Por Fernando Holanda, especial para o Blog de Jamildo As fortes chuvas que castigaram a Zona da Mata Sul de Pernambuco nos últimos dias têm muito a dizer sobre a política do estado e do Brasil.

O caos que se instalou em 14 dos nossos municípios e já desabrigou mais de 5 mil pernambucanos é o exemplo claro de que mudanças climáticas não são delírios de ambientalistas extremistas.

São uma realidade já sentida nos quatro cantos do mundo, onde os habitantes se vêem obrigados a conviver com estiagens, tempestades e temperaturas nunca antes registradas.

E que se transformam em tragédia quando não há ocupação sustentável do território, como é o caso das cidades de Barreiros e Palmares, onde as chuvas repetem os estragos registrados há pouco menos de sete anos. É óbvio que é nas cidades onde sentimos mais os efeitos das mudanças climáticas. É nos territórios urbanos - que corresponde a apenas 2% da face da Terra - onde vivem mais da metade dos seres humanos.

E é lá onde se concentra a maior parte do consumo de água, energia e das emissões totais de carbono.

A vulnerabilidade climática das cidades que constatamos aqui em Pernambuco não é novidade, pois já foram previstas e debatidas trocentas vezes.

Produzido durante a Rio+20?—?a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável?— o documento The Future We Want já apontava que a velocidade da urbanização incide sobre aspectos fundamentais da sustentabilidade do planeta, como o abastecimento de água potável, o esgotamento sanitário e o clima.

Até o Papa Francisco em sua encíclica Laudato Si?—?publicada em 2015?—?já constatou que não é “conveniente para os habitantes deste planeta viver cada vez mais submersos de cimento, asfalto, vidro e metais, privados do contato físico com a natureza”.

Enquanto megalópoles como Londres, Nova Iorque e Singapura preparam seus planos de resiliência - através dos quais as causas das mudanças climáticas são mitigadas e os efeitos, controlados - em Pernambuco, insistimos na má qualidade do planejamento territorial e na visão de curto prazo.

Continuamos usando termelétrica em Fernando de Noronha, ostentando o Capibaribe entre os 10 rios mais poluídos do Brasil e impermeabilizando o mangue para construir via onde não passa ônibus e não há calçada.

Práticas que contribuem para hoje desabrigar milhares de pessoas no interior.

E que amanhã podem atingir milhões ao castigarem o Recife - que, por sinal, é considerada pela ONU como uma das 16 cidades mais vulneráveis às mudanças climáticas no planeta.

Precisamos garantir que instrumentos como o Plano de Ordenamento Territorial - que contempla o Plano de Drenagem Urbana, a Lei de Uso e Ocupação do Solo e o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano - sejam elaborados e executados.

Que as cidades se desenvolvam de forma saudável e sustentável.

E que os políticos deixem de lado seus planos de governo e adotem planos de futuros para as cidades.

Enquanto isso não acontecer, continuaremos lamentando tragédias como a deste final de semana.

Ontem, a cada dez anos.

Hoje, de sete em sete.

Amanhã com o sério risco de olharmos para frente e só nos restar o pensamento de que amanhã vai ser pior.

Fernando Holanda representa a RAPS - Rede de Ação Política pela Sustentabilidade no Conselho da Cidade do Recife. É filiado à Rede Sustentabilidade.