Dois delatores da Odebrecht, João Pacífico e Carlos Angeiras, afirmaram em depoimento ter pago pela construção do cais 5 do Porto de Suape e do Píer Petroleiro, em Pernambuco, propina a Aldo Guedes, empresário que era sócio de Eduardo Campos (PSB) e seria o seu intermediário, e Iran Padilha, ex-secretário-executivo do Estado que agiria por Fernando Bezerra Coelho, líder do PSB no Senado.

Os valores seriam de 1,5% do contrato para cada um deles e o primeiro pagamento teria envolvido também João Carlos Lyra e Eduardo Bezerra Leite, dois dos presos da Operação Turbulência, ação deflagrada pela Polícia Federal no ano passado para apurar a compra do avião usado pelo ex-governador na campanha presidencial de 2014, quando ele morreu de acidente aéreo.

LEIA TAMBÉM » Já denunciado antes, Fernando Bezerra é acusado de receber da Odebrecht em 2010 » Aldo Guedes pede ao STF cópia da delação da Odebrecht sobre Itaquitinga » Odebrecht pagou R$ 95 milhões em propina por Petroquímica Suape, dizem delatores O caso, porém, foi devolvido pelo ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), para nova análise do Ministério Público Federal (MPF) a pedido do próprio órgão.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, alegou que já ofereceu uma denúncia contra Fernando Bezerra Coelho no inquérito 4005, em que é acusado de solicitar R$ 20 milhões de empreiteiras - Queiroz Galvão, OAS e Camargo Corrêa - contratadas pela Petrobras para a construção da Refinaria Abreu e Lima entre 2010 e 2011, quando era secretário de Desenvolvimento Econômico e presidente do Complexo de Suape.

O socialista é acusado ainda de receber R$ 41,5 milhões.

Além dele, são investigados no mesmo processo outros dois citados pelos delatores, Aldo Guedes e João Carlos Lyra. » Antes de morrer, Eduardo Campos disse a Marcelo Odebrecht que desvios de recursos do BNB em Itaquitinga eram ‘questão do PT’ » Governo do Estado achou ‘cemitério’ de paredes de gesso em presídio de Itaquitinga, aponta levantamento » Marcelo Odebrecht diz que perdeu R$ 50 milhões para ajudar Eduardo com Itaquitinga e que vencedor da PPP desviou dinheiro do BNB Em seu depoimento, Carlos Angeiras, que era ligado à diretoria de Pacífico na Odebrecht, afirmou que combinou os repasses em reuniões com Aldo Guedes no seu escritório na Copergás, a Companhia Pernambucana de Gás, quando ele era presidente do órgão do governo.

O próprio Aldo teria solicitado que metade fosse para Iran Padilha, então secretário-executivo de Planejamento e Gestão na pasta de FBC, que era procurado na própria secretaria. “Era o mesmo modus operandi que Pirapama”, chega a comentar um dos procuradores com o ex-executivo.

Fernando Bezerra Coelho na inauguração do cais 5 (Foto: Alexandre Severo/Acervo JC Imagem) O delator ainda enfatizou: “Em nenhum momento Fernando Bezerra Coelho me falou de assunto de dinheiro.

Agora Iran Padilha dizia que esse dinheiro era para apoiar o pessoal do grupo político dele”.

Sobre a verba supostamente paga a Aldo Guedes, disse: “Acho que era para o PSB e para apoiar a eleição do governador (Eduardo Campos, que disputaria a reeleição dois anos depois).

Era o que ele dizia também.” » Campanha de FBC recebeu R$ 1 milhão por prioridade da Odebrecht em obra » Janot denuncia Fernando Bezerra Coelho e comprador do avião de Eduardo Campos ao STF » PGR diz que propina foi usada na campanha de Eduardo Campos em 2010 Angeiras falou também sobre o pagamento.

De acordo com o delator, Aldo Guedes informou que ele seria procurado pelo empresário João Carlos Lyra - que ele diz que “mexia com aluguel de máquinas”.

Lyra chegou a ser preso por três meses no ano passado, apontado pela Polícia Federal como líder de uma organização criminosa de lavagem de dinheiro.

A ação penal da Operação Turbulência foi trancada, porém, pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região e o Ministério Público Federal recorreu ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ) para tentar reabri-la.

O encontro com o empresário foi, segundo o ex-executivo da Odebrecht, na Zona Sul do Recife, onde ele teria entregue um papel informando uma conta de banco que ele deduziu ser na China - “Eram uns nomes que eram em chinês.

Não eram inglês, não eram alemão”, disse aos procuradores.

O sócio de João Carlos Lyra, também preso na Turbulência, Eduardo Bezerra Leite, também foi citado por Angeiras como um “sujeito que mexia com câmbio ou coisa parecida”, indicado por Lyra para resolver a transação bancária.

A pedido do Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, a área responsável pelo pagamento de propinas, Leite foi convidado a ir a uma reunião em São Paulo e, segundo Angeiras, informado por ele em um encontro no seu escritório, na Rua Ribeiro de Brito, em Boa Viagem, também na Zona Sul do Recife.

O delator afirmou que os outros pagamentos foram feitos na casa de câmbio Mônaco, que ficava no Centro da capital pernambucana e fechou as portas no ano passado, em meio à Operação Turbulência.

O estabelecimento havia sido alvo, meses antes da 26ª Fase da Lava Jato, batizada de Operação Xepa. “Sempre naquele sistema de senha, codinome”, explica Angeiras. “Codinome só tinha o Neto, que era o governador do Estado de Pernambuco?”, questiona um procurador em seguida. “Isso”, responde o ex-executivo.

A casa de câmbio era chamada de “Madeira”.

Acordo de mercado nas obras e valores repassados De acordo com o depoimento de Carlos Angeiras, o pagamento de 3% foi pedido por Aldo Guedes durante a licitação para o cais 5 de Suape, em 2008, no segundo governo de Eduardo Campos.

Ele afirmou que a Odebrecht tinha interesse na obra, através da Companhia Brasileira de Projetos e Obras, mas que o empresário teria pedido que a OAS entrasse na licitação com a construtora porque “era um desejo do Estado”. “Não dizia se era um desejo do governador, de A, de B ou de C”, afirmou o ex-executivo da empreiteira.

Apesar de ter cedido a formação do consórcio, a Odebrecht exigiu ficar com 60% do contrato - “A OAS não agregava muito tecnicamente ao projeto”, justificou Angeiras aos procuradores.

Dessa fatia, teriam partido as vantagens indevidas para os socialistas. » “Tratativas eram diretamente com Eduardo Campos”, diz delator da Odebrecht » PSB diz que vai atuar para que honra de Eduardo Campos não seja maculada » Delator da Odebrecht diz que foi procurado por Eduardo Campos sobre Arena Pernambuco O delator afirmou que começou, então, a procurar as possíveis concorrentes para controlar a futura licitação, para formar um acordo de mercado - combinação de preços ilícita que também foi denunciada pelas empreiteiras em obras como a Arena de Pernambuco. “Os valores das propostas foram tão próximos que já dá a entender, já vincula alguma coisa em termos de acordo de mercado.

Nós dissemos: ‘olha, entra com o preço tal’, ‘você entra com o preço tal’ e ‘você com o preço tal’”, enfatizou. “A contrapartida eram coberturas futuras, salvo a Somar (uma das empresas envolvidas) que era subcontratação da dragagem da obra.” O procedimento teria sido o mesmo no caso do Píer Petroleiro, que teve a ordem de serviço meses depois, neste caso acrescentando ainda a Andrade Gutierrez no consórcio - segundo Angeiras, também a pedido de Aldo Guedes. “O nosso percentual continua maior pelo mesmo motivo que foi no cais 5, devido ao acervo técnico nosso que era bastante grande e eles dois sozinhos não conseguiam se habilitar nesse processo”, disse.

A Odebrecht ficou com 50% do contrato e as outras duas empreiteiras com 25%.

Também desse contrato teriam saído 3%, sendo 1,5% para o então presidente da Copergás e 1,5% para Padilha.

O intermediário de Eduardo Campos foi acusado pelo delator de ter recebido R$ 5 milhões pelo píer.

Alguns valores aparecem no sistema do Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht: