Por Leonardo Accioly, vice-presidente da OAB-PE Há algum tempo assisti o ótimo seriado americano “Breaking Bad” e vi uma cena que me chamou atenção.
Skyler, mulher de Walter White, que se torna um produtor de drogas, procura uma advogada.
Skyler descobre que Walter está produzindo metanfetamina e conversa com a advogada sobre a sua intenção de se divorciar.
Em um dado momento a advogada desconfiando que Skyler está escondendo alguma coisa, pergunta a ela se o marido está fazendo algo ilícito.
A cliente então pergunta à advogada se o que ela diz ali é confidencial.
A advogada responde: claro!
Skyler pergunta novamente: mesmo se o que ele estiver fazendo for crime?
E a advogada responde: especialmente se for crime, sou proibida legalmente de revelar o conteúdo de nossa conversa.
Nos EUA os advogados não possuem as mesma garantias dos advogados brasileiros.
Não possuem em nível constitucional as características de essencialidade nem função pública que nós possuímos.
Os advogados, não possuem uma Lei que traz em seu bojo um elenco tão grande de direitos, como no nosso Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906/94).
Justamente por não possuírem função pública, os advogados nos EUA se equiparam a comerciantes podendo fazer propaganda e associar seu mister a outra atividade comercial.
Com tudo isso, pelo que se aparenta, as garantias básicas da imunidade profissional e inviolabilidade, inerentes à profissão do advogado parecem que são mais respeitadas lá do que em terras brasileiras.
No Brasil abundam operações policiais contra nossos constituintes violando-se nosso sigilo, escutas consentidas em parlatórios nos presídios, e ausência de responsabilização de autoridades pelas suas violações funcionais como no caso dos 25 advogados grampeados na operação Lava Jato que tiveram devassadas suas ligações telefônicas com seus clientes, fato que seria valorado como extremamente grave em qualquer país democrático do mundo.
Exemplo tem-se na Espanha onde o Juiz Baltazar Garzon, notório pela prisão do ditador Pinochet e um dos primeiros magistrados a entender pela possibilidade de jurisdição internacional por crimes de lesa humanidade, foi punido com 11 anos de inabilitação como magistrado por autorizar grampos ilegais de conversas entre advogados e clientes.
Já em terras brasileiras temos o inconstitucional Projeto de Lei 5.668/2016, que pretende obrigar os réus a “comprovar a origem lícita” do dinheiro que usarem para pagar seus patronos cuja consequência é a responsabilização criminal e disciplinar dos advogados.
Indago se o médico, ou arquiteto ou psicólogo deveriam ser obrigados a informar ao COAF a origem dos valores que receberam no exercício de suas profissões.
Igualmente absurda é a disciplina imposta, ainda hoje, aos advogados nos presídios federais de segurança máxima, como o de Catanduvas/PR, onde todas as conversas entre defensores e clientes são monitoradas pela administração, violando frontalmente o sigilo profissional e a paridade de armas entre acusação e defesa.
Enquanto no mundo desenvolvido temos a proteção máxima ao direito de defesa, no Brasil temos o patrocínio estatal da violação à dignidade da pessoa humana, tudo sob a justificativa da necessidade de segurança e combate à impunidade.
Sem embargo, não se pode conceber que a busca da justiça se faça atropelando as garantias legais e processuais mais básicas do cidadão, conquistadas a duras penas pela democracia brasileira.
Se nós advogados admitirmos isso, estaremos reduzindo nosso múnus público a uma atividade meramente legitimadora do arbítrio estatal.
Em tempo: o seriado é ótimo.
E Hank, o policial cunhado de Walter, também não entrou no trailer-laboratório do criminoso Jasse, diante da oposição apresentada de que o veículo era sua residência, portanto, inviolável.