Estadão Conteúdo - Aprovado em dezembro de 2016 no Senado, o projeto que limita os valores recebidos por servidores públicos ao teto constitucional tem sido protelado na Câmara desde então.
Nos bastidores, deputados admitem sofrer pressão de entidades e representantes de classes, que não querem perder benefícios e têm procurado parlamentares para discutir o projeto.
Apenas no dia 15 do mês passado o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criou uma comissão especial para analisar a proposta.
A medida ocorreu um dia após o jornal O Estado de S Paulo revelar que um juiz de Mato Grosso recebeu quase meio milhão de reais em julho.
LEIA TAMBÉM » Maia cria comissão para discutir regulamentação do teto salarial do funcionalismo público » Após extrapolar o teto, ministro abre mão de R$ 18 mil de remuneração » Servidor público que acumula cargo pode receber mais que o teto, decide STF O projeto também passou a ser bem visto pelo governo, que incluiu a imposição do teto remuneratório a todas as verbas recebidas por servidores como parte do ajuste fiscal anunciado no fim de julho.
Mesmo criada há quase um mês, a comissão ainda não se reuniu nenhuma vez.
A primeira reunião, marcada para o fim de agosto, foi adiada.
A previsão é de que o colegiado seja instalado no próximo dia 12.
Isso porque o deputado Rubens Bueno (PPS-PR), que deve relatar a proposta, estava na Itália para acompanhar o casamento da filha e só retornará a Brasília na semana que vem.
Intenções.
O deputado Benito Gama (PTB-BA), que, pelo acordo firmado, deve presidir a comissão, admitiu a demora e disse que a intenção é evitar as críticas que surgiram quando a proposta foi apresentada no Senado.
Na época, a medida foi encarada por entidades de classe como retaliação do então presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), aos membros do Judiciário.
O peemedebista é um dos alvos da Operação Lava Jato.
Ele recolhe assinaturas para propor uma CPI no Senado para investigar os supersalários. “A nossa intenção é evitar essa descarga ideológica que toma conta do assunto”, afirmou Gama ao Estadão pouco depois de se reunir com representantes da Defensoria Pública na Câmara.
Segundo ele, o projeto sobre o teto salarial foi um dos temas do encontro. » PEC inclui verbas indenizatórias no teto de salários no serviço público » Após salário de R$ 80 mil, Câmara do Cabo aprova teto de R$ 25 mil » Número de servidores que ganham acima do teto cresceu 3,5 vezes O deputado Orlando Silva (PC do B-SP), presidente da Comissão de Trabalho da Câmara, onde o projeto ficou parado por oito meses, também disse ter sido procurado por integrantes do Judiciário. “Eles queriam discutir o que pode ser considerado fora do teto salarial.
O que é legítimo”, afirmou.
Pelo texto aprovado no Senado, os rendimentos recebidos por qualquer servidor público não podem exceder o que recebem os ministros do Supremo Tribunal Federal (R$ 33,7 mil).
No valor devem estar incluídos itens como abonos, prêmios, auxílios, entre outros adicionais que, por entendimentos diversos da Justiça, acabam não sendo computados como salário e abrem brechas para o pagamento de supersalários.
Em alguns casos, porém, a exceção vira a regra.
Reportagem do Estadão mostrou que, em Minas Gerais, 98% dos magistrados do Tribunal de Justiça receberam valores líquidos acima do teto constitucional em julho.
No Tribunal de Justiça de São Paulo, o porcentual foi de 56% no mesmo mês.
Rubens Bueno afirmou que o projeto aprovado no Senado deve passar por alterações na comissão da Câmara, para evitar contestações. “A proposta do Senado tem alguns problemas de ordem constitucional.
A consultoria da Câmara ainda está analisando”, afirmou.
O futuro relator, porém, negou pressões de entidades. “O que é preciso, e não de agora, é abrir a caixa-preta.
Bons juízes e bons procuradores estão incomodados com notícias de salários acima do teto”, disse. “O que não se pode é fechar os olhos para privilégios.”