragmática.
Não deve ser condenada por isso, mas fica ruim quando não respeita regras (não escritas) de convivência.
O mínimo de lealdade, o mínimo de afinidade, fidelidade e solidariedade, acordos e diálogo com os militantes.
O esquecimento é a alma da ingratidão.
Quem lutou, lutou; quem gritou, gritou.
Agora, a vez é do silêncio, irmão da cumplicidade.
Não se desconhece a necessidade de alianças e as influências das circunstâncias nacionais e locais.
Mas, em tese, pelo que se conhece da militância petista, depender de quem lhe foi algoz parece ser um perdão às avessas.
No caso específico de descartar uma candidatura própria, em Pernambuco, é como abrir mão de tentar ser protagonista para ser coadjuvante. É a má política?
Resposta: é a política como ela é.