Estadão Conteúdo - O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), afirma que o centro político do País não se estruturou para a eleição presidencial do próximo ano e ainda há “uma avenida aberta para um outsider” em 2018.
Ele define como centro político a centro-esquerda - no qual se insere - mais os “liberais reformistas”. “Precisamos unir o centro da política”, afirmou em entrevista ao jornal O Estado de S.
Paulo.
Hartung, que cogita sair do PMDB, manteve conversas recentes com Luciano Huck e Joaquim Barbosa e diz que um nome de fora da política poderia representar esse campo.
Ele afirma já estar “abraçado no projeto nacional” e é cotado para compor como vice uma chapa na sucessão presidencial.
Qual será sua participação na política em 2018?
O ambiente no Brasil hoje é péssimo, e isso empurra a política para os extremos.
Quem tem espaço num campo desse é bravateiro e vendedor de terreno na Lua.
Minha torcida é para que o País se acalme um pouco.
Se o Brasil percorrer 2018 com esse ambiente péssimo, provavelmente as decisões serão movidas por ressentimento e raiva.
Tem razão para a população estar ressentida?
Claro que tem.
Os americanos decidiram com o fígado e não estão satisfeitos com a decisão.
Só que os americanos têm gordura para queimar, mas o Brasil não tem.
O Brasil está literalmente pele e osso.
Os americanos podem fazer uma aventura, nós não.
Ou a gente acerta a mão em 2018, ou vamos flertar com o que há de pior na nossa vizinhança latino-americana.
Mas e sua participação?
Os processos eleitorais estão sendo definidos em cima da hora.
Temos de percorrer até junho ou parte de julho de 2018 para amadurecer decisões.
O sr. disse em meados deste ano que estava disposto a deixar o PMDB.
Ainda está?
Estou observando o quadro como um todo para tomar decisões.
Vou usar o tempo do prazo (legal).
Esperava que o Congresso fizesse algumas mudanças na vida partidária e eleitoral do País.
A impressão é de que a sociedade está em uma direção e as instituições políticas do País em outra.
Há um divórcio.
O sr. já disse que teria mais conforto em ir para um partido que tivesse compatibilidade com seu pensamento político…
Eu sou um político de centro-esquerda.
Comecei minha militância na juventude, como líder estudantil no campo do socialismo.
Evoluí.
Sou um social-democrata.
O sr. recebeu convite do PSDB e o DEM também o sondou.
Está no seu radar ir para um desses dois partidos?
Tenho uma grande relação com o PSDB.
Fui filiado e fundador do partido.
Sou muito próximo ao Rodrigo Maia, que é uma grande liderança.
Nesse tempo que temos, estamos pensando e conversando Os extremos estão se movimentando.
Quem ainda não conseguiu se estruturar foi o centro político do País.
Este é o nosso papel: organizar o centro político.
O que é o centro político? É a turma de centro-esquerda, mais os liberais reformistas.
Precisamos juntar essa turma em um projeto e uma agenda clara para o País, que seja reformista e modernizadora.
Já há uma disputa entre o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o governador Geraldo Alckmin pela liderança do centro em 2018.
Qual deles tem mais identificação com esse campo? É positivo que eles tenham se colocado.
São bem-vindos.
Estamos vivendo o maior vazio de lideranças da nossa história.
A realidade vai mostrar quem é viável e competitivo.
Nenhum desses nomes, porém, deveria ser obcecado por posição.
O momento é delicadíssimo.
O mais importante agora é acertar na narrativa para a população entender por que é importante essa agenda entrar no País.
Estamos em dezembro.
Não é o momento de falar em nomes?
Isso na agenda velha.
O tempo lógico da política mudou.
Qual será a influência do julgamento do recurso do ex-presidente Lula nesse calendário?
O que acha da pré-candidatura dele?
Absolutamente legítima e precisa ser respeitada. É uma candidatura que tem repercussão na sociedade.
E não é pequena.
A pré-candidatura do Lula contribui para esse extremismo?
Eu convivi a vida toda bem com o Lula, particularmente no período em que ele foi presidente e eu, governador.
Tivemos um excelente diálogo.
Qual a dificuldade hoje quando vejo o conteúdo da movimentação do ex-presidente Lula?
Ele perdeu o apoio da classe média e do mundo empresarial.
Lula, que é um homem pragmático, recuou para o mundo das corporações e sindicatos.
Isso é legítimo, mas não forma o projeto que precisamos para o Brasil.
Precisamos de uma plataforma reformista.
O mundo das corporações é antirreforma.
O movimento do ex-presidente não é o que o Brasil precisa.
O Brasil precisa achar o seu centro político, como foi feito no Plano Real.
Quando o presidente Lula fez a Carta aos Brasileiros, isso ajudou a organizar o centro político.
Ele hoje não segura mais a Carta aos Brasileiros em sua campanha.
O respaldo que ele tem na sociedade está muito ligado aos grupos corporativos e sindicatos Há o risco de uma eleição judicializada que pode torná-lo inelegível.
Como vê essa situação?
Não podemos colocar o carro na frente dos bois, nem nos assustarmos com o barulho da bala.
Deixa as coisas acontecerem.
O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa pode representar o centro? É um nome ótimo, como o Meirelles e o Alckmin.
Joaquim tem uma história de vida belíssima.
Tenho um carinho especial por ele.
Precisamos organizar programaticamente o centro.
O País está começando lentamente a recuperar a economia, mas não é sustentável essa recuperação.
Vamos ser claros.
Isso é voo de galinha se a gente não reestruturar as contas do País.
Essa retomada lenta daqui a pouco desaba.
O sr., que está com discurso nacionalizado, recentemente jantou na casa do Armínio Fraga com o Luciano Huck.
Barbosa o citou como um dos políticos que admira.
Há espaço para um outsider na eleição presidencial?
Gostei muito da conversa com o Luciano. É uma pessoa preparada, que tem uma boa reflexão sobre o País.
Saí muito bem impressionado.
O ministro Joaquim eu já conhecia.
Tive várias audiências e oportunidades de conversar com ele.
São dois quadros de boa qualidade.
Existe espaço para um quadro desses nesse ambiente.
Existe uma avenida aberta para um outsider.
O que é difícil é empurrar para a população quem tem ou já teve mandato.
O sr. foi apontado como um potencial candidato a vice-presidente de Huck, Barbosa ou outro candidato desse centro Aceitaria entrar num projeto nacional e abrir mão de disputar a reeleição?
Já estou abraçado no projeto nacional.
Vocês mesmos dizem que minha fala está nacionalizada.
Sou governador de um Estado que está organizado e com as contas em dia, e que faz políticas públicas inovadoras na área social.
Mas há uma pedra no caminho do Estado, que é a desorganização do País.
O que fica de pé se o Brasil embarcar em mais quatro anos de aventura?
Pouca coisa.
Virou uma necessidade esse envolvimento com a política nacional O Espírito Santo enfrentou no começo do ano uma greve da Polícia Militar.
O governo atribuiu o movimento a atores políticos nacionais.
Quais?
Houve um grande componente político no movimento de dentro e de fora do Estado.
Foi absolutamente irresponsável.
Uma greve ilegal.
A lei é clara: funcionário público que usa arma não pode exercer direito de greve.
O movimento estava cheio de impressão digital da disputa local e também da disputa nacional. É só olhar o que foi postado nas redes sociais sobre a greve.
Quase 80% do que foi postado não saiu daqui.
Jair Bolsonaro é uma liderança ligada aos policiais…
Não faço ação política fulanizando o debate.
Mas tinha dedo de luta política local e nacional.
Estudos mostraram envolvimento de gente da bancada da bala.
Isso está colocado na luta política desses extremos que estão postos.
Como avalia a pré-candidatura presidencial de Bolsonaro?
Ele fala para segmentos que querem ouvi-lo, mas não tem uma proposta para esses desafios que o Brasil está vivendo.
Quando os temas profundos da agenda nacional entram na pauta, ele não tem uma proposta.
O PMDB voltou a ser MDB.
Isso resolve os problemas do partido, que vive uma crise ética?
Claro que não.
Mas a gente precisa ser justo.
O quadro partidário como um todo não fica de pé.
Vamos ter de fazer uma profunda reforma política no País.
O sr. foi citado por um ex-dirigente da Odebrecht em acordo de delação como destinatário de R$ 1 milhão em propinas em 2010 e 2012.
A PGR pediu ao STJ o arquivamento.
Qual era a sua relação com a Odebrecht?
Se você procurar na minha trajetória política, em 2010 e 2012 eu não disputei eleição.
Desde o início ficou claro que essa delação não ficava de pé.
Também na delação, o delator fala que não sou patrimonialista.
Disputei oito eleições, fui eleito oito vezes.
Três de governador fui eleito no primeiro turno.
A corrupção é um problema no País e precisamos enfrentá-la.
Mas não podemos juntar o joio e o trigo.
A Lava Jato juntou joio e trigo?
Isso é casca de banana.
Por favor…
Não vou criticar ninguém.
Já disse que precisamos combater a corrupção.
O presidente Temer é joio ou trigo?
Não sou julgador de ninguém.