Por Elias Gomes, ex-prefeito de Jaboatão dos Guararapes O sistema de segurança do país está falido.
Eis uma verdade tão sabida quanto o hino nacional.
Na teoria, a constituição brasileira prevê como responsabilidade dos Estados a tarefa de garantir a ordem interna em cada uma das unidades federativas que constituem a nação.
Na prática, nós andamos armados de medo até os dentes, cercamos nossas casas, blindamos nossos carros, pagamos por empresas privadas de proteção patrimonial e trancamos nossos filhos dentro de um mundo virtual inatingível.
Somos vítimas e soldados de uma guerra sem trincheiras e sem patrões.
Não temos táticas de salvação, esperança de vitória, nem organização civil. É por culpa desse sangue nos olhos que estamos impedidos de enxergar a necessidade de criação absoluta de novas políticas públicas.
Nos prendemos a um milagre que não vai vir e esquecemos de ter fé na mesma sistematização que já salvou lugares do mundo em maior estado de abandono que o nosso.
A batalha que culminou com a criação do Sistema Único de Saúde brasileiro é um exemplo de que medidas governamentais coletivas podem, sim, funcionar e salvar uma tropa.
Mesmo com todas as dificuldades e precariedades que envolvem o SUS, o programa, reconhecido internacionalmente, é considerado uma revolução no sistema de saúde do país.
A segurança precisa percorrer um caminho semelhante.
E o norte deste caminho tem um só nome, no melhor estilo Tropa de Elite: “Estratégia.
Em grego strateegia, em latim strategi, em francês stratégie”. É preciso transformar a segurança como uma política pública do Estado brasileiro a ser estudada e colocada rigidamente em prática.
Seguir o exemplo de outros países do mundo e da própria América Latina, como é o caso da Colômbia, onde o Governo da União assumiu a responsabilidade de comandar e coordenar, com a participação importante e decisiva dos estados e dos municípios, uma política nacional de segurança pública unificada e eficiente.
A segurança, ao lado do desemprego, configura uma das pautas mais urgentes e reclamadas pela sociedade brasileira.
Uma combinação tão inimiga quanto pólvora e fogo.
Mas nem precisamos dizer: a crise de desemprego, resultante da crise econômica, não é o que enche nossas ruas de crimes em plena luz do dia.
Estamos há décadas mergulhados numa verdadeira guerra civil, que mata mais do que países em conflagração declarada.
Vivemos debaixo de um fogo cruzado absolutamente insustentável.
E, diante de tantas balas e rédeas perdidas, o Governo Federal o tempo todo se omitiu de uma responsabilidade que é indelegável.
Não se pode esperar uma solução satisfatória de cada estado, sabendo que cada um fará sua política de segurança ao seu gosto, ao seu modo, sem claras diretrizes nacionais e sem uma coordenação permanente e integrada.
Não à toa, eu já propus ao hoje chanceler do Brasil, José Serra, e ao senador Aécio Neves, quando foi candidato à presidência da República, a criação de um Ministério Nacional da Segurança, que poderia incorporar o Ministério da Justiça, até porque, a segurança é uma pauta mais pertinente ao governo federal do que propriamente o Ministério da Justiça, visto que o Poder Judiciário tem própria autonomia e, portanto, não é um órgão de gestão do Poder Executivo.
Na posição de quem foi recentemente considerado pelo atual secretário de Segurança Urbana de Recife, Murilo Cavalcanti, um dos poucos prefeitos que, no último quadriênio, discutiram ativamente as diretrizes estaduais do Pacto Pela Vida, eu acredito que o primeiro passo desse prélio seria convocar uma conferência nacional sobre segurança, cujo ponto de partida seja a realização de conferências em todos os municípios do país e em todos os estados da federação.
Depois, construir um pacto nacional pela segurança, envolvendo a sociedade, os municípios e os estados.
Tudo isso, repito sempre, coordenado pelo Governo Federal.
Após entender que segurança é uma questão do povo brasileiro, da nação, e não das corporações policiais, militares e civis, e aceitar que sua integração ajudará a combater o doentio e perverso corporativismo que hoje vivemos, partiríamos para o terceiro passo, o de convocar a participação da sociedade, dos especialistas da área de segurança, das universidades, e dos especialistas em políticas públicas e políticas sociais.
Este exército estaria dedicado a uma política nacional capaz de trabalhar quatro eixos decisivos e fundamentais para a reorganização do país: eixo da prevenção, eixo da repressão, eixo da ressocialização (aí nós precisamos abordar em profundidade a questão do sistema carcerário), e o eixo da reinserção dos ex-apenados.
Formulada a política nacional integrada, teríamos, a partir daí, constituído o Sistema Único de Segurança Pública, o já denominado SUSP, que nunca saiu do papel.
E em seguida, a criação de um Fundo Nacional de Segurança Pública, que seria o FUSP - Fundo Único da Segurança Pública, responsável por financiar uma política nacional, fazendo a equalização entre as polícias brasileiras no que concerne à capacitação, treinamento, armamento e remuneração; sustentando políticas integrativas para o enfrentamento às drogas e ao crime organizado, e compatibilizando as ações do sistema carcerário nacional em cada Estado.
Pronto, com a federalização da segurança no País, podemos começar a reagir.
Lembro-me que, há uns dez anos, o meu caçula, com idade entre 10 e 12 anos à época, me perguntou qual a diferença entre o Estado e a máfia.
Eu, na oportunidade, não encontrei resposta para a sua pergunta.
E ele disse: " Pai, é porque a máfia é organizada".
A “piada” não mudou.
O Estado brasileiro continua desorganizado, desordenado, desarticulado e sucateado.
Já o crime, e todas as unidades que o integram, está cada ano mais estruturado, interestadual e internacionalmente.
Não nos basta agora focar no que aconteceu e acontece nas favelas do Rio de Janeiro, o que aconteceu mais recentemente no Espírito Santo, em Pernambuco, em Alagoas e em outros estados do Brasil.
Enquanto estivermos fazendo essa abordagem pontual e isolacionista, nós não iremos enfrentar e vencer peleja alguma.
O Governo Federal precisa calçar suas botinas e assumir a braçadeira de capitão, antes que a situação se agrave e o país imploda.