Myrthes de Campos: Pioneira na advocacia Por Bruno Baptista Advogado e Presidente da Caixa de Assistência aos Advogados de Pernambuco - CAAPE Ao nos depararmos com listas de aprovados em exames da OAB ou concurso públicos, há uma evidente prevalência de nomes femininos, o que pode causa uma falsa impressão de que não existe mais preconceito de gênero nas carreiras jurídicas.
Na realidade, é só se pensar nos graves problemas de assédio sexual sofrido por advogadas e estagiárias, na desigualdade salarial fora do serviço público e na ainda diminuta (mas felizmente crescente) participação feminina em cargos de destaque na OAB ou à frente de grandes bancas de advocacia, para se ver que o caminho a ser percorrido ainda é longo.
Ainda há muito a se fazer para se alcançar a tão esperada igualdade.
Mas se as advogadas podem comemorar as conquistas já alcançadas e até a supremacia numérica sobre os advogados, muito se deve às pioneiras que, no fim do século XIX e início do XX, superaram barreiras que pareciam intransponíveis para ter a possibilidade de exercer tão nobre profissão.
A despeito de algumas mulheres terem se formado em direito ainda no século XIX, como Maria Fragoso, Maria Coelho e Delmira Secundina da Costa, em 1888, todas pela Faculdade de Direito do Recife, nenhuma delas conseguiu efetivamente exercer a advocacia, cabendo essa primazia à fluminense Myrthes Gomes de Campos, a primeira advogada do Brasil.
Nascida em Macaé-RJ em 1875, Myrthes de Campos, escandalizando a sociedade da época e até a sua família, partiu para a então capital da República, onde se bacharelou em direito no ano de 1898.
A despeito de sua inegável incapacidade, por puro preconceito somente conseguir ingressar no Instituto dos Advogados do Brasil (predecessor da Ordem dos Advogados do Brasil), obtendo licença para o exercício da advocacia, por maioria de 23X15, em 1906.
Em sua primeira oportunidade como defensora no Tribunal do Júri, em 1899, antes mesmo de obter a licença para advogar, Myrthes de Campos chamou a atenção da imprensa e dos populares, que lotou a plateia para assistir o fato inusitado da atuação de uma defensora do sexo feminino.
No seu discurso de abertura, Myrthes acentuou que “envidarei, portanto, todos os esforços, afim de não rebaixar o nível da justiça, não comprometer os interesses do meu constituinte, nem deixar uma prova de incapacidade aos adversários da mulher como advogada”.
Ao final, ela venceu o embate com o promotor até então considerado imbatível e conseguiu a absolvição do réu.
Que no dia 08 de março, internacionalmente dedicado às mulheres, os exemplos de Myrthes de Campos e de tantas outras pioneiras, como Nair Andrade dos Santos, primeira diretora da OAB pernambucana e, atualmente, quase nonagenária, uma das mais assíduas conselheiras seccionais, sirvam-nos de alento para não esmorecer diante dos obstáculos que a sociedade e a cultura machistas nos impõem e que lutemos pela efetivação da plena igualdade de oportunidades e de tratamento entre gêneros.