Em meio à negociação do ministro da Saúde, Ricardo Barros, para levar para Maringá (PR), seu reduto eleitoral, a fabricação do produto com maior valor agregado da Hemobrás, a procuradora da República Silvia Regina Pontes Lopes expediu três recomendações à pasta contra mudanças na estatal de hemoderivados.

A Casa Civil da Presidência da República também é alvo do Ministério Público Federal (MPF) na ação.

A Hemobrás, sediada em Goiana, na Mata Norte, tem hoje uma Parceria para o Desenvolvimento Produtivo (PDP) com o consórcio Baxter/Shire que prevê a compra do fator VIII recombinante, medicamento usado no tratamento de hemofílicos, pela estatal, mas também a transferência da tecnologia para que a produção passe para Pernambuco até 2023.

O ministro Ricardo Barros, porém, quer fechar com um consórcio que engloba a empresa suíça Octapharma, citada na Operação Máfia dos Vampiros.

Nesse novo negócio, a produção do recombinante passaria para o Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), em Maringá, base eleitoral do ministro, e em Pernambuco ficaria apenas o fracionamento do plasma, hoje executado pela Hemobrás em outro contrato.

LEIA TAMBÉM » Presidente da Hemobrás contraria ministro e mostra interesse em manter contrato » Paulo Câmara diz que Hemobrás é maior que questão eleitoral » Funcionários da Hemobrás denunciam ‘revés’ da União e rebatem ministro, que quer levar fábrica para reduto eleitoral Articulando o negócio com a Octapharma, Barros chegou a romper a parceria com o Baxter/Shire pelo fator VIII unilateralmente, mas foi impedido por uma liminar da Justiça Federal.

A ação do Ministério Público foi motivada justamente pelo rompimento do contrato.

A procuradora determina que seja devidamente justificada qualquer hipótese de transferência de tecnologia para processamento de plasma e hemoderivados para outras empresas - a Octapharma, no caso - através de estudos técnicos, legais e científicos.

O ministério também deverá seguir o que estabelece a Lei de Licitações e Contratos ou a legislação que regula a Parceria Público-Privada, de acordo com o Ministério Público.

O órgão aponta que a negociação com a Octapharma começou a ser feita sem realizar licitação ou apresentar justificativas científicas, técnicas e legais para a medida.

A procuradora ainda recomendou que não sejam aprovadas e nomeadas para cargos de gestão no âmbito da Hemobrás ou do Ministério da Saúde pessoas que tenham vínculos diretos ou indiretos com empresas privadas interessadas.

Informações de bastidores apontam que o engenheiro Mário Ramalho, nomeado para uma das diretorias da estatal que tem sede em Pernambuco, é lobista da Octapharma. » Deputados recorrem ao TCU contra fim de contrato na Hemobrás » Hemobrás: ministro articula fábrica no Paraná e incomoda bancada de Pernambuco » Após cobrança da oposição sobre Hemobrás, deputado chama ministro da Saúde de idiota O MPF argumenta que é urgente a necessidade de adoção de providências pelos órgãos responsáveis para impedir prejuízos econômicos, financeiros e operacionais à Hemobrás, aos processos de aquisição de tecnologias e ao interesse público.

A fábrica em Goiana custou até agora cerca de R$ 1 bilhão e precisa de mais R$ 600 milhões para concluir os 30% restantes.

A Shire propõe investir U$ 250 milhões na conclusão da planta de Goiana.

Além disso, aceitou estender o prazo de pagamento e abrir mão dos juros da dívida da estatal com a empresa, hoje estimada em U$ 175 milhões – pela compra do recombinante.

Enquanto isso, no negócio proposto pelo ministro o investimento de US$ 250 milhões em Pernambuco, mas para que o Estado fique com o fracionamento do plasma, e US$ 200 milhões iriam para o Paraná, para a fabricação do recombinante, mais lucrativo.

Em audiência pública na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), na semana passada, o procurador Marinus Marsico, do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), explicou o órgão trabalha em uma medida cautelar pedindo a continuidade do atual contrato de parceria.

A instituição foi procurada pela bancada de Pernambuco, descontente com a decisão do ministro Ricardo Barros. “Se vem ocorrendo atraso na transferência da tecnologia, não é por culpa da Braxter/Shire ou da Hemobrás, mas em função da falta dos investimentos na planta de Goiana, que são de responsabilidade do Ministério da Saúde”, disse.

O mesmo foi dito pelos funcionários da Hemobrás em uma nota de repúdio ao ministro.