Estadão Conteúdo - O empresário Evaldo Ulinski, ex-dono do Big Frango, uma das empresas investigadas na Operação Cui Bono?, disse em duas entrevistas ao jornal O Estado de S.
Paulo que Lúcio Bolonha Funaro e operadores dele lhe ofereceram um empréstimo de R$ 100 milhões na Caixa Econômica Federal, com condições especiais.
Cobrariam 10% sobre do valor do financiamento, a título de comissão, para facilitar a liberação dos recursos.
Mas havia outra opção.
Se o empresário aceitasse dar uma comissão maior, de 30%, não pagaria o empréstimo. “Era 10% para você pagar e 30% para nunca mais precisar pagar.
As palavras deles”, disse Ulinski ao jornal.
A história contada por Ulinski traz detalhes de como seriam os bastidores de um esquema que previa a liberação de financiamentos irregulares na Caixa em troca de propinas, o alvo central da Operação Cui Bono?, deflagrada na sexta-feira (13).
LEIA TAMBÉM » Ex-ministro, Geddel mantém influência na gestão Temer » Ex-ministro Geddel Vieira é alvo da PF em operação contra fraude na Caixa Segundo o Ministério Público e a Polícia Federal, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima - ex-ministro do atual governo de Michel Temer -, além de Funaro, operaram um esquema de fraudes na liberação de créditos da Caixa, que teria ocorrido pelo menos entre os anos de 2011 e 2013.
Neste período Geddel era vice-presidente de Pessoa Jurídica do banco estatal, área que libera financiamentos para empresas.
Ulinski afirmou que recebeu uma proposta para ter crédito na Caixa e foi ao escritório de Funaro.
Disse que chegou a assinar um documento manifestando interesse em contratar Funaro para intermediar o crédito e teria feito cadastro na Caixa.
As condições apresentadas, disse, eram tentadoras: “Preço bom, prazo bom, dez anos, 12 anos”, lembrou. “Conseguiria o empréstimo com custos baixíssimos.
Eu não me recordo a que juros " As tratativas, porém, não teriam avançado. “Naquele momento, eu até aceitaria, porém, tendo mais informações, desisti.
Com mais conversa, eu vi que eu ia ter problemas no futuro.” » Operação da PF mira também deputado do PMDB irmão de Geddel O risco, na versão de Ulinski, estava em dois detalhes: “A Caixa queria garantia.
Eu tinha garantia para dar.
Agora, desculpe, mas 10% de comissão é extorsão.
Não é verdade?
E pior que isso.
A proposta do Lúcio Funaro era o seguinte: te arrumo R$ 100 milhões com 10% para pagar e 30% para nunca mais precisar pagar.
Como pode?
Dar uma garantia e não pagar?
Caí fora”.
Ulinski afirmou não saber como se davam as tratativas internamente na Caixa: “Eu não estou acusando a Caixa Econômica.
Eu nunca falei com ninguém da Caixa.” » PMDB foi beneficiário do esquema de corrupção na Caixa, diz investigação » Operação aumenta pressão por delação de Cunha, avaliam políticos De acordo com o relatório do Ministério Público Federal que embasou a operação Cui Bono?, é preciso ainda apurar melhor os fatos em relação à liberação de créditos à empresa Big Frango.
O documento afirma que “Geddel teria se referido à localidade da agência bancária da Big Frango sem fornecer muitos detalhes na mensagem”.
Nas entrevistas, Ulinski disse que conheceu Funaro por intermédio de terceiros.
Alexandre Genta, na época seu genro e também advogado da Big Frango, havia feito faculdade em Londrina com Alexandre Margotto, que trabalhava com Funaro.
Para Ulinski, Margotto afirmava que o chefe tinha acesso à Caixa. “O funcionário dele disse que ele (Funaro) consegue muita coisa na Caixa, é muito bem relacionado lá, ele manda lá dentro.
Se é mesmo, não sei.” Segundo Ulinski, os operadores de Funaro falavam que ele fazia esse tipo de empréstimo para outras empresas. “Dizem que ele tinha muito acesso (na Caixa) e conseguia muita coisa politicamente.” » PMDB é ‘coadjuvante’ mais bem-sucedido da América Latina » Marcelo Odebrecht confirma pagamento de R$ 10 milhões ao PMDB a pedido de Temer Mensagens entre Geddel Cunha e Funaro sustentam essa versão de que havia um esquema de fraudes nos empréstimos da Caixa para empresas.
Boa parte das citadas na Operação Cui Bono? tinham negócios direto com Funaro. É caso da própria Big Frango.
Em nome de Ulinski, Funaro apresentou a empresa para potenciais compradores e ela foi adquirida pela JBS, maior empresa do mundo no setor de carnes, que é controlada pela J&F.
Funaro conhece os donos da JBS, a família Batista.
Chegou a negociar um imóvel de luxo com Joesley Batista.
Mensagens trocadas entre Geddel, Cunha e Funaro mostram que eles favoreceram a liberação de recursos da Caixa para a J&F. » Prisão de Sérgio Cabral abala o Planalto por mirar no PMDB » Cunha é excluído de grupo do PMDB no WhatsApp logo após ser preso O mesmo teria ocorrido em relação ao grupo Bertin, que atua em vários setores.
Cunha pede a Geddel: “Precisa ver no assunto da Bertin a carta de conforto1 com os termos que necessita”.
Funaro é amigo e foi consultor dos Bertin.
Outra empresa citada pelo Ministério Público foi a Marfrig, também do setor de carnes.
Em conversa por SMS sobre a Marfrig, Geddel disse a Cunha: “voto sai hj’.
No outro dia, o ex-ministro envia informações sobre a aprovações do crédito.
Os investigadores apuraram que, após essa conversa, Marfrig depositou R$ 469,5 mil para uma empresa de Funaro, a Vizcaya.
Contexto Ulinski concedeu duas entrevistas ao Estado sobre a oferta de empréstimo na Caixa.
Na primeira, em 2014, havia se indisposto com Funaro sobre a comissão da venda do Big Frango.
Na segunda, em setembro de 2016, Funaro já havia sido preso.
Ulinski confirmou todos detalhes do esquema, mas fez acusações mais fortes ao ex-genro, Genta. » Juiz aceita denúncia e Cunha vira réu por corrupção na Caixa » Moro aponta ‘caráter serial dos crimes’ de Eduardo Cunha A reportagem tentou contato com Genta, que não respondeu às ligações.
Também tentou falar com Margotto, por intermédio de amigos e familiares, sem obter resposta.
O advogado de Funaro, Fernando Guimarães, disse que não tinha como responder às questões, pois só vai falar com seu cliente nesta semana.
A defesa de Geddel afirmou na sexta-feira que as investigações fazem “ilações e meras suposições não comprovadas”.
A defesa de Cunha rechaçou as suspeitas.
A J&F declarou que “nunca procurou os políticos para pedir facilidade ou intermediação em quaisquer de suas operações financeiras”.
A JBS, por sua vez, declarou que “todas as suas atividades são realizadas dentro da legalidade.” A Marfrig, em nota, afirmou que suas operações com a Caixa não tiveram “qualquer tipo de privilégio”.
Bertin não respondeu até a conclusão desta edição.
A Caixa informou que colabora com as investigações.