Por Roberto Numeriano, em artigo enviado ao Blog de Jamildo A República do golpe de Estado de 2016 caiu ontem, em rede nacional.
Seu mordomo, temer (com minúsculas mesmo), ainda está presidente. É claro que divulgaria uma nota à imprensa, jurando inocência.
Umas frases nas quais nem ele mesmo acredita. É também claro que, se ainda houver um mínimo de Estado de Direito e de decência aos legisladores (MPF / PGR, STF e Câmara Federal), o mordomo será devidamente notificado, nos termos da lei, para saber das acusações e provas que pesam sobre ele.
Neste blog, desde a criminosa condução coercitiva do ex-presidente Lula, escrevi imediatamente que estava em curso um golpe de Estado.
A seguir, foram dezenas de artigos e crônicas fazendo a denúncia e tentando descobrir o que estava por trás do golpe parlamentar, fraudado já nas origens sob o argumento falacioso de um crime de responsabilidade que a presidente Dilma teria cometido.
Como cientista político, eu buscava saber quais as motivações político-ideológicas para golpearem a democracia e a Constituição de 1988.
Em pouco tempo, a horda de hienas que tomou o controle do poder demonstrou sua “inspiração”: aplicar as políticas neoliberais que as urnas negam há quatro eleições consecutivas e arrochar a classe trabalhadora com um pacote de leis da velha e podre Casa-Grande do agronegócio, da mídia venal corporativa (Rede Globo à frente), da banca financeira com lucros estratosféricos (lucros de agiota), do Judiciário golpista e de salários acima do teto constitucional e do Legislativo mais corrupto e canalha de toda a história republicana.
Não fui dormir bem.
Não estava feliz vendo a máscara dos golpistas cair.
A desgraça desse inútil e ladravaz Aécio Neves (um tosco que a fama do avô Tancredo Neves fez alçar sua carreira política nula) não foi e não seria troféu que eu empunhasse, esfregando-o na cara dos coxinhas, dos inocentes-úteis, dos fascistinhas de carteira.
Aécio só me surpreendeu no trecho em que fala, como um bandido do PCC, em matar um delator que arranjassem.
Eu, que tenho convicção (as provas não são difíceis de colher) do assassinato do ministro Teori Zavascki por integrantes do golpe de Estado, começo agora a pensar se não seria verdade que o policial denunciante dos esquemas do Aécio em Minas Gerais foi mesmo morto ou “suicidado”.
E não fui dormir bem porque todo o desmonte desse básico Estado do Bem-Estar Social, em paralelo ao crescimento Estado de Exceção cuja onipresença intimida e reprime, significa o que vemos nas ruas: 14 milhões de desempregados, desesperança, medo, aprovação de leis venais e bandidas contra a classe trabalhadora (o embusteiro projeto de “reforma” da Previdência), precarização dos direitos trabalhistas com o fim da CLT e o vale-tudo da terceirização, perdão de dívidas bilionárias de bancos privados etc.
O golpe, hoje está provado, foi feito para isso, mas também para livrar da cadeia uma corja que vive da corrupção como se esta fosse funcional ao exercício do poder de Estado, nos três poderes republicanos.
O que fazer?
Não há saída dessa gravíssima crise política e de valores se não for por meio de eleições gerais (à exceção dos prefeitos e vereadores).
Não existe isso de um interino assumir a presidência, pois sua assunção será em face de um crime de lesa-pátria e sob escolha de um Congresso Nacional de maioria bandida, venal e canalha.
Um interino não terá o que respalda e consagra o poder: a soberania do voto da maioria que lhe confere legitimidade.
Ao fim e ao cabo, o golpe de Estado foi “bom” apenas porque deixou nu todo o podre sistema político brasileiro.
E essa podridão e fealdade é a cara da velha e vil elite da Casa-Grande que há séculos combate contra a democracia, submetendo o Brasil da Oca e da Senzala.
Roberto Numeriano é pós-doutor em Ciência Política, professor e jornalista.
Filiado ao PT do B de Silvio Costa