O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso concedeu uma entrevista ao jornal Estadão Conteúdo em que fala sobre a possível condenação do ex-presidente Lula pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no âmbito da Operação Lava Jato.

FHC também faz uma avaliação sobre o PSDB, partido que é filiado.

Confira.

EC - Estamos há menos de um mês do julgamento do recurso de Lula no TRF-4.

Do ponto de vista da sociologia e da política, qual seria o impacto para o País de uma eventual condenação de um ex-presidente da República?

FHC - Do ponto de vista do País, é sempre ruim. É ruim para o País e para a memória, mas não acredito que a população vai tremer nas suas bases por causa disso.

Não acho que o País vai tremer em função disso. É claro que existe também uma estratégia política do PT: a perseguição.

Se o julgamento terminar em condenação, tem que aceitar.

LEIA TAMBÉM » Prefiro vencer Lula nas urnas do que vê-lo na cadeia, diz FHC em discurso EC - Como o sr. explica o fato de o Lula liderar as pesquisas?

FHC - Pega o caso do Peru, que nós citamos.

O fujimorismo é a força predominante até hoje, e o Fujimori está na cadeia (estava até o dia 24, quando recebeu indulto humanitário do atual presidente Pedro Pablo Kuczynski).

O próprio Perón teve um momento assim. É curioso ver que em países como os nossos, com um nível educacional relativamente pouco desenvolvido, as pessoas têm muitas carências.

Aqueles que dão às pessoas a sensação de que atenderam às suas carências ganham uma certa permissão para se desviar da ética. É pavoroso, mas é assim. É populismo. É a cultura que prevalece nesses países.

A nossa está em fase de mudança.

Aqui a sociedade já tem mais informação.

Nos regimes parlamentaristas têm menos chance de que isso aconteça.

Tem mais filtros.

A emoção global não leva de roldão.

Pode alguém irromper, mas difícil é governar depois.

EC - O senhor disse que o PSDB precisa fazer autocrítica.

Qual seria?

FHC - Acho que o PSDB está, à sua maneira, fazendo.

Mudou a direção e, ao mudar, escolheu pessoas com responsabilidade.

Não que os outros não tivessem.

Aécio (Neves, senador por Minas Gerais e ex-presidente do PSDB) não é um irresponsável.

Fez coisas positivas para o PSDB.

Mas o partido tem que dizer que, se houve erro de algum peessedebista, problema dele.

O partido não tem que se solidarizar com o erro de seus filiados.

A Lava Jato foi um marco importante na vida brasileira, o que não quer dizer que não tenha excessos aqui e ali.

Acho um pouco exagerada essa vontade de vingança que existe hoje. » FHC vê excesso em ‘difusão da informação’ da Lava Jato EC - Além do caso da JBS, que envolve o Aécio, o partido ainda enfrenta, mais recentemente, os impactos do acordo de leniência da Camargo Corrêa e da Odebrecht, na qual ambas as empresas reconhecem cartel em obras nos governos tucanos em São Paulo.

Qual o tamanho da avaria no caso do PSDB?

FHC - Esse é o ponto.

A Lava Jato demonstrou ao País, e isso deixou todo mundo horrorizado, que aqui se montou um sistema de poder político baseado na propina.

Não é só uma questão de fulano ou beltrano roubou. É muito mais grave do que isso.

As instituições ficaram comprometidas.

O PSDB não participou desse sistema nem em São Paulo.

No caso de São Paulo, se houve algum malfeito no Rodoanel (uma das obras em investigação - teria havido cartel para linhas de metrô também), não foi o PSDB que fez ou o governador que organizou.

Aqui não se organizou esquema.

Não tem um tesoureiro do PSDB que pegou dinheiro.

Houve um cartel, mas contra o governo.

EC - Há uma crítica recorrente que as denúncias de corrupção em São Paulo não recebem o mesmo tratamento do que em outros Estados ou no plano federal.

FHC - Teve processo em São Paulo.

Talvez não tenha produzido o mesmo auê, ou escândalo, talvez por isso: não conseguem envolver o núcleo político e porque não tem a bênção do governo.