Por Luiz Felipe Soares, sociólogo Nas últimas décadas, sobretudo nos últimos 10 anos, o Brasil, através de um processo de concertação política que envolveu o governo e a sociedade civil como um todo, à revelia dos setores sociais mais conservadores, construiu um sistema de proteção social e ampliou consideravelmente os serviços públicos, incluindo definitivamente os mais desprovidos, ou seja, os mais pobres, no orçamento público.

O crescimento econômico do PIB brasileiro, estimulado pelo padrão desenvolvimentista de acumulação dos governos do PT, caracterizado por uma articulação entre capital e trabalho, pelo crescimento do ciclo das commodities e pela distribuição de renda por meio das políticas sociais, como o programa bolsa família, pelo aumento real do salário mínimo, pela criação de mais de 20 milhões empregos e um conjunto de outras políticas que elevaram mais de 40 milhões de pessoas da pobreza à classe média.

Passado o desfecho do processo de impeachment que destituiu uma presidenta (sic) eleita democraticamente com a maioria dos votos, o atual presidente Michel Temer adotou uma série de medidas para promover o ajuste fiscal, mas que tem desajustado a máquina pública até então à serviço daqueles que mais precisam, articulando um desmonte da plataforma política de inclusão social e reimplantando a ordem neoliberal cuja expressão mais fenomênica é a diminuição do tamanho do estado.

Um dos esforços do Governo Michel Temer, neste sentido, é aprovação da PEC 241 que estabelece um teto para o aumento dos gastos públicos, mais conhecida como a PEC da desigualdade, por congelar os investimentos em educação e saúde, por exemplo, pelos próximos 20 anos.

Segundo o texto da PEC, as despesas do ano corrente serão corrigidas conforme a inflação do ano anterior.

Exemplificando, o orçamento do governo federal para a educação referente ao ano 2019 seria o orçamento da educação de 2018 reajustado tão somente pelo índice de inflação desse mesmo ano.

Se levarmos em consideração as regras da PEC já a partir do próximo ano, isto é, 2017, o orçamento da saúde para 2018, financiado apenas pelo tesouro, será de R$ 121,1 bilhões ou exatamente R$ 579,29 por pessoa.

Conforme o orçamento previsto na lei orçamentária de 2017 de pouco mais de R$ 115,4 bilhões dividido pela expectativa populacional desse mesmo ano, reajustado pelo índice de inflação de 5% esperado pelo Banco Central para 2017, divulgado no último boletim focus.

Para 2021, o orçamento da saúde, utilizando as expectativas de inflação para 2018, 2019 e 2020, 4,65%, 4,53% e 4,48% respectivamente, segundo o sistema de expectativa de mercado do BACEN, teríamos um orçamento de R$ 644,92 por habitante, considerando o crescimento populacional projetado pelo IBGE para 2021.

Portanto, de 2018 a 2021, sairíamos de um investimento de R$ 579,29 para R$ 644,92 por habitante, um crescimento de menos R$ 70,00.

Na prática, o aumento real que obteríamos de 2018 com R$ 579,29 para R$ 644,92 por pessoa em 2021, acréscimo de R$ 65,63, descontado a inflação acumulada nesse período (cujo índice esperado é de 13,66%), seria de 0%, ou seja, não teremos aumento real do orçamento para a saúde pública.

Trata-se, portanto, do fim do estado, de sua presença na vida das pessoas, especialmente àqueles que mais precisam, historicamente alijados do orçamento público.

Veremos, por exemplo, imensas filas nos hospitais, fechamento de vagas nas universidades, paralisação da reforma agrária, ou seja, o aumento ‘real’ será o da desigualdade social.

A emergência deste grupo político (golpista) ao poder que demoniza o ‘público’ e romantiza o ‘privado’ é um retrocesso sem precedentes na história deste país.

Apresenta-se como Mestrando em Sociologia PPGS-UFPE.

PPGS vem a ser programa de pós-graduação em sociologia