Como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), coube ao ministro Gilmar Mendes desempatar e definir o resultado do julgamento da chapa formada nas eleições de 2014 pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e pelo presidente Michel Temer (PMDB).

Mendes divergiu do relator Herman Benjamin e votou contra a cassação da chapa.

Antes dele, já haviam optado pela absolvição Napoleão Nunes, Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira.

Luiz Fux e Rosa Weber acompanharam o relator e consideraram que houve abuso de poder político e econômico.

Gilmar Mendes alegou que deve ser considerada a soberania popular do voto e a estabilidade. “Não é algum fricote processualístico que se quer proteger.

Não se substitui um presidente da República a toda hora, ainda que se queira.

A Constituição valoriza a soberania popular a despeito das nossas decisões”, disse o ministro. “É assim que se destrói mandato? questionou. “Todos nós queremos correção, mas, se fôssemos adotar a premissa do relator de trato sucessivo desde 2006, teríamos que anular todos os atos, inclusive a indicação de ministros do Supremo.” LEIA TAMBÉM » Rosa Weber vota pela cassação e empata, deixando decisão para Gilmar Mendes » Fux acompanha relator pela cassação da chapa Dilma-Temer: “Agora é a hora do resgate” » Tarcísio Vieira considera que não há provas de propina em 2014 e vota contra cassação » Admar Gonzaga dá segundo voto contra cassação da chapa Dilma-Temer » Napoleão Nunes vota contra cassação de Dilma-Temer criticando PSDB e uso do Petrolão como prova » Relator no julgamento do TSE vota pela cassação da chapa Dilma-Temer O presidente do tribunal reconheceu que há fatos graves envolvidos na denúncia, mas que “não é pra cassar mandato”.

Para ele, se agregaria uma grande responsabilidade ao Judiciário.

Gilmar Mendes criticou ainda o que considera uma “corrida maluca” e perguntou se o que se quer é uma eleição indireta em um mês. “O Brasil deve caminhar para um regime semi-presidencialista.

Hoje temos um quadro de quase parlamentarismo.

Quem não tem apoio no parlamento cai.” Votos pela cassação O PSDB - hoje no primeiro escalão do governo Michel Temer - começou o processo com quatro ações ainda durante as eleições de 2014 denunciando o uso de pronunciamentos oficiais em cadeia nacional para a promoção da imagem de Dilma, o uso do Palácio do Planalto para atividades de campanha e a ocultação de dados econômico-sociais negativos por parte do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e do Ministério do Meio Ambiente.

Havia ainda suspeitas de irregularidade nos repasses a gráficas que prestaram serviços para a campanha, através do beneficiamento de terceiros com o desvio de pagamentos para essas empresas. » “Marcelo Odebrecht herdou cultura de propina”, diz Herman Benjamin » Herman diz que defesa quer excluir Odebrecht porque prova é oceânica » Homem se amarra à placa do TSE e diz que só sai com Temer cassado A Justiça Eleitoral avaliou também, devido à denúncia, se a campanha foi beneficiada com dinheiro de propina e de desvios da Petrobras.

Tanto os ministros que foram favoráveis quanto os que foram contrários à cassação usaram depoimentos de delatores da Operação Lava Jato durante o processo, como testemunhas, para reconhecer que houve o esquema de corrupção na estatal.

Porém, a interpretação sobre o uso dessas verbas em 2014 mudou de acordo com o voto de cada um.

Rosa Weber considerou que os recursos de propina eram usados em doação eleitoral “ao Partido dos Trabalhadores, mas não só a ele”.

Para ela, isso contamina a campanha da chapa. “O conjunto de bens que compõe as contas de campanha ainda que cadastrados na Receita Federal com o nome comitê de campanha tem dissociável relação com o partido que representa o candidato”, disse.

A ministra afirmou que não saberia como solucionar o problema, “só recomeçando desde o valor 0”, mas disse: “Há que ter esperança”.

Foto: Roberto Jayme/TSE - Foto: Roberto Jayme/TSE Foto: Roberto Jayme/TSE - Foto: Roberto Jayme/TSE Foto: Roberto Jayme/TSE - Foto: Roberto Jayme/TSE Foto: Roberto Jayme/TSE - Foto: Roberto Jayme/TSE Foto: Roberto Jayme/TSE - Foto: Roberto Jayme/TSE Outro voto com tom moralizador foi o Luiz Fux, que falou antes de Weber. “Hoje nós vivemos um verdadeiro pesadelo.

A sociedade vive um verdadeiro pesadelo pelo descrédito das instituições e pelo despudor dos agentes políticos, que, violando a soberania popular, a vontade intrínseca do povo, fizeram exatamente aquilo que o cidadão não desejava”, disse.

O ministro afirmou que o País tem “corrupção endêmica e imoralidade amazônica”.

Com textos de sua autoria usados por outros ministros durante o julgamento, Fux rebateu os colegas e defendeu que o processo tem que levar em consideração novos fatos que possam interferir no seu resultado. “Até as pedras sabem que o ambiente político está contaminado.

E agora é a hora do resgate.” » Filho de ministro do TSE é ator na série ’13 Reasons Why’ » Filho de ministro é barrado ao tentar entrar no TSE sem paletó e gravata Fux falava sobre o uso dos depoimentos de delatores da Odebrecht e dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura como testemunhas no processo, o que foi alvo de questionamentos e trocas de farpas entre os ministros desde o início do julgamento.

Relator considerou “provas oceânicas” Considerando o mesmo que Fux, o ministro Herman Benjamin defendeu que fossem consideradas as provas da Odebrecht e chegou a afirmar que as defesas de Dilma e Temer pediram a rejeição delas por serem “oceânicas”.

O relator frisou que, além dos depoimentos dos ex-executivos das construtoras, estão incluídos nas delações documentos e informações repassadas por autoridades estrangeiras através de cooperação internacional.

Benjamin explicou que a Odebrecht tinha uma única conta corrente de onde poderiam sair valores lícitos e ilícitos.

Marcelo Odebrecht afirmou em depoimento, segundo Herman Benjamin, que, em 2014, houve contribuição oficial, através do diretório nacional petista, mas tudo saía, independente de como e de que empresa, da mesma conta.

O ministro argumentou que essas informações não eram públicas no momento em que foi apresentada a petição inicial. “As assimetrias nos governo importantes irão permanecer, porque é impossível descrever em uma petição inicial algo que estava tão protegido”, afirmou. “Seria impossível nós apurarmos o que nós apuramos aqui se não fosse a Lava Jato.

Não era para ser.

Não haverá outra oportunidade para apurar fatos dessa natureza aqui.” » “TSE não é avestruz para enfiar cabeça no chão e ignorar provas”, diz Fux » Dez coisas que você precisa saber sobre o julgamento da chapa Dilma-Temer » Autores do impeachment defendem cassação da chapa Dilma-Temer no TSE Foto: Roberto Jayme/TSE Sem uma definição sobre o uso das delações da Odebrecht, Herman Benjamin começou a segunda parte do seu voto com uma ironia.

Após afirmar que falaria sobre o esquema de pagamentos de US$ 5 milhões aos marqueteiros João Santana e Monica Moura pela Keppel Fels, ressaltou estar se limitando à petição inicial e frisou: “Não é pela Odebrecht”.

Segundo Herman Benjamin, o valor foi pago em 10 parcelas até novembro de 2014 e apenas a última não foi paga “pelo estrago da Lava Jato”.

O então tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, teria determinado que o valor fosse diretamente para os marqueteiros, mediante depósitos em conta off-shore.

O ministro concluiu ainda que o casal de marqueteiros tinha com o PT uma relação de “fundo rotativo”, não era um contrato de uma campanha, e “depois aquilo tudo era liquidado”.

Isso funcionaria como uma “conta corrente aberta”, “de eleição para eleição”. » Relator da ação sobre Dilma/Temer rejeita preliminar de cerceamento de defesa » No TSE, Gilmar ironiza Herman e diz que relator usa argumento ‘falacioso’ » TSE decide que pode cassar mandatos de presidente e vice no julgamento da chapa Dilma-Temer Ele apresentou o depoimento do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, que revelou que eram indicados os valores doados a cada partido ou político.

Nas negociações, as empreiteiras informavam como seria o pagamento, podendo ser por repasses financeiros diretos ou doações eleitorais, por exemplo. “Ninguém fazia doação por questões ideológicas.

Aqui era sempre a expectativa de cooptação e favorecimento futuro”, afirmou Benjamin.

Para o relator, sem a Lava Jato, os pagamentos teriam continuado.

O relator também considerou o abuso de poder econômico na contração das gráficas.

Para ele, as empresas Rede Seg e VTPB não tinham capacidade operacional para produzir o volume de material gráfico contratado pela chapa.

Ele destacou que a coligação declarou gastos de R$ 22,898 milhões com a VTPB e que esse é um valor que não pode ser desconsiderado. “É impossível entregar milhões de reais a uma empresa que não existe.

Não são valores ínfimos.

São valores que podem mudar uma campanha eleitoral”, disse. “Mesmo que não haja propina, que os serviços tenham sido efetivamente prestados ou os produtos entregues, mas essa triangulação (de desvios através dos serviços gráficos devido ao pagamento deles por outras empresas) viola o sistema de transparência absoluta.

Portanto, leva à violação da própria lei”, defendeu o relator.

Votos contra a cassação O primeiro a votar contra o relator foi Napoleão Nunes.

O ministro afirmou que não há provas concretas do uso do Petrolão nas campanhas, que o fato está sendo apurado na esfera criminal e que o uso do esquema como prova daria possibilidade para punir políticos. “Se for aceito isso, abre um leque infinito para todo mundo que foi eleito nessa poupança.

Ou será que foi só a presidente Dilma que foi eleita nessa poupança e o presidente Temer?

E os outros do PT e do PMDB não foram maculados?”, questionou. “Uma coisa é punir as pessoas por crime, outra coisa é privar quem ganhou a eleição do exercício do mandato.” Nunes lembrou ainda que a ação foi movida pelo PSDB, partido que foi derrotado e pediu no processo que Dilma e Temer deixassem o poder e os tucanos Aécio Neves (atualmente investigado no mesmo inquérito que o presidente no Supremo Tribunal Federal) e Aloysio Nunes (hoje ministro das Relações Exteriores do governo peemedebista) assumissem os cargos. “Como se fosse decidir o jogo no tapetão”, afirmou. » Ministério Público Eleitoral pede cassação da chapa Dilma-Temer » Não é possível que Temer pague uma conta da corrupção no Brasil, diz defesa » Defesa de Dilma diz que acusação do PSDB é “inconformismo de derrotado” Admar Gonzaga foi o segundo a votar.

Antes de ele iniciar sua fala, porém, o vice-procurador-geral, Nicolao Dino, pediu que fosse considerada a incompetência dele para analisar o caso por ter sido advogado da chapa Dilma-Temer em 2010.

Gilmar Mendes rebateu em tom exaltado e ironizou o representante do Ministério Público Eleitoral (MPE).

Os outros ministros negaram a solicitação por unanimidade.

Apesar de ter citado delatores da Operação Lava Jato como o doleiro Alberto Youssef e de ter afirmado que houve propina na Petrobras, Gonzaga enfatizou que “não há prova robusta, segura, inconteste” de que esses recursos da estatal compuseram doações de contratadas da empresa à campanha de 2014.

Antes de anunciar o voto, o ministro afirmou que, no fim do processo, o PSDB “passou a não ter tanto interesse na cassação da chapa completa”, fazendo com que a investigação dependesse do relator Herman Benjamin e criticando os tucanos, como Napoleão Nunes.

Indicado por Michel Temer para o TSE, Tarcísio Vieira foi outro que reconheceu que havia um esquema de propina na Petrobras, mas afirmou que não se pode provar que esses recursos compuseram as doações de empresas contratadas pela estatal para a campanha de 2014. “A Justiça Eleitoral dê-se a mão à palmatoria: não verticalizava o controle dessas doações”, afirmou no seu voto. “Os depoimentos de Paulo Roberto Costa (ex-diretor de Abastecimento da Petrobras) e Alberto Youssef (doleiro condenado por fazer entregas de propinas principalmente para o PP) nada dizem sobre o financiamento eleitoral de 2014.

As testemunhas nada mencionam sobre efetivos ingressos financeiros na campanha eleitoral de 2014”, disse no voto.

Vieira lembrou que Youssef reconheceu que os recursos ilícitos poderiam ser usados em outras campanhas, mas não soube se os negociados em 2010 e 2012 chegaram à eleição seguinte.

Quatro dias de julgamento A análise no TSE começou na terça-feira (6), quando acusação, defesa e Ministério Público Eleitoral (MPE) apresentaram seus argumentos.

Nicolao Dino opinou pela cassação da chapa.

Com o partido agora no primeiro escalão do governo Michel Temer, os advogados do PSDB evitaram citar o presidente, mas mantiveram as acusações de uso de programas oficiais em benefício da chapa, manipulação de dados oficiais e uso de recursos de propina do Petrolão na campanha.

O próximo passo seria a leitura do voto do ministro Herman Benjamin, o que só começou na quinta-feira (8).

A sessão da quarta-feira (7) foi apenas para a análise das questões preliminares apresentadas pelos advogados de Dilma e Temer.

Os ministros rebateram as defesas e afirmaram que podem, sim, cassar diplomas de presidente e vice-presidente se a denúncia for de caráter eleitoral.