Por Luciano Siqueira, vice-prefeito do Recife Sabe-se que nos EUA os ministros da Suprema Corte costumam conceder duas entrevistas: uma quando são nomeados, outra quando se aposentam.
Não sei se a Suprema Corte norte-americana deva ser tomada como referência para a boa conduta jurídica e ética.
Pode até ser.
Nesse caso é.
No Brasil, ministros do STF são personagens midiáticos.
Falam sobre tudo - inclusive sobre temas politicamente polêmicos.
Sem o menor recato.
Tornam-se, assim, sob suspeição quando chamados a julgar matérias sobre as quais antecipadamente opinaram em público?
Para o bom senso, sim.
Para eles próprios, não.
Certamente o exemplo mais emblemático dessa anomalia seja o ministro Gilmar Mendes, figura central de muitas polêmicas ou, no mínimo, coadjuvante destacado em outras.
Os jornais de hoje trazem declarações do dito magistrado acerca da gravação de conversa entre o senador ex-ministro Romero Jucá e o ex-senador tucano Sérgio Machado, onde parte crucial da trama do impeachment vem à tona, associando-a à necessidade (sic) de “estancar” a sangria decorrente da operação Lava Jato.
Gilmar Mendes, arguido pela Folha de S.
Paulo, afirma não enxergar nenhuma tentativa de obstrução das investigações!
Coincidentemente, é o mesmo Gilmar a quem caberá conduzir o julgamento, no STF, dos casos decorrentes da mesma Operação Lava Jato.
Comparando-se a gravação da conversa Jucá-Machado com o grampo do então senador Delcídio Amaral, à semelhança é evidente, talvez mais graves ainda as declarações de Jucá agora, pois destampam a fossa onde é urdida a trama do impeachment.
Então, a juízo de Gilmar Mendes, cabem dois pesos e duas medidas.
O mesmo critério estranhamente usado pela Procuradoria Geral da União e pelo próprio STF, que já detinham a gravação revelada pela Filha de S.
Paulo desde março, conforme menciona o jornalista Luis Nassif, no Jornal GGN.
Por que desde então não tomaram nenhuma iniciativa?
Há aí, no mínimo, uma assimetria ética comprometedora.
O que a sociedade espera dos organismos de fiscalização e das instituições jurídicas - do STF em especial - é que todos os casos de corrupção e afins, uma vez comprovados, recebam o mesmo tratamento, punidas exemplarmente as pessoas envolvidas nos termos da Lei.
Fora disso, tudo conflui para o labirinto obscuro e suspeito do jogo de poder ora em curso.
Ao arrepio da ética e da justiça, ferindo gravemente a democracia.